O Senado aprovou na noite desta terça (22), em votação simbólica, o projeto de lei que autoriza a produção, a venda e o uso da fosfoetanolamina, conhecida como a “pílula do câncer”, logo depois de os primeiros resultados independentes com a droga indicarem que ela tem pouco ou nenhum efeito sobre células tumorais.
A substância ainda não passou por estudos em animais e humanos que comprovem sua segurança e eficácia nem tem registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Já avalizada pela Câmara, a proposta agora segue para a sanção da presidente Dilma Rousseff.
Segundo o texto, pessoas com câncer poderão usar a fosfoetanolamina desde que apresentem laudo médico com a comprovação do diagnóstico. Também precisarão assinar termo de consentimento e responsabilidade.
A proposta destaca ainda que fica autorizada a produção, importação, distribuição, prescrição, posse ou uso da substância, independente de registro sanitário, em caráter excepcional, enquanto estiverem em curso estudos clínicos do produto”.
A proposta recebeu parecer favorável das comissões de Ciência e Tecnologia (CCT) e de Assuntos Sociais (CAS). Em seu relatório na CCT, o senador Ivo Cassol (PP-RO)destacou o fato de a fosfoetanolamina sintética não ter seguido “trâmites habituais de desenvolvimento de medicamentos antineoplásicos”.
“De fato, algumas etapas que deveriam ter precedido sua distribuição aos pacientes oncológicos não foram cumpridas. No entanto, o Estado brasileiro não pode ignorar o fato de estarmos diante de uma das mais relevantes descobertas médicas dos últimos anos”, diz.
Os primeiros resultados de testes independentes feitos com a pílula, divulgados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, porém, não foram bons. Segundo as análises, ela teve desempenho muito inferior ao de drogas anticâncer já disponíveis há décadas.
A pasta investiu em testes após pressão de pacientes que relatavam melhora com a substância, desenvolvida pela USP de São Carlos
“Mesmo com alguma atividade, as drogas presentes só teriam efeitos em concentrações que inviabilizam a produção de um medicamento”, afirma o oncologista e professor da Universidade Johns Hopkins, Gilberto Lopes Jr.
“Antes se supunha que os testes pré-clínicos [em animais e células] haviam sido bem feitos. Agora, se eu estivesse em um comitê de ética para avaliar estudo em humanos, dificilmente aprovaria a inclusão de pacientes”.
Ele diz que não há relatos entre os oncologistas de que a droga funcione. “A aprovação desacredita a Anvisa. A gente está ‘canetando’ uma suposta pílula para a qual ninguém viu nenhuma atividade anticâncer.”
Para Lopes, “se não há atividade em modelos experimentais, a probabilidade de existir atividade em humanos é quase nula.”
Coordenador dos estudos clínicos no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, Paulo Hoff diz que, ainda que as evidências de estudos apontem na direção contrária, é importante fazer os estudos em humanos.
“Nossa obrigação é dar o melhor tratamento ao paciente, e, para isso, é necessário que haja evidência sólida. Os estudos clínicos são a solução para essa questão”, diz.
“Claro que nós preferiríamos conduzir os estudos com base em resultados mais robustos, mas eles ainda se justificam pela importância que a população dá ao tema.”
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