Nas últimas duas semanas, milhares de agricultores bloquearam estradas e fizeram barulho em diversos pontos do país para char a atenção para a crise financeira enfrentada pelo setor e pedir ajuda do governo federal. Embora invoquem a baixa na remuneração – provocada pela valorização do real e a baixa no preço internacional das commodities – como justificativa para a dificuldade de pagar as dívidas, há quem atribua aos próprios produtores rurais, e à falta de planejamento deles, a responsabilidade por seus problemas financeiros.

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"A origem dessa crise está em um período de euforia vivido em 2003 e 2004, época de pico na taxa de câmbio e elevação do preço dos produtos no mercado internacional, principalmente da soja", diz o professor de Economia Agrária Guilherme da Silva Dias, da Universidade de São Paulo (USP). "Era um processo insustentável, mas que, acompanhado de linhas de crédito abundantes e favoráveis, fez com que muitos agricultores se endividassem sem prudência."

Segundo o professor, nessa época muitos produtores expandiram sua produção com novos investimentos, sem mesmo ter pago outros refinanciamentos feitos pelo governo em decorrência de uma outra crise em 1994. "As dívidas, na época, foram solucionadas por meio de uma securitização. Mas em 2004, o índice de inadimplência delas ainda era entre 22% e 24%."

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Hoje, o pesquisador diz que a maior parte da dívida dos agricultores é com a iniciativa privada e não com o governo. Segundo dados do Ministério da Agricultura, 60% delas estão nas indústrias, cooperativas e fornecedores. "Os produtores estão reivindicando e o governo deve atender. Vai utilizar R$ 20 bilhões para tirar essas dívidas do privado e colocar em instituições financeiras públicas e evitar que a crise seja ainda maior."

Velho conhecido

O resultado, segundo Dias, é velho conhecido dos brasileiros. A medida vai causar um novo salto na dívida pública do país, que deve ser paga não pelos agricultores, mas pelos demais setores da sociedade. "Quem garante que esse financiamento é também para não ser pago? Estamos em cima de uma bola de neve."

Para o gerente executivo de Agronegócios do Banco do Brasil, Rogério Pio, os agricultores são excelentes produtores, mas pecam na hora de negociar. "Eles têm tecnologia avançada de produção e usam os insumos adequados. O que eles precisam, no entanto, é passar a se preocupar mais com o processo de comercialização." Pio acredita que a solução não ocorre em curto prazo, porque depende de uma mudança cultural. "A procura pelas ferramentas da Bolsa de Mercadorias & Futuros, por exemplo – caminho importante para assegurar a safra – cresceu 16,5% entre janeiro e abril deste ano, se comparada ao mesmo período de 2005. Mas a parcela de agricultores que pega um financiamento no banco e já faz a proteção ainda é muito pequena", avalia. "Muitos nem sabem dessa opção."

O Banco do Brasil tem uma carteira de crédito para agronegócios de R$ 38 bilhões. Em 2005, segundo o gerente, apenas 12 mil contratos – que totalizam R$ 300 mil – utilizaram as ferramentas de proteção.

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Política agrícola

O agrônomo Rodrigo Rodrigues, um dos proprietários da consultoria em agronegócios Impar, também acredita que os produtores rurais poderiam ter se protegido mais, embora atribua boa parte da crise à falta de uma política agrícola adequada no país. "Em parte os problemas poderiam ser evitados, mas tem muita coisa que é imponderável. Temos que lembrar que, na média, o agricultor paranaense tem baixo nível de escolaridade e dificuldade de fazer um planejamento."

Para o consultor, o agricultor brasileiro sofre com crédito caro, alto custo tributário e falta de validade dos contratos. "Neste país, eles são feitos para serem quebrados", diz. "Há falta de planejamento por parte do agricultor, mas também falta sensibilidade por parte do governo nas questões financeiras."

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