Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consultados pela reportagem adiantaram nesta quinta-feira (28) que podem "deslocar" a reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, para deixar livres às Forças Armadas as faixas de fronteira do Brasil com a Venezuela e com a Guiana. A demarcação permaneceria da forma contínua, como determinou o governo, mas o tamanho da reserva seria reduzido.

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A decisão nesse sentido contrariaria o voto do relator da ação contra a demarcação, ministro Carlos Ayres Britto, que foi favorável à demarcação nos moldes originais. Quatro dos 11 ministros mostraram-se propensos a fazer ressalvas ao voto de Britto, classificado por um colega de "romântico" e visto por outros como superficial - mesmo tendo 108 páginas. Para que sejam feitas alterações na reserva são necessários seis votos. Os demais ministros preferiram não se pronunciar, mesmo reservadamente.

Esses ministros analisam que, da forma como foi feita a demarcação, a soberania do País estaria comprometida. Um deles disse que o voto, se mantido, é um "passo para o separatismo" de índios e brancos. Isso porque os índios que ocupam a região têm parentes nos dois lados da fronteira (no Brasil e na Venezuela) e trafegam livremente pelos dois lados. Nem mesmo a determinação do governo de que batalhões do Exército sejam instalados na área convence esses ministros. Um deles, que esteve em Roraima, afirmou que o Exército se vê obrigado a fazer convênios com índios para que tenham a entrada nas terras facilitada.

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A preocupação desses ministros é reforçada com a assinatura do Brasil na Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, da Organização das Nações Unidas (ONU). Por esse documento, os índios podem decidir livremente sua condição política, têm liberdade para estabelecer relações com povos do outro lado da fronteira e têm autonomia para decidir assuntos internos.

Apesar de o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ter declarado que a presença dos índios não atrapalha a ação dos militares na fronteira, os ministros do Supremo se mostraram sensíveis aos argumentos de parte do Exército, contrária à demarcação.

Em seu voto, o relator da ação foi duro ao tratar dessa suposta ameaça à soberania do Brasil. Ele classificou como tentativa de desviar o foco da discussão o argumento de que a ocupação pelos índios poderia atentar contra a soberania nacional.

"Não é por aí que se pode falar de abertura de flancos para o tráfico de entorpecentes e drogas afins, nem para o tráfico de armas e exportação ilícita de madeira. Tampouco de perigo para a soberania nacional, senão, quem sabe, como uma espécie de desvio de foco ou cortina de fumaça para minimizar a importância do fato de que empresas e cidadãos estrangeiros é que vêm promovendo a internacionalização fundiária da Amazônia Legal, pela crescente aquisição de grandes extensões de terras", afirmou Britto durante o julgamento.

Depois do voto de Britto, Direito pediu vista, o que adiou o julgamento para data indeterminada. Direito, inclusive, será o primeiro dos ministros a suscitar a preocupação com a soberania do País e deve abrir a divergência no julgamento.

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ILHAS

Apesar de admitirem a possibilidade de manter a demarcação contínua, alguns ministros afirmaram ser necessário descobrir quais terras eram ocupadas pelos índios à época da demarcação.

Se ficar evidenciado que determinadas faixas de terra não eram ocupadas pelos índios, admitiram dois ministros, podem propor a exclusão dessa extensão de terra da reserva demarcada.

De acordo com um dos ministros - que conhece a região -, as terras ocupadas pelos arrozeiros não seriam povoadas pelos índios e por isso não haveria razão para que fossem integradas à reserva.

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