Motoristas colaboradores querem manter a ilegalidade das vendas de licenças e pedem mais chances de obter as permissões| Foto: Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo

Senadores reconhecem monopólio, mas se contradizem no discurso

O parecer assinado por 12 dos 47 senadores da Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado reconhece que em geral não há seleção transparente dos motoristas e os novos prestadores são obrigados a comprar a licença dos antigos. "A existência de um mercado como esse é resultado de restrições à oferta dos serviços, que cria uma renda de monopólio em favor dos titulares", diz o parecer. Para a comissão, a solução do problema passa pela reformulação no modelo de regulação do serviço, que elimine restrições à entrada de novos prestadores, de modo a acabar com a reserva de mercado existente em favor dos taxistas já estabelecidos.

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"Somos escravos sobre rodas"

Motoristas de táxi de Curitiba já estão sendo avisados pelos donos das permissões que terão de entregar o carro durante o mês de dezembro. É nessa época do ano que o setor mais fatura, devido à bandeira dois ao longo de todo o dia, uma forma de proporcionar aos colaboradores um ganho extra, já que não recebem 13º salário. "Agora que a gente poderia ganhar alguma coisa, o dono da permissão vai usar o carro para ele faturar mais ainda", reclama um colaborador, que não quer se identificar para não perder o emprego. Pelo menos dois motoristas ouvidos pela reportagem já foram comunicados.

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Cassado semana passada por abuso de poder econômico nas eleições de 2006, Expedito Júnior não chegou nem à metade do mandato de senador, mas deixou um projeto de lei que mexe com o serviço de táxi em todo o país. Já aprovada no Senado, a proposta legaliza a compra e venda de licenças alegando que o comércio de autorizações para a exploração dos táxis é uma prática enraizada e socialmente aceita, apesar de não estar prevista em lei. Nem todos concordam com o ex-senador de Rondônia. Esta semana, um grupo de motoristas colaboradores começa a procurar parlamentares da bancada do Paraná dispostos a barrar o projeto na Câmara dos Deputados, onde ele tramita agora.O projeto interessa, e muito, aos 4,9 mil motoristas de táxi com registro ativo na Urbs. A maioria é contra a proposta, e por uma razão bem simples: dos 2.246 táxis em circulação, 2.029 estão em nome de pessoas físicas e 217 em nome de empresas. São eles os beneficiados com a possível legalização de um negócio hoje feito na surdina. Os demais continuarão na função de colaboradores, sem direitos trabalhistas – legalmente, taxista é apenas quem detém a permissão para explorar o serviço; colaborador é quem trabalha para o primeiro, sem qualquer contrato –, a não ser que disponham de R$ 180 mil para comprar uma licença. Esse é o valor de uma placa em Curitiba, negociada num mercado clandestino que movimenta até R$ 14 milhões por ano na capital.

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Comércio ilegal

Há um ano a Gazeta do Povo revelou o comércio ilegal, motivo de cassação da licença. Para burlar a lei, que limita a uma licença por pessoa, muitos usam laranjas. A Urbs vinha homologando em média 70 transferências por ano, todas vistas como "doação" para outra pessoa. A reportagem conseguiu provas de que se tratava de venda. A Urbs suspendeu as transferências, convocou um recadastramento de todos os taxistas e afastou um chefe do setor de fiscalização. Terminado o recadastramento, no dia 31 de março, o comércio clandestino voltou ao normal.

Ao propor a legalização do comércio de licenças no país, o senador cassado alega que o transporte por táxi é mal regulamentado. "Como a exploração do serviço é condicionada à outorga, desenvolveu-se a prática da comercialização e locação dessas autorizações", diz. "Ainda que enraizado na prática brasileira, socialmente aceita, esse costume não dispõe de regulamentação expressa, quer em nível nacional, quer municipal. Isso geralmente ocorre sob a justificativa de que não se deseja estimular a mercantilização desses documentos", observa. E conclui: "O mercado de autorizações existe, movido por uma permanente e sempre ávida demanda."

Para o ex-senador, há nas grandes cidades uma intensa procura por licenças devido ao número restrito e à hesitação dos municípios em liberalizar o mercado de táxi. "Um mercado puramente informal, embora grande e consolidado, se acha preso ao arbítrio da autoridade e sujeito a todo tipo de demagogia", diz. "O que proponho é acabar com tal lacuna, estabelecendo, de uma vez por todas, que as autorizações recebidas podem ser objeto de locação e de transmissão definitiva de titularidade, a título oneroso ou gratuito." O projeto prevê ainda que, na morte do titular, a permissão vá para os sucessores.

Contraproposta

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Os motoristas colaboradores de Curitiba vão propor exatamente o contrário. A proposta tem seis itens: proíbe a transferência de permissão; pela ordem, o colaborador mais antigo tem o direito à próxima permissão, sem ônus; quem completar 75 anos deve entregar a permissão ao órgão gestor; o taxista deverá firmar contrato de trabalho com o colaborador para recolher encargos trabalhistas; em caso de morte do titular, a viúva terá direito a explorar o serviço por mais cinco anos, depois dos quais a permissão será recolhida pelo órgão gestor e passada ao próximo colaborador; o titular terá de indenizar por tempo de serviço o colaborador dispensado.

"Com este projeto de lei simples, acabaremos com a escravidão sobre rodas e daremos dignidade aos colaboradores", diz um deles, que prefere não se identificar para não sofrer represálias. Ele acredita que, dando a licença para quem realmente trabalha, será possível evitar que médicos, políticos, advogados e funcionários públicos continuem a explorar a mão de obra dos colaboradores.