O final trágico do seqüestro da jovem Eloá Cristina Pimentel, em Santo André, na última sexta-feira, colocou a família da menina em uma situação delicada: a de decidir sobre a doação dos órgãos. Os pais de Eloá autorizaram a doação, que deve beneficiar até sete pessoas.
Com apenas 15 anos de idade, a garota talvez nem tenha tido tempo de pensar sobre a possibilidade de se tornar uma doadora. No caso dela, por ser menor de idade, a opção coube aos pais.
A decisão de doar os órgãos de um familiar muitas vezes é deixada para o momento doloroso da perda. Embora muita gente evite falar sobre isso, os profissionais que trabalham com doação e transplante de órgãos são unânimes em dizer que, por mais delicado que seja, é preciso conversar sobre o tema. "Uma das principais causas de recusa da família é porque o paciente nunca expressou sua intenção. Em muitas famílias a morte é um assunto sobre o qual não se fala. As pessoas só param para pensar na doação quando se deparam com uma situação como essa", diz a presidente da Comissão Intra-hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante do Hospital de Clínicas, Maria Cecília Coser. Para ser um doador não é preciso deixar nenhum tipo de documento ou declaração assinados, basta informar o posicionamento aos familiares.
Além da falta de conhecimento sobre o desejo do paciente, dúvidas sobre o estado de saúde também tornam a decisão mais difícil. Embora existam campanhas de orientação e esclarecimento sobre o tema, muitos familiares não sabem ou não entendem o que caracteriza a chamada morte encefálica. "As pessoas têm dificuldade em entender como o paciente é dito como morto se o coração continua batendo e questionam se realmente não há mais nada a ser feito", comenta Aneci Lourdes Iarscheski, da equipe de captação e transplante de órgãos do Hospital Angelina Caron.
Responder a todas essas questões e orientar a família nesse momento é responsabilidade das chamadas Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante. Todo hospital com mais de 80 leitos deve ter uma comissão dessas, formada por uma equipe multidisciplinar que inclui enfermeiros, assistentes sociais e psicólogos. São esses profissionais que irão conversar com as famílias e apresentar a possibilidade da doação. "É um trabalho muito delicado, que envolve todas as etapas do processo. Com certeza a decisão final será influenciada pelo atendimento e atenção que a família receber no hospital", afirma a assistente social da Central de Transplantes do Paraná, Gláucia Repula. Os membros da comissão recebem treinamento específico pela Central de Transplantes sobre como abordar as famílias. A dificuldade, muitas vezes, é que esses profissionais não se dedicam apenas à captação, precisam conciliar essa atividade com outros afazeres dentro do hospital.
A abordagem
A alternativa da doação só é apresentada à família depois que o paciente tem a morte encefálica confirmada e de serem feitos os testes de sorologia que comprovarão que não há nenhuma doença ou condição que impeça a doação. "Antes disso o assunto não é abordado, até para que não haja uma interpretação errada. A família precisa entender que a equipe médica fez tudo o que podia para salvar aquela vida e que médico nenhum deixa paciente morrer pensando em órgãos para transplante", esclarece Gláucia. O exame que comprova a morte encefálica é feito por um intensivista e um neurologista, ambos não pertencentes à equipe de captação, o que garante total isenção.
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