Ao homologar as colaborações premiadas dos 77 executivos da Odebrecht, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, “protegeu” a Operação Lava Jato e garantiu que as investigações referentes à empreiteira não vão atrasar por causa da morte do ministro Teori Zavascki. Nesse sentido, Cármen Lúcia foi até mais rápida que Teori: ele esperava concluir essa etapa do trabalho em fevereiro.
A homologação também frustrou as expectativas de políticos que esperavam ganhar tempo diante da “delação do fim do mundo”. Além disso, o governo Temer ficou na posição de credor de Cármen Lúcia. Ela decretou o sigilo dos depoimentos, que têm potencial para reacender a crise política quando se tornarem públicos.
Próximos passos
O próximo passo de Cármen Lúcia deve ser a definição de quem vai substituir Teori na relatoria da Lava Jato no STF. Isso deve ocorrer ainda nesta semana.
O novo responsável pela operação no Supremo, seja quem for, em tese terá um peso a menos nas costas por causa da decisão de Cármen Lúcia. Se o novo relator viesse a atrasar a homologação das delações, iria ser cobrado publicamente.
Apesar disso, a agilidade com que a presidente da Corte imprimiu ao caso vai colocá-lo diante da inevitável comparação caso seja lento demais na condução da investigação da Odebrecht. Fechada a etapa da homologação, ao relator caberá autorizar as diligências solicitadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que passa a investigar o conteúdo dos depoimentos.
Além das investigações referentes à Odebrecht, o novo relator também será responsável por todas os demais inquéritos e processos da Lava Jato que estão no STF. Nesses casos, a tendência é que haja atrasos, pois o substituto terá de tomar ciência de tudo o que já havia sido feito até agora por Teori.
Efeitos políticos
Embora o presidente Michel Temer tenha dito nesta segunda-feira (30) que Cármen Lúcia fez o certo ao homologar as delações, nos bastidores a torcida do Planalto e do Congresso era para que a ministra não tivesse tomado essa decisão. Ministro da Casa Civil e um dos homens de confiança de Temer, Eliseu Padilha havia demonstrado sua expectativa apenas um dia após o acidente que matou o magistrado: “A morte [de Teori], por certo, vai fazer com que a gente tenha, em relação à Lava Jato, um pouco mais de tempo agora para que as chamadas delações sejam homologadas ou não”.
As delações da Odebrecht citam dezenas de políticos – incluindo o próprio Temer, ministros e aliados importantes no Congresso. O potencial de estrago no governo é imenso num momento em que Temer quer aprovar reformas no Parlamento.
Ao menos nesse ponto, Cármen Lúcia virou credora do Planalto. Ela manteve o sigilo dos depoimentos dos 77 executivos. Com isso, garantiu alguma tranquilidade política a Temer. “O governo precisa aprovar a reforma da Previdência e uma série de medidas. A paralisia decisória viria com a publicidade total dos depoimentos”, avalia o cientista político Mário Sérgio Lepre, professor da PUCPR.
Ainda assim, o governo Temer vai viver com a constante ameaça de vazamentos seletivos das delações. E há ainda a possibilidade de o novo relator da Lava Jato decidir por tornar público o conteúdo das delações. Antes da morte de Teori, a PGR já havia anunciado que iria pedir a ele para suspender o sigilo dos depoimentos assim que ocorresse a homologação das delações.
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