Uma das premissas da democracia é a de que os governantes são os representantes da sociedade e que respondem a ela pelos seus atos. O cidadão, além de escolhê-los pelo voto, tem o direito de cobrá-los pelo que fazem ou deixam de fazer. Nos últimos dias, um servidor público de São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, exerceu esse direito e enviou e-mails a cada um dos 54 deputados estaduais cobrando deles um posicionamento sobre as denúncias feitas pela Gazeta do Povo e pela RPC TV na série de reportagens "Diários Secretos". No entanto, apenas quatro parlamentares responderam ao contato de Acir Cardozo, de 40 anos.
Cardozo perguntou nas mensagens eletrônicas se os deputados iriam se omitir diante das denúncias contra a Casa. Ele obteve respostas apenas dos peemedebistas Eduardo Cheida e Alexandre Curi, do pedetista Neivo Beraldin e do tucano Mauro Moraes. "O único que falou algo que não pareceu uma mensagem padrão foi o [Eduardo] Cheida, que afirmou ele ou um assessor que deu entrevistas para vários veículos e que não está na política para fazer negócios", afirmou.
Segundo o servidor, a mensagem de Neivo Beraldin dizia para ele "não generalizar" na avaliação dos deputados e pedia para que acompanhasse a TV Sinal, canal próprio da Assembleia Legislativa. "Mas logo depois descobriram que ele tinha um assessor morto nomeado no gabinete", disse Cardozo, em referência a Dirceu Pavoni, que faleceu em 12 de junho de 2003, mas foi mantido no quadro de servidores até outubro de 2006, como comissionado no gabinete de Beraldin. Questionada sobre o assunto, a Assembleia admitiu que contratou uma pessoa morta para "trabalhar" na Casa e depositou R$ 21,4 mil na conta da viúva de Pavoni, Maria Bernadete Affornali Pavoni vice-prefeita de Almirante Tamandaré, na Grande Curitiba.
Cardozo contou ainda que alguns deputados estavam com a caixa de mensagens lotada, mas a maioria absoluta não respondeu aos e-mails. Preocupado com o silêncio da quase totalidade dos parlamentares, o servidor criticou: "a palavra-chave é conivência. Nós não podemos ver todos os canais e ler todos os jornais, mas podemos ver a omissão. E omissão é conivência. Eu vi o convite ao Ministério Público feito pelo Nelson Justus [presidente da Assembleia], para fazer investigações em conjunto. Dei graças a Deus que o promotor [Fuad Faraj] refutou, dizendo que não faz investigação com quem deve ser investigado". "Estranha-me, como disse o ex-ministro da Fazenda Karlos Rischbieter [em entrevista à Gazeta do Povo], que as associações de classe, exceto a OAB e a classe estudantil, não estejam se manifestando a respeito disso, que é apenas a ponta do iceberg", declarou.
Anos de ativismo
Acir Cardozo garante acompanhar o trabalho dos políticos desde antes da popularização da internet, que ocorreu próximo à virada do século. "Quando não tinha e-mail, mandava carta. Eu sou responsável e não xingo, apenas cobro. Quando acho que ele está errado, eu cobro", revelou.
O servidor público contou ainda que na época dos caras pintadas, em 1992, só não saiu às ruas para pedir o impeachment de ex-presidente da República Fernando Collor porque tinha um problema de saúde na família. "Mas soltei foguetes quando saiu o voto que cassou o Collor", revelou. "Eu não me arrependo de nada que fiz como cidadão dentro da política."
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