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Paraná

Delegados são proibidos de se manifestar sobre investigação que apurou “recall” em coletes

 | Jonathan Campos / Gazeta do Povo
(Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo)

Delegados de unidades especializadas da Polícia Civil receberam, na última semana, uma recomendação para que não se manifestem sobre o inquérito que apurou irregularidades no “recall” de mais de 11 mil coletes balísticos fornecidos às polícias do Paraná. A orientação foi repassada por e-mail, enviado pelo delegado Paulo Ernesto Araújo Cunha, chefe da Divisão de Polícia Especializada.

“Se tratando do assunto ‘coletes’, recomendamos que se abstenham de dar sua opinião pessoal, se questionados por terceiros ou imprensa, deixando para o Departamento da Polícia Civil se manifestar”, diz o texto, enviado a delegados de unidades de todo o estado, como Delegacias da Mulher, Delegacias do Adolescente, Delegacia do Meio Ambiente, Delegacia do Consumidor e Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente (Nucria) e a Delegacia de Explosivos Armas e Munição (Deam) - esta, responsável pela investigação.

A apuração sobre a qual Paulo Ernesto recomenda sigilo terminou com o indiciamento do comandante-geral da Polícia Militar (PM), coronel Maurício Tortato, que questionou o relatório-final, negando irregularidades. A conclusão da apuração também provocou um racha nas forças de segurança do Paraná, principalmente depois que o secretário de Segurança Pública, Wagner Mesquita, se manifestou em apoio ao comandante da PM.

Censura?

Apesar de o e-mail de Paulo Ernesto dizer que se trata de uma “recomendação”, a mensagem foi vista por delegados, na prática, como uma censura. Já que eles estariam suscetíveis a punições, caso descumprissem a orientação.

“É uma mordaça. Mostra a falta de autonomia nossa [dos delegados]. Nós não temos independência funcional, como promotores e juízes. Quem não obedece, sofre sanções, como transferência de delegacia”, disse um delegado, que pediu para não ser identificado, justamente para não sofrer represálias. “É uma tentativa de a cúpula manter seus subordinados sob controle. A gente [os delegados] entende como um abuso”, acrescentou outro delegado.

A Associação dos Delegados do Paraná (Adepol), que também teve acesso ao e-mail disparado por Paulo Ernesto, reagiu à orientação. O presidente da entidade, João Ricardo Kepes Noronha, classificou a mensagem como uma tentativa de intimidação à categoria. “Eu entendo que é uma forma clara e aberta de censura institucionalizada, em que tentam dissolver a nuvem de fumaça de irregularidade que paira sobre a questão dos coletes recauchutados”, disse.

Outro lado

A reportagem tentou contato com o delegado Paulo Ernesto Araújo Cunha, por meio da assessoria de imprensa do Departamento da Polícia Civil. Pessoalmente, o delegado não se manifestou, mas a corporação emitiu nota em que “informa que além de respeitar as decisões de cada delegado em seus inquéritos policiais, respeita também a liberdade de expressão, porém, assuntos que envolvam outras instituição é normal que o posicionamento seja centralizado na direção da Polícia Civil, através de sua assessoria de imprensa”. Ao longo da apuração dos fatos, o Departamento da Polícia Civil já havia centralizado a divulgação dos passos da investigação.

Entenda o caso

As investigações começaram no fim de março, quando a Delegacia de Explosivos, Armas e Munições (Deam) chegou a um galpão de uma empresa da Região Metropolitana, onde centenas de coletes balísticos das forças de segurança do estado eram recondicionados. Os coletes ganhavam uma manta extra de aramida – tecido sintético usado neste tipo de artefato – e, em seguida, tinham as etiquetas de validade substituídas por outras que acresciam em um ano a data de vencimento do produto. Os equipamentos eram usados por policiais militares.

De acordo com o inquérito, mais de 11,2 mil coletes passariam pelo “recall”. Uma planilha apreendida pela Deam apontou que 1,3 mil equipamentos que estariam vencidos chegaram a ser recauchutados. Embasada em depoimentos e pareceres de oficiais do Exército, a investigação atestou que os equipamentos não poderiam ter sido submetidos ao procedimento de reforço, já que não haveria previsões legais para o “recall”.

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