O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), iniciou nos últimos dias uma negociação com o Palácio do Planalto e com lideranças do governo na Câmara para tentar salvar seu mandato. Em troca, ele se comprometeria a não dar o pontapé inicial em um processo de impeachment contra Dilma Rousseff.
Temer refuta assumir Ministério da Justiça e diz que ‘fica vice-presidente’
No momento em que petistas e peemedebistas defendem sua indicação para o Ministério da Justiça, o vice-presidente Michel Temer refutou nesta quarta-feira (14) a pretensão de assumir o cargo.
A alternativa tem sido defendida por deputados federais do PT próximos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que negocia com o Palácio do Planalto um recuo em relação ao encaminhamento ao plenário da Casa Legislativa do pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
O peemedebista culpa o atual ministro, José Eduardo Cardozo, pelo vazamento de detalhes da investigação contra ele pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República. A troca enfrenta resistência da petista.
“Eu vou ficar vice-presidente”, respondeu Temer ao ser peguntado se assumiria a pasta.
Na reforma administrativa, realizada no início do mês, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendia nos bastidores que a presidente trocasse Cardozo e apoiava os nomes do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da OAB (Ordem dos Advogados no Brasil) no Rio de Janeiro, e do ex-ministro Nelson Jobim, peemedebista e advogado que tem atuado na defesa de empreiteiros na Operação Lava Jato.
O vice-presidente defendeu também nesta quarta-feira (14) que seja cumprida decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de suspender o rito estabelecido pelo presidente da Câmara dos Deputados para o andamento de um eventual processo de impeachment da presidente.
PPS pede acesso a dados de contas de Cunha na Suíça
O deputado federal Arnaldo Jordy (PA), vice-líder do PSS na Câmara dos Deputados, protocolou nesta quarta-feira, 14, na Procuradoria-Geral da República (PGR), o pedido para ter acesso às informações sobre as contas na Suíça do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O deputado solicitou a cópia de todos os documentos enviados pelo país europeu à PGR.
De acordo com Jordy, o acesso às informações vai impulsionar as representações contra Cunha na Corregedoria da Câmara e no Conselho de Ética. Nesta terça-feira, 13, deputados de sete partidos como o PT, o PSOL e a Rede protocolaram uma representação contra o peemedebista. Na semana passada, os principais partidos de oposição ao governo, entre eles o PPS, assinaram uma nota pedindo o afastamento do presidente da Câmara. Jordy afirma que Cunha já não pode mais alegar perseguição e nem voltar a dizer que não tem nada a ver com o esquema de lavagem de dinheiro da Petrobras investigado pela Lava Jato.
“Os documentos indispensáveis não só para sustentar a materialidade, bem como para fortalecer o peso da representação. O afastamento é importante não só para que Cunha possa se defender, mas também para que esta Casa não seja contaminada por essas denúncias, que são gravíssimas”, defende o vice-líder do PPS. Para Jordy, as provas em posse da PGR atestam que Cunha mentiu quando declarou que não tinha nenhuma conta no exterior durante um depoimento à CPI da Petrobras.
As conversas de bastidor giram em torno de dois pontos, principalmente, segundo a reportagem apurou. Publicamente, o presidente da Câmara nega.
O primeiro deles é a garantia pelo governo e pelo PT de que não irá prosperar, a ponto de chegar ao plenário da Câmara, o pedido de cassação de Cunha feito pelo PSOL e pela Rede, que começará a tramitar na semana que vem no Conselho de Ética da Casa.
O conselho tem 21 integrantes, sendo 9 do bloco comandado pelo PMDB de Cunha. Somados os 7 do bloco liderado pelo PT, chegaria-se a uma ampla maioria, com 16, mais do que suficiente para barrar a investigação contra o presidente da Câmara.
Cunha tem apelado a aliados e ao governo no sentido de que não seja aprovada a cassação no colegiado. Se isso acontecer, o parecer vai ao plenário da Câmara, em votação aberta, o que deixa a situação fora de controle na visão do parlamentar. Para que haja a cassação, é preciso do apoio de pelo menos 257 dos 512 colegas de Cunha.
O presidente da Câmara é acusado de integrar o esquema de corrupção da Petrobras, com a suspeita de ter recebido dinheiro de propina em contas secretas dele e de familiares na Suíça.
JUSTIÇA
O segundo ponto das conversas entre governistas e Cunha gira em torno da saída do ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), apontado por Cunha como responsável pelos vazamentos de informações sobre as investigações contra ele.
Cunha pede que o vice-presidente Michel Temer, cacique do PMDB, assuma o ministério, mas Dilma ainda resiste. O presidente da Câmara almoça nesta quarta-feira (14) com Temer. O vice foi procurado pelo ministro Jaques Wagner (Casa Civil) para ajudar nas conversas com Cunha.
Nos encontros com governistas, Cunha também sinalizou a dois ministros do Planalto que queria ser absolvido ou pelo menos ter garantias que a Lava Jato “pegue mais leve” com ele, segundo relatos. Os ministros teriam afirmado que, nesse caso, a missão era impossível, que nem petistas foram salvos nessas investigações.
OPOSIÇÃO
Integrantes da oposição dizem que a tentativa de acordo está claramente em curso. Nesta quarta-feira, alguns já demonstram descrença de que Cunha vá autorizar a tramitação de um pedido de impeachment contra a petista.
Na visão deles, o presidente da Câmara tem chance bem maior de salvar o mandato em acordo com o governo do que em acordo com a oposição, com quem estava bem mais alinhado nos últimos meses.
A esperança manifestada por alguns é a de que o PT não entregue o que Cunha estaria exigindo. Nesta terça (13), por exemplo, líderes petistas conseguiram evitar o apoio institucional da bancada do partido ao pedido de cassação de Cunha, mas mesmo assim 32 dos 62 deputados petistas assinaram individualmente o pedido do PSOL e da Rede.
O presidente do PT, Rui Falcão, foi um dos que tentou conter a adesão ao “fora, Cunha”. A ordem da direção do PT era de não adesão ao movimento contra o presidente da Câmara, mesma orientação do ex-presidente Lula.
Apesar disso, a base da bancada não deu ouvidos. A maior irritação da cúpula petista foi direcionada ao ex-ministro de Dilma Pepe Vargas (Relações Institucionais e Direitos Humanos), que é ligado a Dilma.
PÉ ATRÁS
Cunha deverá guardar na manga um arsenal para o caso de não receber o prometido, afirmam oposicionistas que conversaram com ele nos últimos dias.
Pela lei e por liminares dadas pelo Supremo Tribunal Federal nesta terça, o presidente é o responsável por decidir, monocraticamente, se pedidos de impeachment contra presidente prosperam ou são sumariamente arquivados.
Já é dado como certo por oposicionistas e governistas que ele irá arquivar, possivelmente na semana que vem, o pedido formulado pelos advogados Hélio Bicudo (ex-quadro histórico do PT), Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal.
Mas ele irá guardar em sua gaveta, sem decisão, pedidos que considera consistentes política e juridicamente, e que podem receber a qualquer momento a “canetada” favorável. Entre eles um novo pedido que Bicudo, Reale, Paschoal e a oposição irão apresentar na sexta (16) e o dos movimentos de rua.
Ainda segundo integrantes da oposição, um dos grandes temores de Cunha é, sem o mandato e o consequente foro privilegiado, cair nas mãos do juiz Sergio Moro, do Paraná, responsável por aplicar duras condenações na Lava Jato. O peemedebista tem demonstrado preocupação também com implicações em relação à mulher, Cláudia Cruz, e a uma das filhas, cujos nomes aparecem como beneficiárias de contas secretas na Suíça.
Na avaliação dos próprios oposicionistas, caso deflagre um processo de impeachment, Cunha irá enfrentar uma guerra aberta por parte do governo e do PT, que buscará cassá-lo a todo custo. No caso contrário, ele não terá o mesmo problema em relação à oposição.
Apesar de frustrar o desejo de impeachment das siglas contrárias a Dilma, Cunha tem relação pessoal sólida com vários oposicionistas, a quem tem contemplado desde que assumiu a presidência da Câmara, em fevereiro.