Todo o crédito comprado nas 83 linhas não integradas da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) e que vence em um ano vai para a conta da Associação Metrocard, entidade que representa as 17 empresas que operam o transporte público nos municípios vizinhos à capital. O crédito não volta para o bolso do usuário, nem para quem compra as passagens diretamente nem para quem dispensa 6% do seu salário para adquiri-las por meio de seus empregadores.
É um recurso que não é da empresa, mas do cidadão. Esse termo de adesão pode ser considerado abusivo, já que não diz também se há uma contrapartida da operadora do sistema.
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O total de créditos expirados por mês chegou a R$ 300 mil no último trimestre. Entre abril e junho deste ano, a Metrocard registrou mais de R$ 900 mil em créditos de vales-transportes expirados – aqueles dados aos trabalhadores por suas empresas, segundo uma fonte ligada à empresa, que preferiu não ter o nome revelado. Para se ter uma ideia, as operadoras do sistema faturam nestas linhas quase R$ 4,5 milhões por mês. Os créditos expirados equivaleriam 7% deste montante.
O próprio termo de adesão para linhas não integradas que a Metrocard apresenta aos seus clientes explica qual o destino dos créditos expirados. “Os créditos comprados terão validade de 12 meses; findo este prazo os mesmos ficarão disponíveis para a Associação Metrocard”, afirma o texto do contrato.
Sem licitação
Como o transporte público da região metropolitana não foi licitado, ainda não há uma legislação específica nestes municípios e nem uma legislação estadual que defina as normas adotadas para a bilhetagem eletrônica na RMC. O artigo 11 da lei federal nº 8.987 afirma que receitas alternativas precisam estar previstas em edital de licitação. O problema é que o crédito pode ser entendido como uma receita alternativa sem previsão, já que não houve concorrência.
Em Curitiba, os créditos do usuário local passaram a expirar a cada cinco anos recentemente – até o começo deste ano, podiam ser usados para sempre. Todo recurso expirado, no entanto, vai diretamente para uma conta pública, a do Fundo de Urbanização de Curitiba (FUC), sujeita à fiscalização pública. O FUC é o responsável legal por abrigar todas as receitas e despesas do transporte público curitibano.
Análise
Para o advogado especialista em Direito Administrativo Rodrigo Pironti, o modelo adotado pela Metrocard pode ser interpretado como uma retenção indevida dos créditos dos usuários. “É um recurso que não é da empresa, mas do cidadão”, disse. Segundo ele, é preciso levar em consideração o que diz o termo de adesão, por isso, não é possível afirmar no momento que se trata de enriquecimento sem justa causa. “Esse termo de adesão pode ser considerado abusivo, já que não diz também se há uma contrapartida da operadora do sistema”.
Presidente da Comec pretende auditar as linhas não integradas
O presidente da Coordenação Metropolitana de Curitiba (Comec), autarquia do governo do estado, Omar Akel, afirma que fiscalizará a conta específica para receber créditos expirados da Associação Metrocard na nova formatação da rede integrada de transporte da região metropolitana de Curitiba. A partir de 5 de agosto, a bilhetagem eletrônica, que já é adotada em 83 linhas não integradas com Curitiba, será aplicada em 137 linhas em 11 cidades no entorno da capital.
“Não será igual [o modelo das linhas não integradas]. Vamos fazer um controle na conta específica e monitorar”, diz Akel. Já sobre a conta da Metrocard que tem recebido os créditos expirados das linhas não integradas, Akel afirmou que vai pedir uma auditoria para verificar as informações depois de publicadas nesta reportagem da Gazeta do Povo.
De acordo com ele, todo faturamento que entra para as empresas além do arrecadado com a tarifa deve ser revertido para melhorias do sistema de transporte. “Vamos auditar o sistema para ver se há valores que não são reaplicados no transporte”, salienta. Apesar disso, Akel afirma que a Metrocard está amparada na Lei de Vale Transportes (nº7.418/85).
Licitação
O presidente da Comec acredita que até o final desse ano é possível ter um edital pronto para programar a concorrência do transporte coletivo da região metropolitana de Curitiba. Ele explica que, antes de formatar o edital, é preciso debater o modelo do sistema, a rede integrada e o plano de mobilidade da RMC.
Metrocard entende que tem garantias legais
A Associação Metrocard informou, por meio da assessoria de imprensa, que há respaldo legal na portaria nº 06/2008 da Comec e também na Lei Federal do Vale Transporte no seu artigo 9.º para que os créditos expirados sejam revertidos para sua conta. Segundo a Metrocard, esse artigo dispõe que os vales-transporte perdem sua validade 30 dias após a data do reajuste, que usualmente é anual.
A associação alega ainda que o prazo de validade já é um procedimento sacramentado em outros setores econômicos, como o de passagens aéreas e o de créditos de telefonia pré-paga.
“Deve se destacar que esta é uma condição contratual da qual o consumidor ou a empresa que adquire o vale-transporte de seus empregados declara ciência e aceitação no momento de aquisição dos créditos de transporte”, explica o texto da associação.
Segundo o texto das empresas, a associação desconhece o valor de mais de R$ 900 mil em créditos expirados no último trimestre. “O valor dos créditos expirados entre abril e junho foi de cerca de R$ 3 mil por empresa por mês, sendo que são 11 as empresas metropolitanas correspondentes. Para o período de abril a junho de 2015, esse montante representou 0,76% (menos de um por cento) de todos os créditos de transporte vendidos no período”, afirma a nota. Para a associação, este índice é bastante baixo.
Equívoco
Em um primeiro contato da reportagem com a Associação Metrocard, foi solicitado erroneamente respostas referentes a créditos agendados, aqueles que ficam em um sistema de espera em casos de cartões cheios – há um limite de R$ 450. A reportagem, que pretendia pedir esclarecimento sobre os créditos expirados de vales-transporte, voltou a pedir informações à Metrocard, agora com o termo correto. A associação informou que manteria a mesma resposta anterior.
Sobre isso, a associação afirmou que os créditos agendados seguem sendo válidos após um ano e fica disponível por mais 12 meses, caso o usuário ou responsável pelo cartão não solicite o carregamento.
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