Taxistas causaram o caos no trânsito de Londres, Berlim, Paris e Madri na quarta-feira, em protesto contra o Uber um serviço criado no Vale do Silício que permite às pessoas arranjar carona pelo celular. O usuário do aplicativo paga pela carona preço semelhante ao que gastaria com táxi. O serviço, entretanto, é pontual. Os taxistas europeus, lógico, pensam diferente. Para eles, o aplicativo fere a regulamentação do serviço de táxi na União Europeia e ameaça as fontes de renda dos motoristas.
Não é novidade uma tecnologia entrar em conflito com interesses de um grupo de profissionais ou empresas. Isso já aconteceu, por exemplo, na indústria da música. O elemento novo é que uma tecnologia social bagunçou um serviço público regulamentado e cujos profissionais são altamente corporativos. E dadas as semelhanças, conflito parecido envolvendo taxistas deve, em algum momento, acontecer no Brasil, podendo inclusive começar em Curitiba.
Corporativismo
Apesar da liberação de 640 licenças para novos táxis e outras 110 estarem em curso na capital paranaense, não dá para dizer que o problema da falta de carros está resolvido. Com a inclusão dessas 750 novas licenças, haverá 3.002 táxis trafegando por Curitiba. Mas ainda hoje são grandes as dificuldades de se conseguir rapidamente um carro, especialmente em dias de chuva, de festas nacionais ou de grandes eventos. O pior é que fazia 40 anos que a prefeitura não ampliava a frota, algo que só pode ser explicado por um lobby muito bem sucedido.
No âmbito nacional, o corporativismo dos taxistas levou inclusive à criação de uma lei inconstitucional aprovada no ano passado, que garante aos motoristas de táxi o direito de transmitir a licença para seus herdeiros. Ou seja, a licença de táxi algo que deveria ser concedido de forma provisória e de fácil transferência se tornou uma espécie anômala de propriedade.
A regulamentação existente tem sido boa para os motoristas menos táxis nas ruas permitem maiores receitas. Mas não traz igual benefício para a população, que sofre com a carência de carros. Toda a vez que há baixa oferta (no caso, de táxis) e alta demanda abre-se uma oportunidade para os membros mais criativos da sociedade, que se encarregam de empreender uma solução inovadora. Esse é exatamente o caso da Europa.
Eficiência
Nas grandes cidades europeias, o Uber conquistou o mercado com um produto que facilita a vida do consumidor europeu, na prática ignorando uma legislação que regula e protege uma categoria profissional. A regulação europeia para táxis produziu ineficiências que são corrigidas com o uso do aplicativo produzido pela proprietária do aplicativo. Não é por outra razão que a Uber Technologies seja hoje avaliada em US$ 18,2 bilhões.
Análise
O grito dos taxistas europeus serve de alerta para as falhas que ocorrem no mercado brasileiro de transporte público. Governos têm fracassado em melhorar a mobilidade urbana e isso traz consequências, o que serve de oportunidade para algumas reflexões:
1) Em algum momento a falha do poder público em regular um serviço de táxi eficiente virá a ser compensada por empreendedores locais ou multinacionais.
2) Quando isso ocorrer, será ilegítimo manifestações para estabelecer o caos nas ruas das cidades.
3) Até porque a Constituição garante a livre iniciativa e o livre exercício profissional na forma da lei, impedir o uso de aplicativos que facilitem a vida das pessoas por desejo de categorias profissionais ou grupos econômicos só é legítimo quando isso servir diretamente para assegurar que não haverá risco direto contra a vida e a saúde das pessoas.
4) As tecnologias sociais começam a provocar uma revolução nos serviços públicos, sejam eles administrados pelo Estado ou por particulares. A razão disso é a ineficiência na administração dos serviços.
5) O poder público ainda não está preparado para essa revolução e pode se tornar sério obstáculo para a emergência de produtos e serviços inovadores que beneficiem toda a sociedade.
Conclusão
As tecnologias sociais vão bagunçar ainda mais o mundo como conhecemos hoje. Há uma necessidade tremenda de se antecipar às consequências sociais das mudanças tecnológicas e de estabelecer um ambiente fértil para a inovação. O comprometimento com lobbies, a existência de leis anacrônicas, a falta de visão estratégica e a obsessão interventora nos mercados são algumas das amarras que, se não destravadas, irão impedir o desenvolvimento local.
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