Um caso ocorrido em 2008 e que comoveu Londrina finalmente foi concluído na Justiça. A família de Daniela Aparecida Dias da Silva – hoje com 18 anos – prepara-se para receber, esta semana, a primeira parte de uma indenização por danos morais, físicos e estéticos, de R$ 250 mil. O valor é resultado da condenação do Estado do Paraná por uma ação policial desastrosa que, por pouco, não acabou em uma tragédia ainda maior.
No dia 16 de março de 2008, Daniela, então com 11 anos, brincava com a irmã Débora na porta de casa no Sítio São Carlos, no distrito da Warta, quando quatro policiais da Rotam invadiram o local e atiraram em direção a uma plantação.
Uma dos disparos atingiu Daniela. O tiro, apontou um laudo, saiu da arma de um dos policiais. Após 10 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), Daniela teve que colocar uma prótese para preencher um buraco de 8 centímetros na cabeça.
A alegação dada pelos policiais é de que eles estavam perseguindo ladrões. No entanto, os bandidos nunca foram encontrados. Além disso, a perseguição sequer foi comprovada, segundo apuração da Polícia Civil.
“É um caso bastante raro ver um processo acabar assim, sem problemas, e ainda com indenizações consideradas justas pelas vítimas”, diz o advogado Guilherme Espiga, do escritório Divaldo Espiga. Durante o processo, o Estado do Paraná deixou de recorrer indefinidamente, o que acabou na confirmação, em prazo razoável, da decisão do juiz Jamil Riech Filho, da 4.ª Vara Cível de Londrina.
Todos os integrantes da família receberão valores entre R$ 20 mil e R$ 50 mil. A Justiça considerou que todos sofreram danos com a ação policial, inclusive o pai de Daniela, Claudemir; a própria Daniela; a irmã Débora; e outros dois irmãos que também tinham menos de 18 anos na época da abordagem da PM.
O pai de Daniela trabalhava na plantação do sítio quando ouviu os tiros e foi ao encontro da filha. Acabou algemado pelos policiais militares e chegou a ser apontado como suspeito. A irmã de Daniela, Débora, e outros dois irmãos presenciaram a cena. Ameaçados pelos policiais, na mesma época deixaram o sítio.
“Hoje, felizmente, Daniela não tem sequelas, nem dificuldades. Está ótima e segue a vida em frente, assim como toda a família”, afirma o advogado. “Ninguém que se sinta agredido em seus direitos, ainda mais em casos de violência policial, deve deixar de buscar a reparação. O resultado deste processo deveria servir de precedenteem todos os níveis”, diz.
Depoimento emocionado
Em 2012, quando o JL mais uma vez abordou o caso, a irmã de Daniela, Débora – hoje com 21 anos, 14 na época – deu um depoimento emocionado sobre aquele dia:
“Quando o camburão chegou no sítio, eu estava brincando. A polícia procurava um carro roubado igual ao do meu tio, estacionado na nossa porta. Quando ele viu os policiais mexendo no carro, avisou de longe que era dele. Nem terminou de falar e os tiros vieram. Puxei minha irmã para dentro de casa e as outras crianças também, de um, dois e sete anos. Quando puxei a Daniela, acertaram na cabeça. Meu pai trabalhava na roça e na hora que chegou, a PM algemou ele na viatura. Um dos policiais jogou uma arma no meio do cafezal e tentou dizer que era do meu pai. O perito da Polícia disse que todas as balas estavam no revólver, nenhum tiro foi disparado. Quando a minha irmã estava agonizando no chão, um PM chegou perto dela erguendo o pé para pisar na cabeça da Daniela. Todo mundo ouviu ele dizendo que ia ‘terminar o serviço’ porque já tinha feito tudo errado mesmo. Empurrei o PM e ele reagiu com vários socos nas costas. Me chutou, bateu, me xingou e fez o mesmo com a minha mãe, que desmaiou na hora. E eu só tinha 14 anos. Ameaçaram e disseram que iam voltar para nos matar se contássemos a verdade. Obrigaram a gente a falar que o tiro veio dos ladrões, que nunca foram achados. Minha família ficou traumatizada, mas é um milagre a minha irmã estar viva.”