“É um número [de políticos barrados pela Lei da Ficha Limpa] esperado por todos nós. A lei vai promover o saneamento nas candidaturas. Mas estamos tratando de um universo pequeno de candidatos.” Ricardo Lewandowski, presidente do TSE, elogiando a Lei da Ficha Limpa, e reconhecendo que o alcance dela é pequeno| Foto: Roosewelt Pinheiro/ABr

Motivos

Confira as principais razões para o número pequeno de políticos barrados pela Ficha Limpa:

1) Lei pouco abrangente: como apenas os condenados em decisão colegiada (normalmente a segunda instância judicial) são proibidos de concorrer, muitas pessoas com problemas na Justiça estão livres para concorrer. A isso se associa a lentidão judiciária, que demora para julgar políticos em segunda instância.

2) Interpretações diferentes dos TREs: juízes eleitorais de todo o país estão interpretando a lei de forma diferenciada.

3) Ação dos partidos: algumas legendas se anteciparam à lei e decidiram não aceitar candidatos com a ficha suja.

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Outros barrados

1,8 mil indeferimentos no Brasil

Em todo o país, o número de candidaturas indeferidas pela Justiça Eleitoral, por diversos motivos (não apenas com base na Ficha Limpa), era de 1.869 até ontem, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No Brasil, há 22.377 candidatos inscritos.

Já no Paraná, 77 registros de candidaturas foram indeferidos (por diversas razões). Ou os candidatos desistiram de concorrer. O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) já julgou, até ontem, 763 das 1.017 candidaturas de todo estado. Foram considerados aptos a disputar as eleições 686 candidatos inscritos.

Entre os indeferidos no estado, três foram baseados na Lei da Ficha Limpa: Carlos Roberto Scarpelini (PP), Alessandro Meneghel (DEM) e Erivan Passos da Silva (PRTB). Scarpelini, ex-prefeito de Apucarana, Norte do estado, tentava uma vaga de deputado federal. Ele foi condenado em uma decisão colegiada em um processo por contratação irregular de um funcionário. Scarpelini desistiu de concorrer.

Já Meneghel, que teve o pedido indeferido pela prática de crime contra a administração pública, recorreu. O primeiro barrado Erivan Passos da Silva, ficou inelegível por já ter sido condenado pela prática de pesca ilegal, considerada crime ambiental.

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Depois de mobilizar o apoio de 3,6 milhões de brasileiros para pres­­­sionar o Congresso a aprovar uma legislação que barrasse a candidatura de políticos condenados pela Justiça, a Lei da Ficha Limpa não teve o resultado esperado. Um levantamento do site Congresso em Foco, especializado na fiscalização do poder público, mostra que 110 "fichas-sujas" foram barrados em todo o país até ontem – menos de 1% dos 22 mil candidatos.

No Paraná o número é ainda menor: só 3 dos 1.017 políticos inscritos para as eleições deste ano haviam sido impedidos de participar do pleito com base na nova lei, que teve uma tramitação relâmpago no Congresso (apenas nove meses) e que entrou em vigor em julho.

O número ainda pode aumentar, pois os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) de todo o Brasil ainda não terminaram de julgar os pedidos de registro de candidatura, apesar de o prazo oficial ter acabado na quinta-feira. No entanto, a estimativa do próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é que o total de barrados não vá muito além de uma centena.

Sociedade desprevenida

A diretora executiva do Movi­­­mento de Combate à Corrupção Eleitoral, Jovita José Rosa, que iniciou a coleta de assinaturas para propor o projeto de lei de iniciativa popular que resultou na Ficha Limpa, diz que muitos TREs estão liberando fichas-sujas. "Estou observando que a lei pegou muita gente desprevenida: candi­­­da­­tos, Justiça e até a sociedade."

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Ela cita que esse foi o caso dos TREs do Maranhão e do Pará. No Maranhão, a Justiça Eleitoral local abonou a candidatura do deputado federal Zequinha Sarney (PV), filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Ele, teoricamente, se enquadrava na lei e teria de ser barrado. No Pará foi o deputado federal Jader Barbalho (PMDB) quem foi liberado, apesar de também estar enquadrado na nova legislação.

Jovita também acredita que a morosidade da Justiça também contribui para o "fraco" desempenho da lei. Como a Ficha Limpa prevê que só podem ser barrados os condenados por um colegiado de juízes (normalmente a segunda instância judicial), pessoas com condenação em primeiro grau estão livres. E a lentidão em dar a sentença final contribui para que fichas-sujas se candidatem. "Acho que a Justiça precisa ser mais ágil na condenação", diz Jovita.

Para o advogado Manoel Caetano Ferreira Filho, professor de Direito da UFPR que foi juiz no TRE-PR, um dos motivos para que a lei não tenha a abrangência que se imaginava é que diferentes interpretações da legislação têm beneficiado os candidatos com condenação na Justiça.

O TSE, por exemplo, orientou os juízes a impedirem a candidatura de políticos que tenham sido condenados antes mesmo da vigência da lei. Mas nem todos os magistrados estão seguindo a orientação, por entenderem que uma lei não pode ter efeitos retroativos.

O advogado da União Mar­­­cus Bittencourt, professor da UniCuritiba, lembra ainda que a lei deixou brechas, o que faz com que a interpretação da legislação pelos juízes seja mais difícil. Como a lei é nova e ainda não há um entendimento consolidado sobre a interpretação da lei no Supremo Tribunal Federal (STF), ao menos por enquanto cada candidatura tem de ser analisada em particular pelo juiz eleitoral responsável. "No fundo, é o próprio eleitor quem tem que fazer análise do seu candidato para saber com antecedência se ele é merecedor do seu voto ou não", diz Bittencourt.

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Aspectos positivos

Apesar do pouco efeito real da Ficha Limpa, os especialistas revelam que muitos aspectos positivos na lei. Para Bittencourt, a própria existência da legislação é um avanço. Jovita José Rosa diz acreditar que, apesar das dificuldades, a Lei da Ficha Limpa gerou debate sobre o tema. "Hoje há consciência política muito maior do que havia há dois anos."

O presidente do TSE, Ricardo Le­­­wandowski, concordou ontem que o número de políticos barrados pela lei é pequeno diante do total de candidaturas. Mas ele lembrou que a legislação fez com que os partidos se tornassem um filtro dos candidatos condenados (leia mais na reportagem ao lado).

Opinião diferente tem Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, que fiscaliza o poder público. Ele afirma que já esperava que poucas candidaturas fossem barradas. Para Abramo, os partidos não se preocuraram com o passado dos candidatos. "Política não se resolve por leis. Não é uma questão legal. O problema está nos partidos, que estão se omitindo."

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Interatividade

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