| Foto: Ilustração: Felipe Lima

No mês de abril, sempre lembro o aniversário de morte de Tancredo Neves, que ocorreu no dia 21, em 1985. Não que o presidente que nunca presidiu o Brasil tenha relevância especial para mim. Meu pai adoeceu na mesma época que Tancredo e faleceu um mês antes dele. Uma lembrança colou na outra e por isso em alguns "abris" tenho flash-backs de 1985, um ano ruim para mim e para o Brasil (que ganhou um presidente chamado José Sarney, de triste memória).

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Não sou um caso único. Lem­­branças desse tipo sobrevivem em muitas pessoas porque a figura pública envolvida está relacionada com uma experiência particular ou porque era um ícone da época. Por isso faz sentido perguntar onde você estava quando a princesa Diana morreu? Quando soube do acidente com Ayrton Senna? E quando Kurt Cobain se suicidou? Cada geração com suas referências.

Minha mãe sabia contar como foi que recebeu a notícia da morte de John Kennedy. Meu pai soube no trabalho e foi contar a ela, que estava no quintal. Nos Estados Unidos, o "onde vo­­cê estava quando JFK morreu?" é quase um clichê (obviamente que só entre quem era crescidinho em 1963).

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Essa memória histórico-particular deve ser uma forma de a gente se localizar na linha do tempo. No momento presente, que é o ponto final da linha do tempo (levando em conta que o que vem pela frente ainda não existe) a gente sempre se sente um pouco inseguro, meio sem entender totalmente o que está se passando. Voltar lá atrás dá segurança: olha eu ali, uma pessoa normal e pensante, integrada em um mundo ativo e sendo afetada por ele, mesmo por fatos tão distantes como a morte de um presidente americano ou da princesa que não conseguiu ser feliz.

Também é um bom exercício para a memória. Quantas centenas de dias eu vivi e se apagaram sem deixar lembrança? Aí, uma efeméride ou uma data histórica aparece na página do jornal e eu consigo recuperar um pouquinho do que foi aquele dia, daquele quintal por onde circulava, da sala onde via tevê em um apartamento onde não moro mais, do telefonema que recebi do amigo para me contar a notícia. Aliás, lembro que uma amiga me ligou para me falar da morte de John Kennedy Jr. Não era uma figura importante para nós, mas o rapaz era tão bonito, que tínhamos de comentar...

Pelo que encontrei enquanto pesquisava, os "onde você estava quando..." mais populares são mesmo as mortes de Kennedy e Diana, a queda do muro de Berlim, a chegada do homem à Lua, o assassinato de John Lennon, a chegada do ano 2000, o 11 de Setembro.

Eu acrescentaria as vitórias do Brasil em Copas do Mundo. Brasileiro, mesmo não gostando de futebol, não consegue ignorar o barulho que um título mundial provoca. Dá para avaliar as idas e vindas da vida lembrando onde estávamos quando Dunga erguia a taça na Califórnia e o que havia mudado oito anos depois, enquanto Cafu tinha seu momento de glória no Japão.

E paro por aqui porque não sei o que vai acontecer na África do Sul e nem tenho absoluta certeza de onde estarei eu em junho.

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