Para que serve o dinheiro público das câmaras municipais?

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Certamente a grande parte dos vereadores paranaenses não sabe responder de forma correta a per­­gun­­ta do título. Se eles soubessem, a manchete da Gazeta do Povo de domingo – "A farra das diárias engorda os salários dos vereadores" – não existiria.

Na reportagem de Carlos Oha­­ra, a Gazeta mostrou que há indícios de fraude em reembolso de viagens nos legislativos dos municípios paranaenses. Em 24 municípios de pequeno e médio porte, os parlamentares gastaram cerca de R$ 3,5 milhões com diárias de viagens. Em algumas cidades, os gastos com viagens se igualavam às despesas com salários. Em quatro municípios – Quatro Barras, Guaratuba, São Miguel do Iguaçu e Matinhos –, os vereadores receberam depósitos mensais de valor semelhante, o que poderia indicar uma forma de ocultar aumento de remuneração.

A justificativa dada por dirigentes das Câmaras de Matinhos e de São Miguel do Iguaçu foi im­­pressionante – as viagens regulares ocorreram para que os vereadores fizessem cursos. Entre­­tanto, não especificaram que cursos foram feitos, nem a conveniência deles para a melhoria do trabalho legislativo. Para se ter uma ideia do ponto em que chegaram com o desrespeito ao di­­nheiro do contribuinte, um vereador de Matinhos assumiu publicamente receber diárias integrais mesmo sem passar a noite na cidade para a qual viajou.

Os casos apresentados pela Gazeta no domingo não são os únicos que mostram a displicência com o dinheiro público. Num passado recente, a Gazeta trouxe a notícia de que "Vereadores de Curitiba gastam R$ 102 mil com idas ao exterior". A matéria, de 31 de maio de 2011, mostrava que, entre maio de 2010 e abril de 2011, vereadores de Curitiba gastaram R$ 236 mil em viagens, dos quais R$ 102 mil foram para destinos como Itália, Irlanda, África do Sul e Argentina. O resultado prático dessas viagens? Até hoje não se viu qualquer mudança que justificasse as turnês.

Todos esses episódios são exemplares. Alguns vereadores fazem "cursos", mas não demonstram quais as vantagens que isso traz para o desempenho da função de vereador. Outros vão para o exterior para se "inspirar" em modelos estrangeiros, mas não se vê mudanças de qualidade legislativa ou fiscalizadora. A atuação deles continua a mesma. Não apre­­sentam ideias inovadoras na forma de projetos de lei.

Para combater a festa de viagens e diárias custeadas com o dinheiro do contribuinte, pelo menos três medidas são necessárias. A primeira delas é dar publicidade a todas as viagens realizadas por parlamentares, com discriminação dos custos, dos objetivos da viagem e demonstração dos resultados que eram esperados. Sem transparência em todas as etapas que envolvem a viagem, não há como se avaliar se o interesse público foi atingido.

A segunda medida é justamente avaliar as informações apresentadas pelo parlamentar. A viagem precisa atender o interesse público. Como os vereadores têm essencialmente a função de produzir leis – em especial a de orçamento – e fiscalizar os atos das prefeituras, o interesse público será satisfeito quando a viagem trouxer melhoria para o desempenho dessas atividades. Do contrário, poderá facilmente ser questionada a conveniência de gastar dinheiro público com "turnês" para vereadores. O trabalho deles tem um alcance geográfico bastante limitado – o município – e, por essa razão, jornadas fora do município so­­mente são justificadas pelos be­­nefícios concretos que trazem.

A terceira medida necessária é dar uma resposta clara aos vereadores toda a vez que eles saem do seu território de atuação. Como interesse público é um conceito que muda conforme a necessidade, e como os parlamentares podem apresentar razões nem sempre convincentes sobre a utilidade de suas viagens, é importante que sejam informados da opinião dos eleitores sobre suas excursões pelo Brasil e além. Se os vereadores não sabem para que serve o dinheiro público, os cidadãos podem informá-los sobre o caminho que devem seguir.