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Se a proposta de criar a figura de um "delegado especial" para cuidar de ocorrências envolvendo os magistrados é ridícula, a ideia de uma "polícia especial" para o câmpus da Universidade de São Paulo também não pode ser levada a sério. O presidente do Tri­­bunal de Justiça de São Paulo, José Roberto Bedran, fez a primeira sugestão. A segunda é uma das bandeiras do Diretório Central dos Estudantes da USP. Pelo andar da carruagem, uma parte dos estudantes universitários de agora poderá substituir, com louvor, aqueles desembargadores e parlamentares que só pensam em aumentar suas próprias regalias, sem preocupação com o coletivo.

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É óbvio que truculência policial não pode ocorrer em nenhum lugar, seja em uma universidade, na periferia de Curitiba ou nos morros cariocas. A ação para desocupar a reitoria da USP foi exagerada, mas esse erro não pode justificar outros. Os estudantes estão certos em reivindicar justiça e tratamento digno; mas não tratamento especial. Tudo bem que a USP é uma instituição paulista, e os impostos que eu pago não são gastos lá, mas o assunto merece discussão porque temos de acabar com essa cultura de privilégios que impera no Brasil.

A proposta do DCE da USP de se criar uma polícia universitária com treinamento específico, contratada via concurso, é uma proposta discriminatória. Segue a linha "somos iguais perante a lei, mas eu sou mais igual que os outros". O fato é que todos os policiais que atuam no Brasil precisam de mais capacitação para prestar melhor serviço à comunidade.

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Há um mês, a atriz e cantora Thalma de Freitas foi abordada por dois policiais no Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, sem motivo aparente. Eles fizeram uma revista nela e não encontraram nada, mas resolveram levá-la para a delegacia, para uma revista íntima feita por policiais mulheres. Nada foi encontrado. Observação: ela é negra e estava saindo de uma área pobre. Thalma prestou queixa e os policiais foram temporariamente afastados de suas funções.

A liberdade de expressão, de opinião e de manifestação nas universidades precisa ser defendida com unhas e dentes. Essas instituições foram, no passado recente, o principal ninho de muitos movimentos e líderes que ajudaram a construir a democracia brasileira. Espero que mantenham essa vocação, lutando pelo bem comum. Uma bandeira que receberia apoio irrestrito de toda a sociedade seria a reivindicação por segurança pública efetiva, com policiais com boa remuneração, em grande quantidade e bem treinados. Para atender a todos os brasileiros.

Voltando à questão do "delegado especial" para juízes. A proposta foi feita dias após um desembargador de São Paulo ser detido por estar dirigindo sem carteira e com indícios de embriaguez. Mas, por ser juiz, não foi levado à delegacia, apenas escoltado até sua casa. Este é apenas um exemplo de privilégio a que magistrados têm direito.

É difícil bater o Judiciário em termos de regalias, mas o Con­­gresso chega perto. Os parlamentares contam com uma variada gama de subsídios, que vão desde cotas de telefone fixo, celular, correspondência até o 14.º e 15.º salários para senadores, os quais também contam com plano de saúde vitalício. Fora tudo isso, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), achou que era justo usar um helicóptero do estado do Ma­­ranhão para viagens particulares. Questionado sobre o fato, ele disse que tinha esse "direito" e que isso era uma "homenagem à democracia".

Não acho que os estudantes – "rebeldes sem causa", como disse o cantor Roger, do Ultraje a Rigor, em show em Curitiba no domingo passado – estão no nível de Sarney ou de alguns magistrados (não é uma generalização). Mas temo que, no futuro, as reivindicações universitárias se tornem em regalias corporativas.

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Rondônia

Na Universidade Federal de Rondônia (Unir), os estudantes e professores estão em greve há quase dois meses e a reitoria está ocupada desde o início de outubro. Lá a bronca é bem grave: o câmpus da instituição em Porto Velho está completamente sucateado, não há equipamentos nos laboratórios, nem mesmo papel higiênico ou água potável. A batalha não é por privilégios, apenas pelo básico.