Estou na sala de espera, aguardando para fazer uma visita na UTI. A enfermeira, antes de nos liberar para entrar, avisa que não nos assustemos com os "bips" dos monitores, que podem se tornar mais frequentes enquanto estamos lá dentro. "O paciente se emociona ao receber visitas e o batimento cardíaco pode se acelerar", diz ela. "Mas temos médicos e enfermeiras de plantão."
O que foi dito para tranquilizar tem o efeito contrário: apavora. Quer dizer que o paciente, que carrega a ansiedade pela sua condição clínica e pelo isolamento, pode se emocionar tanto aos nos ver que terá uma taquicardia perigosa? Pelas expressões faciais, muitos de nós devem ter pensado nisso.
(Quando entro para fazer a minha visita, fico tão concentrada no doente que acabo me esquecendo de prestar atenção nos bips.)
Dia seguinte, nova visita. A senhora sentada ao meu lado me conta que vai ver o filho, que passou por uma cirurgia cardíaca para corrigir uma má-formação. A família está diante de um dilema: deixa ou não a nova namorada do rapaz visitá-lo (eles começaram a sair alguns dias antes da cirurgia).
"Por que a dúvida?" pergunto.
Porque o coração do rapaz se acelera quando ela entra no cubículo e não se normaliza até uns 10 minutos depois que vai embora.
"E o cardiologista acha que isso é perigoso?" questiono.
Não, o cardiologista diz que é normal e que o coração dele é forte o suficiente para aguentar essa moléstia bem conhecida pelo nome de amor. Mas a mãe não quer arriscar:
"Esperamos tanto tempo para fazer essa cirurgia e agora uma paixonitezinha passageira vai pôr tudo a perder? Deus me livre!"
"Será que ver a moça não faz bem para ele, não dá um ânimo para suportar o pós-operatório?" Cutuco.
Cutucar mãe zelosa é como cutucar onça com vara curta. Ela ficou tão brava que, se tivesse transformado sua indignação em força física, quem precisaria de UTI seria eu.
"Você está maluca?" Metralha a mãe do Romeu, o que faz o marido olhar para ela com cara de "se controla!". "O médico diz que ele tem que ser poupado, que tem que ficar tranquilo, mas libera uma visita que faz o coração dele disparar? É uma insensatez. Alguém tem que fazer alguma coisa." E o alguém é ela, claro.
Se estivéssemos em um musical, nessa altura eu cantaria os versos de Tom Jobim e Vinícius:
"A insensatez que você fez/Coração mais sem cuidado/Fez chorar de dor/O seu amor/Um amor tão delicado."
Mas a realidade é que não estamos dentro de um filme e sim aguardando, ansiosas, a hora de visita em uma UTI. Fico quieta.
Na saída, nos cruzamos no corredor. A mãe exibe um rosto tranquilo e sorridente. Pergunto sobre o rapaz.
Ela mostra um papel dobrado que segura entre o polegar e o indicador. Com evidente entusiasmo, me diz:
"Está ótimo. Até conseguiu escrever uma carta para a namorada!"
Vá entender os corações insensatos...