Respeitável público! Esta é a saudação tradicional dos apresentadores de circo para anunciar a próxima atração do picadeiro. Pois bem, respeitável público, 30 dos 38 vereadores de Curitiba anunciam a reprise de um espetáculo que a plateia brasileira está acostumada a assistir: o nada.

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O levantamento dos repórteres desta Gazeta Rogerio Waldrigues Galindo e Mariana Scoz, publicado ontem, mostra claramente o poder de sedução (ou abdução) que o presidente da Câmara Municipal, João Cláudio Derosso, exerce sobre a esmagadora maioria dos colegas. Trinta deles acham que não precisam fazer nada; apenas oito insistem na instalação de uma comissão processante, como previsto no regimento da Casa, para investigar os suspeitos contratos de publicidade firmados pela Câmara com duas agências, uma delas de propriedade da mulher de Derosso, no valor de R$ 30 milhões. Sete dos oito vão além: são favoráveis ao afastamento temporário do presidente pelo período em que durarem a investigação e o julgamento.

Os 30 seduzidos acham que nada disso é necessário. Ar­­­gumentam que o caso já está sendo investigado pelo Tribunal de Contas e pelo Ministério Público Estadual. Logo, a Câmara não tem mais obrigação nenhuma de apurar seus próprios atos, apesar dos indícios gritantes de irregularidades que ocorriam sob suas barbas. Aliás, essa tem sido a postura da maioria sempre que se coloca diante dela a missão que jurou cumprir – a de fiscalizar o bom emprego do dinheiro público. Nunca é com a própria Câmara, mas com outros.

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Mas o que eles podem esperar do Tribunal de Contas? Por mais eficiente que seja este órgão, compete-lhe simplesmente aferir a regularidade contábil das operações – se as notas foram emitidas corretamente, se a lei das licitações foi cumprida, se os recursos foram empenhados de acordo com as normas... Pelo jeito, o TC já concluiu que, sob estes pontos de vista, está tudo certo, tanto que vem aprovando as contas de Derosso desde sempre. Mesmo porque não compete ao TC julgar o mérito – se foi ou não conveniente para o interesse público o gasto de R$ 30 milhões em propaganda.

O Ministério Público seria mais eficaz. Mas suas investigações obedecem a um tempo que não é exatamente o tempo que os interesses político e público exigem. Veja-se um bom exemplo: os primeiros procedimentos do MP em relação à Assembleia Legislativa datam de muitos anos anteriores à eclosão das denúncias tornadas públicas pela série Diário Secretos publicada por este jornal. E nem todas as investigações foram concluídas até hoje. Mais: a apuração que faz é destinada à ação da Justiça, outra área sabidamente lenta quando se trata de responsabilizar os denunciados. Como se vê – outro bom exemplo – no caso do "mensalão" que explodiu em 2005 e que, até hoje, os responsáveis continuam impunes.

O caso que se desenrola na Câmara de Curitiba deve passar pelo julgamento não apenas técnico-administrativo (de responsabilidade do Tribunal de Contas) ou da legalidade e da moralidade dos atos (atribuição do Ministério Público). O julgamento deve ser também político, não no sentido partidário, mas no de questionar se a Casa está respeitando o interesse público quando faz uso do dinheiro que o contribuinte lhe entrega – ou seja, se seus gestores estão obedecendo a critérios bem mais amplos, dentre os quais os da impessoalidade, publicidade e moralidade e ética dos dispêndios que autorizam.

A maioria dos senhores vereadores dá mostras de que renunciou a exercer este papel, que é só seu; não é necessariamente do Tribunal de Contas nem do Ministério Público, como essa maioria defende.

Vai-se argumentar que não; que a Câmara está, sim, disposta a investigar. Tanto que, por iniciativa de um cidadão do povo, a Comissão de Ética já deu início aos trabalhos de apuração. Foram já dois os atos da comissão presidida pelo vereador Fran­­cisco Garcez: a) nomear um relator; b) convocar para o dia 18 um depoimento de João Cláudio Derosso.

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Seriam perfeitos, não estivessem tais atos contaminados por uma aparente tentativa de colocar em marcha uma "operação abafa". Sim, porque o presidente da Comissão, que é do PSDB, convocou outro vereador do PSDB, Jorge Yamawaki, para ser o relator. Ambos são, portanto, do partido do qual Derosso é o presidente em Curitiba. Não houve sorteio nem qualquer outro critério isento para a designação do relator. Não se pode pré-julgar, mas a prudência e a isenção recomendariam procedimento diverso.

Não se espere também dos vereadores a instauração da Comissão Processante, ideia já praticamente sepultada graças a um parecer jurídico da própria Câmara.

Respeitável público: a próxima atração é a reprise de mais uma omissão que levará ao descrédito da Câmara e à confirmação da sua irrelevância.