Dilma poderia ser afastada apenas por causa das pedaladas e dos decretos de suplementação ou pelo “conjunto da obra” – isto é, pela soma dos erros sucessivos e das consequências nefastas da política econômica dela e do PT?
OLHO VIVO: O paranaense que pode livrar Temer de uma eventual perda de mandato
Esta discussão permeou desde o início o debate sobre as motivações para o afastamento da presidente. Discutiu-se se elas deveriam se restringir aos aspectos jurídicos dos supostos atentados à Constituição e à Lei de Responsabilidade Fiscal – como queriam os governistas – ou se deveriam abranger todos os erros apontados pela oposição. Coisas, por exemplo, como mentiras desfiadas durante a campanha de 2014, caixa-dois regado a propinas do petrolão, tentativas de obstrução à Justiça, etc. Ou ainda pela má gestão que desaguou na recessão, na inflação, no desemprego, no corte de programas sociais e investimentos.
Ontem, enquanto o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) lia, durante três horas, seu parecer favorável à admissibilidade do impeachment, a discussão já se mostrava claramente superada. Sim, é possível que o Senado, quando chegar a hora da votação, formalmente se atenha aos pressupostos jurídicos, mas para a opinião pública já não restam dúvidas que o afastamento acontecerá é pelo “conjunto da obra”.
E aí, quando se fala deste conjunto, já nem se deve restringi-lo ao âmbito do governo Dilma e do PT. Deve-se falar do grande e generalizado clima de descrédito que mina a política nacional, já que se tornou impossível dissociar uns dos outros todos os fatos responsáveis pela grande crise nacional.
Ao mesmo tempo em que ouvia a leitura do longo relatório de Anastasia, os brasileiros tomavam conhecimento e digeriam outras notícias constrangedoras e vergonhosas para o mundo político:
• o STF anunciava a promessa de julgar hoje se o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) deve ser afastado da presidência da Câmara;
• o procurador-geral de Justiça, Rodrigo Janot, enfiava Lula, Dilma, Aécio e dezenas de outros políticos no mesmo balaio de denúncias investigadas pela Operação Lava Jato;
• o provável futuro presidente, o vice Michel Temer (PMDB), montava seu governo com ministros envolvidos até o tutano na mesma Lava Jato;
• renunciava à promessa de enxugar a máquina e dava sinais de que repetirá a mesma coalizão de baixa extração político-partidária que sustentou Lula e Dilma – cenário que coloca o vice distante do elogiável papel histórico que teve Itamar Franco ao substituir o “impichado” Collor e aproxima sua biografia da de Sarney, o vice que acidentalmente virou presidente com a morte do titular Tancredo.
Como se vê, o Brasil tem tudo para continuar vítima de um imenso e ainda não concluído “conjunto da obra”.
OLHO VIVO
É do advogado paranaense Luiz Fernando Pereira, doutor em direito eleitoral, o parecer que poderá livrar o vice Michel Temer de uma eventual perda de mandato. Ainda que a presidente seja afastada da presidência, o vice não se livrará de responder à ação que corre no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por causa do caixa 2 que teria abastecido a campanha da chapa Dilma-Temer em 2014.
O parecer de Pereira rebate a tese dos partidos que requereram ao TSE a inclusão de provas colhidas pela Operação Lava Jato após o fim do prazo legal para contestações. O prazo, diz a lei, termina 15 dias após a diplomação dos eleitos, que, no caso, ocorreu em dezembro de 2014. Por isso, o TSE só poderá julgar a ação com base nas provas juntadas pelo PSDB dentro daquele prazo, diz o parecer.
A razão, que servirá à defesa do vice, é simples: não se pode deixar uma eleição sob ameaça de suspeição durante todo o mandato. Terminado o prazo de contestação, os eventuais denunciados podem responder criminalmente, mas o mandato fica intocável.
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