| Foto: Evaristo Sa/AFP

A opção do senador Renan Calheiros de não aceitar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que o afasta da presidência do Senado gera debate sobre a real validade da decisão monocrática do ministro Marco Aurélio Mello e sobre as consequências que o senador pode enfrentar por adotar essa postura. Ainda que Marco Aurélio tenha errado, poderia Renan não cumprir a decisão? E quais as consequências se ele está desobedecendo à decisão judicial?

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A decisão do ministro do STF foi liminar e ainda precisa ser confirmada pelo plenário. Senadores da mesa diretora assinaram um documento em que afirmam que vão aguardar a decisão do plenário do Supremo.

Para o chefe do Departamento de Direito de Estado da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Egon Bockmann Moreira, o Senado até pode esperar a decisão do STF, mas, por enquanto, tem que cumprir a ordem judicial. Ele explica que, enquanto não for definida a questão, Renan não pode praticar nenhum ato como presidente.

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Se o presidente do Senado insistir em descumprir a decisão, o STF pode notificá-lo sobre a desobediência. Se ele mantiver a postura após a notificação, pode responder por desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito, crime previsto no artigo 359 do Código Penal. A pena prevista é de detenção de três meses a um ano e multa.

O oficial de Justiça que deveria notificar Renan tentou entregar a ordem judicial na segunda-feira (5) à noite e na terça-feira (6) pela manhã – quando esperou por quase seis horas. Moreira ressalta que é público e notório que Renan já sabe sobre a decisão de Marco Aurélio, pois até já se pronunciou sobre o assunto.

“Ele está se colocando em uma posição acima do STF, que ele não tem. A mesma norma que lhe outorga a condição de senador é a que dá a condição de ser afastado. Ele está maculando a própria Constituição”, diz o professor da UPFR.

“Decisão judicial se cumpre e se recorre”, diz um advogado de Brasília que prefere não se identificar. Ele considera que já houve uma ciência formal da decisão, pois o senador até recorreu da decisão.

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Competência

O advogado Taiguara Fernandes considera que um presidente de Poder não pode ser afastado por decisão monocrática, principalmente com base em um entendimento que ainda não foi definido pelo plenário do Supremo. O julgamento do processo em que os ministros decidiriam se um réu pode substituir o presidente da República foi interrompido após o pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Até então, seis ministros haviam decidido que um réu não pode substituir o presidente da República, mas eles podem modificar seus votos quando o julgamento for retomado.

Na opinião de Fernandes, Marco Aurélio foi além da sua competência como ministro e legislou. “Por lógica jurídica, todo Poder, para ser Poder, deve ter o poder de se preservar. Se um outro Poder invade a seara do primeiro e diz como ele tem de agir, já suprimiu o primeiro Poder. Ao determinar o afastamento do presidente do Legislativo aplicando tese própria, foi isso que o Ministro do STF fez.”

O advogado cita o artigo 49, inciso XI, da Constituição federal, que diz que compete exclusivamente ao Congresso Nacional “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.

Bockmann Moreira avalia que Marco Aurélio se exacerbou. Ele poderia ter definido que, em caso de necessidade de substituição do presidente da República, um réu não poderia assumir, sem precisar afastar Renan. “Ele podia ter dado liminar proibindo Renan de ser presidente da República”, explica o jurista, lembrando que o que estava em questão era o direito a substituir o presidente da República e não o direito de ser presidente do Senado.

Por outro lado, o professor da UFPR observa que um erro não dá o direito de cometer o outro. “Marco Aurélio deu uma ordem desproporcional. O ato do Renan de não cumpri-la pela própria vontade é bem mais grave.”

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O advogado brasiliense que prefere não se identificar sintetiza o impacto social da questão: “Isso nunca acontece em países sérios. Não é necessário ir à Justiça retirar um réu da chefia de um dos Poderes. Ele simplesmente tem o dever moral da sair”.