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IML de Curitiba: funcionários eram subornados para colaborar com o esquema | Hugo Harada/ Gazeta do Povo
IML de Curitiba: funcionários eram subornados para colaborar com o esquema| Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo

Uma quadrilha suspeita de aplicar golpes para obter o seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT) e driblar o rodízio de empresas funerárias em Curitiba foi presa na manhã desta terça-feira (26) pela Polícia Civil. Ao todo 12 pessoas foram detidas durante a chamada “Operação Ressurreição”. Entre os presos estão donos de funerárias, quatro motoristas do Instituto Médico Legal (IML) e empresários. As pessoas detidas serão indiciadas pelos crimes de associação criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva, estelionato e falsidade ideológica.

Um “morto” também está preso

Um caso inusitado durante as investigações foi a descoberta de que um dos “cabeças” do esquema fraudulento, Luciano Alis Ferreira, tentou fraudar a morte do próprio pai, Luiz Gonzaga Ferreira. Segundo a polícia, Luciano chegou a fazer um Boletim de Ocorrência no dia 25 de fevereiro de 2015 comunicando a morte do pai vítima de atropelamento. Para a surpresa dos investigadores, o “morto” apareceu em uma das conversas interceptadas autorizadas pela Justiça. Luciano diz ao pai: “Vou pedir uns R$ 8 mil, R$ 10 mil agora que está na mão. Não vou nem avisar o Tiago. Vamos só nós dois pai, ganhar uns R$ 4 mil”. O delegado Figueroa afirma que o nome da operação (“Ressureição”), inclusive, é uma “homenagem” a esse caso.

“Os dois estão presos. Na verdade, foram descobertos três casos de que filhos tentaram fraudar a morte dos genitores. Mas nos outros não foi comprovado se o pai estava conivente com a situação”, afirma o delegado.

Além deles, um médico da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Colombo, um advogado e um gerente de banco foram alvos de mandados de condução coercitiva, quando a pessoa é encaminhada obrigatoriamente para depor na delegacia. Elas foram ouvidas e liberadas. Segundo o delegado do Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos (Nurce), Renato Bastos Figueroa, elas também poderão ser indiciadas no decorrer das investigações. “Estamos agora investigando quanto de dinheiro e quantas famílias foram lesadas”, afirma Figueroa. A investigação iniciou em julho do ano passado e teve como ponto de partida uma denúncia do próprio IML após a documentação de um corpo ter desaparecido dos arquivos.

Em 14 mandados de busca e apreensão realizados nesta terça, foram apreendidos documentos, cinco armas e mais R$ 4,8 mil, que deveria ser utilizado para pagar propina aos funcionários do IML. Um suspeito dono de uma funerária está foragido. Outro dono de uma funerária foi preso em flagrante, já que foi encontrada uma arma em seu poder.

Os suspeitos de participar desta associação criminosa podem ser expulsos de suas funções. “Alguns dos suspeitos são funcionários públicos. Será aberto um procedimento administrativo que pode resultar até na expulsão do servidor e no ressarcimento ao erário público”, afirma o secretário da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp), Wagner Mesquita.

A investigação foi conduzida pelo Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos (Nurce) e a operação aconteceu em Curitiba, Almirante Tamandaré, Colombo, Pinhais, Piraquara e Ponta Grossa contando com a atuação de 60 policiais. De acordo com as investigações, os mentores do esquema criminoso eram Marcio Clovis Baldi da Silva, Tiago Alcaide Ferreira e Luciano Alis Ferreira.

Como eram os crimes

Segundo o delegado do Nurce, Renato Figueroa, eram duas modalidades de crime praticados pela quadrilha. Um deles envolvia mortes violentas e focava na fraude de documentos para recebimento do seguro DPVAT. Os crimes ocorriam especialmente durante a madrugada. Os integrantes da quadrilha recebiam informações privilegiadas de motoristas do IML em relação aos óbitos ocorridos em Curitiba, região metropolitana e Ponta Grossa para poder aplicar o golpe nos familiares. “A família que estava em um momento delicado acabava assinando qualquer documento”, comentou o delegado.

Exército

Em outra conversa interceptada com autorização judicial, outro integrante da quadrilha, Marcio Clovis Baldi da Silva, se passa por um oficial do Exército para tentar aplicar o golpe. Ele liga para um familiar de um dos soldados que morreu num grave acidente no dia 19 de janeiro de 2016 na PR-412 em Coroados, próximo à entrada de Guaratuba, no Litoral do Paraná. O golpe não foi consumado porque um oficial do Exército chegou no IML e a quadrilha acabou desistindo.

Figueroa relatou que dos quatro funcionários do Instituto investigados, pelo menos dois deles usam aparelhos celulares em nome dos suspeitos e obviamente pagos por eles. “Os motoristas recebiam R$ 700 para cada golpe que dava certo”, afirma. Os dados privilegiados chegavam até a quadrilha também através de socorristas do Siate. Mas, por enquanto, a investigação não conseguiu constatar de quem estes socorristas receberam dinheiro da quadrilha.

De posse das informações do morto, os integrantes da quadrilha faziam contato com os familiares para obter deles procurações para dar entrada no seguro DPVAT – cujo valor pode chegar até R$ 13,5 mil. Uma pequena parte deste dinheiro era repassada à família dos mortos e o restante ficava com a organização criminosa. A alegação era de que o restante era gasto nas despesas do enterro. “Eles entregavam cerca de R$ 2,6 mil para a família e o resto ficava com eles”, explica o delegado.

A segunda modalidade de golpe envolvia casos de mortes naturais. Após ser informada pelos motoristas envolvidos, a quadrilha ligava para o IML se passando por parentes da vítima cancelando atendimento do Instituto. “A quadrilha então acionava um médico da UPA de Colombo para atestar o óbito e direcionar o serviço funerário para as empresas ligadas ao esquema, pulando o rodízio das funerárias de Curitiba. Essas funerárias que participavam do esquema ficavam na região metropolitana da capital”, destaca.

A polícia investiga se o médico, que foi conduzido coercitivamente, era conivente com os criminosos ou se foi uma vítima desta quadrilha. “Nos casos de ‘morte natural’, inúmeras são as conversas onde eles se passam por Policiais Militares e também por servidores do IML ou até por jornalistas, visando direcionarem o sepultamento para funerárias ‘parceiras’ explica o delegado.

Início das investigações

Em julho de 2015 representantes do IML comunicaram irregularidades na liberação dos corpos de duas pessoas. No caso de Silmara de Campos Ferreira os registros sobre o óbito teriam desaparecido do Instituto, sendo ela enterrada no município da Lapa, através do esquema realizado pela quadrilha. Em julho, a Polícia Civil desencadeou a investigação.

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