Apoio uma reforma na Previdência e acho justo que as pessoas se aposentem mais tarde do que hoje é permitido. O problema é que teremos que trabalhar mais para ganhar proporcionalmente menos. Quem quiser aposentadoria integral terá que contribuir com 49 anos ininterruptos à Viúva.
Parece tática de preço de loja popular, 49. Vamos arredondar: trabalhe 50 anos e garanta a aposentadoria integral. Parece razoável prever um prêmio para esse cidadão: quem contribuiu por todo esse tempo, ininterruptamente, merecerá uma celebração, certamente. Imagina, nos meses em que o cidadão ficou desempregado, lembrou de preencher a guia da Previdência Social e pagou direitinho, uau, merece um troféu.
Melhor, merece um documentário, imaginem só. A filmagem só será possível daqui uns 30 anos, mas já tenho o roteiro na cabeça. João, que começou a trabalhar com carteira assinada aos 22, depois que terminou a faculdade, fica na ativa até os 71 para garantir a aposentadoria integral. As imagens serão lindas, o seu João aos 70 anos, chegando ao escritório, para bater o ponto. Não sei que emprego haverá no futuro, mas imagino ele lidando com números, gráficos e projeções, algum trabalho assim, em que seja possível ficar sentado.
(Ou será que João, para cumprir as regras previdenciárias, terá de trabalhar como empacotador em um mercado? Terá de ficar em pé oito horas por dia, cinco dias por semana? Ou, se passar alguma reforma trabalhista ampliando jornada, ele terá de ficar em pé oito horas e meia por dia, seis dias por semana?)
Será que João terá algum emprego aos 70 anos? Dúvidas começam a surgir, mas este é um primeiro esboço do documentário, vamos fazer de conta que sim.
Será uma empresa que constará na lista “melhores lugares para trabalhar”. Imagina só, vai bancar o plano de saúde de João e outros na casa dos 60 anos. Dá uma diferença imensa. Veja só: as empresas geralmente bancam cerca de 80% dos planos, e o trabalhador, o restante. A empresa de João, em vez de ficar com o plano de saúde que custa cerca de R$ 400, destinado às pessoas de 29 a 38 anos, vai contratar diversos planos de R$ 1,4 mil, para os trabalhadores com mais de 59 anos.
(Ideia para outra premiação: empresas que têm empregados de 50 anos ou mais. Merecem reconhecimento público, troféu, entrevista no Fantástico.)
Saindo do trabalho, João pegará o ônibus lotado, um jovem fará a menção de ceder o lugar para João sentar (a câmera sempre acompanhando). “Não se preocupe meu filho, fico em pé, estou no melhor da minha forma, tenho tanta capacidade como você, com seus 20 e poucos, pelo menos é o que o governo diz”, provavelmente ele vai responder assim, de bom-humor, porque certamente estará feliz, chegando aos 71, faltando tão pouco para finalmente se aposentar.
(Música de fundo sobe, câmera foca em João, o trabalhador feliz).
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É fato que a Previdência precisa mudar. Analistas dizem que Michel Temer resolveu mandar uma proposta com “gorduras”, que serão queimadas na negociação no Congresso. Faz parte do teatro de Brasília: os tecnocratas dizendo que a reforma é necessária, mas já sabendo que alguma parte dela não irá prosperar.
Não sei se o tempo de contribuição para aposentadoria integral é uma das “gordurinhas” a serem queimadas. Sei que a proposta apresentada é impraticável em um país como o Brasil de hoje. Os técnicos que a formularam são competentes, certamente, mas parecem viver numa redoma de vidro do funcionalismo em Brasília. Certamente é fácil para um servidor público chegar aos 70 anos trabalhando, com seu cargo garantido. No setor privado, a realidade é outra.
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