A possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) decretar que é inconstitucional a doação de empresas nas campanhas eleitorais pegou muita gente de surpresa, mas o tema está sendo discutido há algum tempo. Em junho, o STF realizou audiência pública sobre o tema, e a grande maioria dos oradores inscritos se colocou contra o modelo atual, não apenas com seus argumentos, mas com dados.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.650 foi proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em 2011. A Procuradoria-Geral da República deu parecer sobre o assunto em julho deste ano, pela procedência da ação.
Portanto, não é justo criticar os ministros do STF por "ativismo judicial" ou interferência nas questões do Legislativo. Especialistas da área política e jurídica já se mostraram favoráveis ao fim do financiamento privado da forma como é feita hoje.
Do outro lado do debate, os defensores do sistema atual argumentam que qualquer cerceamento é um atentado contra a democracia, e que todos têm o direito de participar do processo político. O Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), na audiência pública sobre o tema, ressaltou que as empresas pagam impostos, têm responsabilidade social e por isso têm legitimidade para participar do processo político.
Entretanto, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no julgamento da ação, ressaltou que "pessoas jurídicas não têm relação com o exercício da cidadania". Ou seja: limitar a participação de empresas não tem nada a ver com desrespeito à liberdade de expressão ou atentado contra a democracia. "Nada impede que pessoas jurídicas se manifestem em espaço público, que se organizem em torno de seus legítimos interesses e que busquem exercer legítima pressão sobre os representantes do povo", defendeu Janot.
Bilhões
Ainda mais interessante do que os argumentos jurídicos são os dados econômicos e análises científicas sobre o financiamento feito pelas empresas.
Para começar, podemos pegar como exemplo o custo para a campanha eleitoral à prefeitura de Curitiba. Será que existe alguma justificativa plausível para que as despesas dos candidatos tenham aumentado 77% em quatro anos? Era realmente necessário elevar os gastos de R$ 17,4 milhões em 2008 para R$ 30,8 milhões em 2012?
O "inflacionamento" eleitoral é observado em todo o Brasil e foi tema da audiência pública realizada em junho no STF. Geraldo Tadeu Monteiro, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), levou dados que mostram que, nas eleições de 2002, foram gastos R$ 798 milhões e, nas eleições de 2012, R$ 4,5 bilhões. Ou seja: um aumento de 471%.
Vantagens
As empresas fazem doações apenas pelo interesse em contribuir com a democracia? Pode até ocorrer, mas o fato é que se torna muito vantajoso colaborar financeiramente com os candidatos.
Um trabalho apresentado em 2011 no Kellogg Institute for International Studies, vinculado à Universidade Notre Dame, nos Estados Unidos, mostrou que as empresas que em 2006 doaram recursos para deputados federais do PT eleitos tiveram um incremento em contratos públicos na proporção de 8,5 vezes o valor doado.
A situação se repete com outros partidos. Na dissertação de mestrado "Contribuições de campanha e contratos estaduais", o pesquisador Eric Akira Fuzitani levantou dados das eleições de 2006 para deputados estaduais em oito estados brasileiros.
O estudo concluiu que é esperado que as empresas doadoras de campanha tenham um retorno de R$ 1 milhão em contratos estaduais durante o mandato dos deputados. Isso se torna muito vantajoso na medida em que a doação média feita pelas empresas girou em torno de R$ 13 mil.
Tendo em mãos esses números, fica difícil defender a manutenção da situação atual.
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