48,7% é o porcentual da Receita Corrente Líquida gasto pelo Paraná com o pagamento de pessoal. O limite é de 49%. Entre os estados do Sul e do Sudeste, é o maior comprometimento, de acordo com os dados mais recentes do Tesouro Nacional: Santa Catarina tem 47,2%; Rio Grande do Sul, 43,4%; São Paulo, 43,3%; Minas Gerais, 41,9%; Espírito Santo, 40,7%; e Rio de Janeiro, 32,1%.

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É tipo um dramalhão familiar: nós, os cidadãos paranaenses, somos as crianças que necessitam de amparo (obras e investimentos em educação, saúde, segurança); o governo do estado representa os pais, responsáveis por nós; a União é uma avó rica que mora distante – nem sempre ela precisa ajudar com dinheiro em cash, mas ela centraliza a maior parte dos recursos e controla a documentação que daria aos filhos maior liberdade financeira. Certamente a matriarca se preocupa com a prole toda, mas faz um controle rigoroso das normas. Porém, algumas vezes parece preferir um filho aos demais – esse ciúme entre irmãos, real ou não, é corriqueiro, e acomete as melhores famílias.

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Em outras palavras, os paranaenses aguardavam ansiosos pelos investimentos do governo estadual nas áreas prioritárias, mas o caixa estadual está meio combalido e depende de empréstimos nacionais e estrangeiros, que só seriam liberados pelo governo federal mediante o cumprimento de determinadas regras. Os deputados estaduais e representantes do Executivo reclamavam que o Paraná estava sendo preterido, e que outros estados com situação financeira pior, como o Rio Grande do Sul, por exemplo, eram beneficiados. Por vezes, a chantagem emocional dá certo, mas o ideal era que o Paraná cumprisse com as obrigações, em vez de fazer birra ou choramingar.

O fato é que os documentos oficiais disponíveis mostram que a situação fiscal paranaense é pior do que a de outros. Se algum estado faz maquiagem de contas, é preciso denunciar, mas por enquanto o que há são os relatórios fiscais quadrimestrais que mostram que o gasto com pessoal no Paraná está acima das demais unidades federativas, e perto de atingir o limite estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Além disso, havia outra complicação que impedia a liberação dos empréstimos: divergência entre os cálculos feitos pelo Paraná e pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que é o órgão que analisa quais governos estão com o nome limpo na praça, como bem explicou o colega André Gonçalves. Segundo a STN, dentro da rubrica "gasto com pessoal", é preciso incluir todas as despesas, como o pagamento a pensionistas e o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) dos servidores ativos e inativos. O Paraná não fazia isso, o que dava a impressão de que o gasto com pessoal estava dentro do permitido pela LRF.

Jeitinho

O ponto é que o governo do Paraná sabe disso há tempos (dois anos e meio), mas tentou dar um jeitinho nas contas. Ainda no comecinho da gestão de Beto Richa, em 28 de fevereiro de 2011, o então secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly, criticou veemente a gestão de Roberto Requião, que foi completada pelo vice Orlando Pessuti nos últimos meses de 2010. Segundo Hauly, eles teriam descumprido a LRF, por não considerar os gastos com pensionistas e IRRF.

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Falso, porque essa regra só foi padronizada pela STN no finzinho de 2010, com validade para o ano seguinte, 2011, primeiro ano da gestão de Beto Richa.

Ou seja: Hauly criticou uma contabilidade que era tolerada anteriormente, mas o governo continuou usan­­do-a quando havia uma norma que a proibia. Houve uma iniciativa para ir arrumando a casa aos poucos, mas o ritmo foi muito lento, e a STN não aceitou: em 2011, um acórdão do Tribunal de Contas permitiu ao governo do Paraná incluir a despesa com pensionistas e IRRF aos pouquinhos, ao longo de oito anos. Em 2012, esse prazo foi estendido para 16 anos. Dezesseis anos? Demais, não?

Agora, finalmente, governo do Paraná e STN entraram em sintonia, e umaparte dos empréstimos foi liberada.

Dilema

Voltando ao cenário descrito no primeiro parágrafo: é certo afirmar que a União foi uma velha maldosa? Ou sua resistência era apenas uma reação ao mau comportamento de seus "filhos", os governos esta­­duais? Qual era o caminho correto? Exigir o cumprimento das normas ou passar a mão na cabeça para não prejudicar as "crianças" – nós, cidadãos? Situação delicada.

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