De forma recorrente, milhares de ações têm sido distribuídas perante os Juizados Especiais Cíveis e perante a Justiça Comum discutindo a questão da validade da cláusula contratual que transfere para o consumidor a obrigação de pagar a taxa de corretagem de imóveis adquiridos na planta.
Quem propõe a ação alega violação ao Código de Defesa do Consumidor pelo não cumprimento do dever de informar, que tal cobrança implicaria num ônus excessivo para o consumidor e que neste caso estaria configurada a existência de venda casada.
O que ocorre na prática é que de regra as imobiliárias através de seus corretores devidamente habilitados ficam nos estandes de vendas do empreendimento, visando justamente facilitar o atendimento dos potenciais compradores. Os corretores não possuem nenhum vínculo com a incorporadora. Eles aproximam as partes (vendedor e comprador) e prestam aos interessados todas as informações (detalhes do imóvel e da sua documentação, prazo de entrega da unidade, entre outros). Intermediam o próprio negócio em si e muitas vezes diante de propostas e contrapropostas trocadas entre as partes, buscam favorecer o comprador a fim de que se concretize a venda e eles possam receber a comissão referente à corretagem.
Muitas das vezes são firmados instrumentos específicos entre o corretor e o comprador atribuindo a este responsabilidade pelo pagamento da comissão. Outras vezes, no próprio compromisso de compra e venda é feito o destaque do valor que será destinado à comissão de corretagem e em ambas as situações, no ato em que é realizado o pagamento, os corretores emitem o respectivo recibo deste valor, que é entregue ao comprador do imóvel.
Considerando essa dinâmica, diante das ações propostas perante o Poder Judiciário, verifica-se que nenhuma violação há às regras descritas no Código de Defesa do Consumidor. O dever de informar é cumprido, pois o comprador tem plena ciência que a taxa de corretagem lhe será imputada.
Por sua vez, o Código Civil prevê a possibilidade de que comprador e vendedor ajustem a forma e a quem competirá o pagamento da taxa de corretagem. Assim, se a lei não é veda, ao contrário, expressamente permite a convenção entre as partes, verifica-se que é totalmente lícita a transferência de tal encargo ao comprador.
Nesta operação, constata-se também que o consumidor não é indevidamente onerado. Todos os custos, a exemplo da taxa de corretagem, compõem o preço do imóvel e ele pagará por este o mesmo valor do anúncio ou dependendo da negociação realizada, até menos. Não há prejuízo, pois ao comprador não é imposto nenhum ônus e a venda também não é casada. Como já dito, por ser um custo, a única diferença está na forma do pagamento. Ao invés de ser realizado à incorporadora para que esta por sua vez repasse ao corretor, o que ocorre com todos os demais insumos e serviços que envolvem o empreendimento, este especificamente é realizado de forma direta (o comprador paga o corretor).
Atualmente a questão não se encontra pacificada nos Tribunais e reconhecendo a sua relevância, em recentes decisões, proferidas pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o Superior Tribunal de Justiça admitiu dois recursos.
No REsp. 1.551.956/SP se analisará a legitimidade passiva da incorporadora (promitente vendedora) para responder pela restituição da comissão de corretagem. Muitas das ações são propostas em face da incorporadora apesar de o valor ter sido pago diretamente à imobiliária e aos corretores.
No REsp. 1.551.951/SP será tratado do prazo prescricional para a propositura da ação. Como a parte pede o ressarcimento de valores pagos, o prazo para pleitear o ressarcimento deve ser de três anos, conforme disposto no Código Civil. O próprio mérito da questão, qual seja, a validade da cláusula que transfere ao consumidor a obrigação de pagar a comissão de corretagem, também será enfrentada.
Até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça estão suspensos todos os recursos que atualmente se encontram em trâmite perante os Tribunais Estaduais e as Turmas Recursais dos Juizados Especiais de todo o Brasil, a exemplo do que já está ocorrendo no Paraná. Órgãos de classe ou entidades poderão intervir nos recursos e após a manifestação do Ministério Público, com a entrega do relatório de cada um dos processos aos demais Ministros, eles serão incluídos em pauta para julgamento.
Visando evitar posicionamentos divergentes entre os tribunais do país, que ora entendem pela licitude da cobrança (como por exemplo, a Turma Recursal do Juizado Especial de São Paulo) ou pela sua ilicitude (posicionamento atualmente adotado pela Turma Recursal do Juizado Especial do Paraná), dentro da sua competência, o Superior Tribunal de Justiça uniformizará o entendimento. Quando tal decisão ocorrer, ele passará a nortear a solução de todas as demais causas que tenham por objeto esse assunto.
O enfrentamento da matéria pela Corte Superiora vem em boa hora. O Brasil é uma unidade federativa e é difícil para aquele que busca o Poder Judiciário compreender o fato de que sobre uma mesma lei existem duas interpretações distintas e neste exato momento, o que nos resta é aguardar.
Julgamento do Marco Civil da Internet e PL da IA colocam inovação em tecnologia em risco
Militares acusados de suposto golpe se movem no STF para tentar escapar de Moraes e da PF
Uma inelegibilidade bastante desproporcional
Quando a nostalgia vence a lacração: a volta do “pele-vermelha” à liga do futebol americano