Em novembro de 2014, a cidade de Nova York baixou o limite de velocidade de 48 para 40 quilômetros por hora. As reações foram diversas. Amy Cohen, mãe do pequeno Sammy - morto aos 12 anos vítima de atropelamento - comemorou. O colunista Denis Hamill decretou no “New York Daily News” que a “cidade que nunca dorme” agora seria a “que nunca acelera”. O jornalista previu aumento de “mortes por raiva” com o trânsito da cidade.
No Brasil, a adoção de medidas semelhantes em Curitiba e São Paulo, no ano passado, causaram comoção semelhante, contra e a favor. Mais do que um ação isolada, especialistas do trânsito acreditam que a redução é tendência que veio para ficar. Grandes cidades do mundo todo tendem a adotar ações “mais humanas” . Ainda que isso implique em mais tempo de deslocamento para os veículos individuais.
O debate não é novo. Nos 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo, o limite de 50 quilômetros por hora já é praticado “há muito tempo”, explica o superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Luiz Carlos Mantovani Néspoli.
Países que diminuiram a velocidade como parte de um pacote de segurança viária, a partir dos anos 1980, hoje reduzem ainda mais. Paris, na França, tem 600 quilômetros de vias com máxima de 30 km por hora. Mesmo valor adotado nas ruas residenciais de Toronto, no Canadá, em setembro de 2015. No início dos anos 2000, a cidade canadense baixou todas as suas ruas de 50 para 40 por hora.
Londres, na Inglaterra, adotou as 20 milhas por hora (cerca de 32 quilômetros) em 2013, no Centro, e em 2015, em suas vias principais. A ideia era reduzir o número de acidentes fatais pela metade em dez anos. A meta já havia sido atingida ao final de 2015. As políticas que visam erradicar acidentes com mortes no trânsito são chamadas “visão zero”.
Diretor do Observatório Nacional de Segurança Viária, José Ramalho defende que a redução do limite pode tornar o trânsito mais rápido, e não o contrário, já que aumenta a chamada fluidez. “Diminui aquelas batidinhas traseiras, atropelamentos de motociclistas, [coisas que travam] o trânsito”.
Néspoli, da ANTP, acredita que é um consenso para a engenharia de trânsito que a redução da velocidade traz ganhos em fluidez. “As pessoas acham que congestiona, é um mito”. Com velocidade abaixo de 50 quilômetros por hora, a capacidade da via aumenta, e mais carros podem passar em um mesmo intervalo de tempo, diz ele.
Presidente da Associação de Engenheiros e Arquitetos de São José dos Campos (AEA), Carlos Vilhena assina embaixo. “[O trânsito] tem que ser compatível para ciclistas, pedestres e veículos”. Ele cita os corredores de ônibus, nos quais não se trafegam mais em alta velocidade.
Mudança cultural
A redução da velocidade enfrenta resistências na sociedade. A seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por exemplo, entrou com ação para reverter na justiça as medidas adotadas na capital paulista. O presidente da Ordem, Marcos da Costa, explica que o problema foi o processo democrático. A entidade não é a favor nem contra a mudança de velocidade máxima, mas acredita que o tema deva ser debatido na sociedade como um todo. Uma ação para reverter a medida aguarda decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
A “cultura da velocidade” deve ser o grande entrave para a adoção de medidas similares em outras cidades brasileiras, na opinião de Luiz Carlos Néspoli. “É uma mudança cultural que envolve mudança de hábito, e as pessoas não gostam. O tempo vai mostrar que isso é fundamental”.
Números
- Em São Paulo, 189 pessoas morreram em acidentes de trânsito entre julho e dezembro de 2015, período após a implantação da velocidade reduzida nas marginais Tietê e Pinheiros. Nos dez anos anteriores, a média para o segundo semestre foi de 323. A redução foi de 134.
- Uma morte foi registrada dentro do perímetro da Área Calma, em Curitiba, em 2015, contra seis no ano anterior. Em toda a cidade, o número de mortes no trânsito passou de 223 para 184, no período, seguindo uma tendência de queda dos anos anteriores.
- Em Londres, 89% dos acidentes com morte de ciclistas ocorreram em vias de até 48 quilômetros por hora (30 milhas). Apenas 2% em ruas com limite de 32 quilômetros (20 milhas) por hora. A pesquisa foi feita entre 2007 e 2011, a pedido da prefeitura.
- Em Nova York,1% foi a queda no número de acidentes com a “Visão Zero” entre janeiro e setembro de 2015, em relação ao mesmo período do ano anterior. Acidentes fatais caíram 12%, no mesmo período. Vítimas seriamente feriadas sofreram decréscimo de 2,5%.
- 40 km/h é a velocidade máxima permitida nos centros de Curitiba e Goiânia. Em São Paulo, o limite é de 60 km/h nas marginais e de 50 km/h nas avenidas locais.
- 25% foi a redução real da velocidade em Londres, ou seja, 10 milhas por hora a menos na lei equivalem a carros 2,5 milhas mais lentos. O estudo é do conselho de governantes da cidade (Lednet).
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