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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

O Brasil passa por um período de esquizofrenia.

Sempre teve dificuldades em aceitar a si mesmo. Quis ser português, negro, índio, e misturou as três raças com sucesso – mas faltava algo. O quê? Não se sabia. Por isso, ao longo do século 19 quis ser francês e, com a chegada do século 20, norte-americano. Acabou resultando num país macaqueador de várias origens.

Hoje se repete à exaustão Nelson Rodrigues: é um povo com complexo de vira-lata. Ele bolou a frase pensando no futebol, mas ela se tornou um conceito aplicável ao país.

Acrescento que, além de vira-lata, é um país intelectualmente invertebrado. Não tem ossatura filosófica que o sustente. Pensa ser generoso, criativo, mas os resultados deixam a desejar. Imagina ser abençoado por Deus e bonito por natureza, mas passa férias em lugares de turismo consumista e fútil, gastando nisso verdadeiras fortunas.

Sérgio Buarque de Holanda, na obra Raízes do Brasil, descreveu o brasileiro como "homem cordial". Poucos brasileiros leram a obra, mas quem leu e quem não leu interpreta o conceito erroneamente. Imaginam que o brasileiro é pacífico, bonzinho e incapaz de revoluções sangrentas. Sérgio Buarque não disse nada disso. O homem cordial é aquele que se guia pelo coração (do latim cor, cordis) e não por construções intelectuais complexas. Um alemão representaria a racionalidade do conceito, um inglês a racionalidade experimental e um americano o utilitarismo empírico. O brasileiro, o coração. Que pode ser cruel, vingativo, violento, tirânico – governado pelo coração.

Por isso, as escolhas políticas brasileiras oscilam ao sabor dos ventos. Sem ossatura intelectual que as sustentem, enaltecem a emoção. Cultivam líderes messiânicos, aguardam o retorno de Dom Sebastião, imaginam que as disputas políticas e filosóficas são variações de um Fla-Flu.

Comportam-se como torcidas organizadas, fanáticas e toscas. Daí campanhas eleitorais esquizofrênicas, em que se chocam personalidades supostamente capazes de conduzir o povo ao paraíso. Discutir ideias, planos, projetos, alternativas racionais ou empíricas, experimentar novas soluções, rever erros, construir e inventar algo novo – nada disso está em jogo. Gira-se apenas em torno do apego emocional a um líder, a um partido, a uma bandeira de torcida.

Restam os xingamentos. Nas últimas eleições, termos pejorativos dirigidos aos inimigos foram urrados pelas torcidas, que não sabiam e continuam sem saber o que estavam urrando.

FHC, ao assumir, pediu que esquecessem o que havia escrito. Lula, que nada escreveu, embarcou em ventos favoráveis e declarou que nunca fora socialista. Depois, criou o Poste. O Poste levou o país a um beco do qual agora imagina sair recorrendo a executivos e professores que antes demonizou como neoliberais.

Nenhuma ossatura intelectual. Dia desses, no Facebook – esse pátio virtual dos horrores – alguém denunciou corrupção do adversário com ares de triunfo: "O PSDB também rouba!". E alguém contra-atacou: "Vai pra Cuba!".

Minha mãe, mulher sábia, diria: é o roto desfazendo do esfarrapado.

Minha mãe tinha ossatura intelectual.

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