A ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), comemorou nas últimas semanas o aumento da participação das mulheres nas eleições.
"Pela primeira vez, ultrapassamos o mínimo exigido por lei de candidatas mulheres. A lei prevê 30%, e temos 31%", afirmou em entrevista à "Veja".
Na prática, porém, a situação pode ser diferente da análise feita pela magistrada.Em São Paulo, levantamento feito pela Folha nos dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) aponta que a maioria das coligações não cumpre hoje a cota.
A três dias dos eleitores irem às urnas, 13 das 21 chapas do Estado não tinham a reserva mínima de mulheres candidatas à Assembleia Legislativa. Para a Câmara, mais da metade das chapas paulistas -11 das 20- também não cumpria a regra.
Segundo a legislação, os partidos ou coligações devem respeitar o mínimo de 30% de candidatos de cada gênero sob pena de terem todas as candidaturas barradas.
A análise do cumprimento da lei, porém, é feita pela Justiça a partir da lista inicial de candidatos enviada pelas chapas. Ou seja, antes da verificação individual das candidaturas, procedimento que determina se os nomes estão aptos ou não para concorrer.
O TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo informou que todos os partidos e coligações passaram por essa análise e cumpriram a cota.
O levantamento da Folha de S.Paulo apontou, no entanto, que após essa verificação diversas candidatas foram barradas ou desistiram de concorrer, o que acabou desequilibrando a proporção prevista na legislação.
De 276 candidatos a deputado estadual e federal que foram barrados e não recorreram, a maioria era mulher -60% do total.
"A lei não vincula a análise a registros deferidos, mas registros que foram pedidos", afirma a procuradora e professora da FGV-Rio Silvana Batini, que atuou no Ministério Público Eleitoral do Rio nas últimas eleições.
Para ela, isso pode fazer com que os partidos inflem a lista inicial artificialmente.
"Em 2010, vários partidos entravam com pedidos de registro simplesmente para cumprir a cota, mas eram pedidos completamente inviáveis e sem documentação. Cumpria-se a reserva, mas os pedidos eram indeferidos depois", disse.
Renúncia
A renúncia no meio da campanha é outra situação que altera a divisão por sexo. O PROS (Partido Republicano da Ordem Social), por exemplo, cumpriu a cota de mulheres na lista inicial de candidatos para a Assembleia paulista, mas depois o índice caiu para 15%.
Isso ocorreu porque sete mulheres desistiram da disputa eleitoral após a Justiça analisar o cumprimento da reserva de vagas.
Segundo André Carvalho Ramos, procurador eleitoral de São Paulo, nas eleições de 2012 o Ministério Público Eleitoral tentou barrar partidos que não respeitaram a cota devido às renúncias. O pedido, no entanto, não foi aceito pela Justiça.
Ele defende que a lei seja aprimorada, uma vez que, na prática, o eleitor acaba não tendo à sua disposição a porcentagem determinada de mulheres.
"Isso mostra que é necessário rever o momento final de análise da cota. É uma das medidas que podem ser adotadas nas eleições futuras. A cota em si é uma excelente medida, mas ela tem que ser implementada a contento", afirma.
Obrigatória desde 2010, a cota não foi suficiente para aumentar a participação feminina no Parlamento. Segundo o TSE, dos 513 deputados eleitos para a Câmara naquele ano, apenas 45 eram mulheres (9% do total).
"Uma lei que estabelece uma cota não vai dar conta disso sozinha", afirma Batini."É engraçado que discutimos isso hoje, quando temos uma presidente mulher, três candidatas à Presidência da República e duas com muita chance de ganhar. Mas ao mesmo tempo, nesta eleição, temos o absurdo de casos da mulher do ficha suja vir como step dele."
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