Apesar da multidão que nesta terça-feira (19) tomou as ruas de Curitiba – mais de 30 mil pessoas, segundo os sindicatos –, a greve dos servidores estaduais está longe do fim. Não há novas propostas. O governo do Paraná se recusa a reabrir as negociações enquanto os funcionários em greve não encerrarem a paralisação. O clima no Centro Cívico, porém, mostrou que o funcionalismo não está disposto a ceder. Ainda nessa terça-feira, após a marcha, os agentes penitenciários decidiram cruzar os braços, engrossando o coro de greve geral.
Marcha nas ruas e manifestações na Assembleia marcam a mobilização
- Diego Ribeiro, Catarina Scortecci e Felippe Aníbal
Milhares de servidores públicos estaduais marcharam, nessa terça-feira (19), pelas principais ruas do Centro e do Centro Cívico de Curitiba. Sob o slogan ‘Menos bala, mais giz’, a manifestação relembrou o ato de 29 de abril, quando os funcionários foram duramente reprimidos pela Polícia Militar (PM) – episódio que ficou conhecido como “a batalha do Centro Cívico”.
Segundo sindicatos e a Guarda Municipal, mais de 30 mil pessoas fizeram parte da multidão que tomou parte no protesto. Apesar de ter afetado o trânsito, a manifestação ganhou aplausos de transeuntes e de moradores da região.
“Os servidores, de todos os lugares do estado, estão nas ruas. É um momento histórico de luta, que deve servir como exemplo”, definiu Marlei Fernandes, do Fórum das Entidades Sindicais.
Pressão
No fim da manhã, a manifestação se concentrou em frente à Assembleia Legislativa. Um grupo de servidores pôde acompanhar a sessão e, nas galerias do plenário, não deu sossego aos parlamentares. Os deputados da base do governo foram insistentemente vaiados, o que fez com que o presidente da Assembleia, Ademar Traiano (PSDB) encerrasse a sessão.
Assim que os trabalhos foram interrompidos, ainda nas galerias, os servidores cantaram o hino nacional e, em seguida, gritaram palavras de ordem, como “fora, Beto Richa” e “CPI, CPI, CPI”. “O anúncio do corte de ponto dos servidores só serviu para indignar ainda mais as categorias. Todos estão com a intenção de continuar em greve geral”, disse o diretor de comunicação da APP-Sindicato, Luiz Fernando Rodrigues.
Acampamento
À noite, os funcionários se dividiram. Parte passaria a noite em um acampamento em frente da Assembleia, enquanto outro grupo pernoitaria diante da Secretaria de Estado da Fazenda. Hoje, os servidores participam de uma audiência pública no Plenarinho da Assembleia, que terá por objetivo debater as finanças do estado.
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“O governo está em uma crise, mas escolheu um único setor – o funcionalismo público estadual – para pagar esta conta. Mas os servidores não vão aceitar arcar com todo esse peso. Não vamos abrir mão de direitos”, disse Hermes Leão, presidente da APP-Sindicato. “Nós não vamos arredar pé”, resumiu Marlei Fernandes, diretora do Fórum das Entidades Sindicais (FES).
Os servidores reivindicam reajuste salarial de 8,17%, índice que corresponde à variação da inflação (pelo IPCA) nos últimos 12 meses. O governo, por sua vez, ofereceu reposição de 5%. E ponto final. Porém o projeto de lei que estabelece esse índice ainda não foi encaminhado à Assembleia Legislativa. Ainda que seja enviada, a propositura deve enfrentar grande resistência entre os deputados (leia mais nesta página).
“A maioria [dos parlamentares] entende que é necessário chegar aos 8,17% [de reajuste], mas o governo diz que não tem recursos. A saída para isso é o diálogo. O problema é que, enquanto isso, tem o ônus da greve”, avaliou Luiz Cláudio Romanelli (PMDB), líder do governo na Assembleia. Deputados do PSC – da base do governo – chegaram a declarar que se negam a votar qualquer proposta inferior ao patamar defendido pelos servidores.
Apesar do estremecimento em sua base, o governo deu mostras de que optou pela estratégia de partir para uma queda-de-braço com os servidores. Na semana passada, quando considerou as negociações encerradas, chegou a anunciar que cortaria o ponto dos grevistas. Nessa terça-feira, a Casa Civil recebeu lideranças dos servidores, mas ressaltou que o encontro não era uma retomada das negociações.
“Este é o índice [5%] possível neste momento. O governo está fazendo um grande esforço para chegar neste percentual (...). Qualquer outra negociação pode ser retomada com o fim da greve, sem intransigências”, disse em nota o secretário-chefe da Casa Civil, Eduardo Sciarra.
Enquanto isso, os servidores da rede estadual de educação completam 52 dias parados, deixando quase um milhão de estudantes sem aula. Hoje, o comando de greve da categoria se reúne, mas os dirigentes falam apenas em manter a paralisação. As sete universidades estaduais também estão em greve. A partir de sábado, os agentes também param. Os servidores da saúde se mantêm em estado de greve.
Futuro político é o que faz os deputados se mexerem
- Euclides Lucas Garcia e Rogerio Waldrigues Galindo
A incerteza em torno de qual proposta de reajuste será enviada pelo governo à Assembleia Legislativa não tem relação apenas com as críticas dos servidores e a ameaça de greve geral do funcionalismo público. Desgastados, vários deputados da base aliada admitem publicamente que votarão contra o projeto caso o índice permaneça nos 5%.
Em menos de quatro meses da atual legislatura, a leitura dos parlamentares governistas é que ainda não conseguiram começar o mandato. Em fevereiro, enfrentaram o episódio da chegada à Casa dentro do ônibus da tropa de choque. No mês passado, votaram a reforma da previdência em meio aos confrontos no Centro Cívico. Muitos têm enfrentado protestos na porta de casa e, por semanas, evitaram retornar ao interior, nas suas bases eleitorais.
“Todos disseram que estão no limite. Não têm como comprar mais uma briga, pegar mais um rabo de foguete. Ninguém está falando em pedir liberação de emendas, nada. Simplesmente, dizem que não votam esse projeto”, desabafou um deputado aliado ao governador Beto Richa (PSDB).
“O governo precisa fazer um esforço para chegar aos 8,17%. Não estamos criando impasse, apenas queremos ajudar. Claro que não dá para prever. Mas, hoje, acho que eles perdem essa votação aqui”, afirmou Hussein Bakri, líder da maior bancada da Casa, a do PSC, que tem 12 parlamentares.
Emenda
Diante da sinalização do Executivo de que não pretende recuar, circula na Assembleia a ideia de emendar o eventual projeto do governo e majorar o reajuste de 5% para 8,17%. A própria Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, porém, já alertou os deputados que a alteração é inconstitucional, pois cria despesas para o governo. “Quando eles entenderem que a base vai fazer a emenda, eles vão mandar o projeto desse jeito, com 8%, nem que seja parcelado. Eles não vão querer perder no plenário”, disse um parlamentar peemedebista.
“Cada deputado tem o livre arbítrio de votar com a sua consciência. Mas ainda acredito que possamos chegar a um consenso”, afirmou o líder do governo, Luiz Claudio Romanelli (PMDB).
Para servidores, é possível dar o reajuste maior com economia de outros poderes
Os servidores públicos estaduais sugeriram ao governo que reduza o volume de repasse obrigatório aos poderes, como forma de reequilibrar o caixa do Paraná. Na avaliação da categoria, com o “corte” seria possível manter a reposição salarial ao funcionalismo – ponto nevrálgico da greve. Hoje, o dinheiro destinado aos poderes do estado é repassado de forma vinculada, ou seja, de acordo com porcentuais fixos no orçamento: 3,1% para a Assembleia Legislativa, 1,9% ao Tribunal de Contas, 9,5% para o Tribunal de Justiça e 4,1% ao Ministério Público.
“Na reunião, o próprio governo reconheceu que o Legislativo e o Judiciário são ilhas de prosperidade em meio a um oceano de dificuldades. Sobra dinheiro para eles. Esses porcentuais precisam ser revistos”, defendeu o presidente da APP-Sindicato, Hermes Leão, pouco depois de deixar o encontro na Casa Civil.
Ao longo do primeiro governo Beto Richa (PSDB), o Executivo tentou por pelo menos duas vezes retirar o Fundo de Participação dos Estados (FPE) da base de cálculo do porcentual destinado aos outros poderes. Isso deixaria cerca de R$ 500 milhões por ano a mais no caixa do governo. Deputados aliados, porém, afirmam que todas as vezes em que a proposta é colocada na mesa os representantes dos poderes do estado “dão chilique, piti” e a discussão é encerrada de pronto. (FA e ELG)
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