As expectativas indicam que, ao fim de 2016, a economia terá encolhido quase 8% em dois anos. A última vez que se viu algo parecido foi no biênio 1930-31, em meio à Grande Depressão, quando a geração de riquezas diminuiu pouco mais de 5%.
Ironicamente, a maior recessão da história brasileira, um dos legados do governo de Dilma Rousseff (PT), nasceu de sua obsessão pelo crescimento a qualquer custo. Os frutos do modelo dilmista ficaram evidentes para a população quando o desemprego passou a subir, meses depois da reeleição. Mas as sementes foram plantadas muito antes.
INFOGRÁFICO: Veja os principais indicadores ao longo do governo Dilma
Sucessora de um presidente que alardeava que o Brasil foi o último país a entrar e o primeiro a sair da crise internacional, Dilma assumiu o Planalto em 2011, herdando um crescimento econômico de 7,53% no ano anterior. Embora no discurso triunfalista a crise tivesse ficado para trás, a presidente não resistiu à tentação de manter o pé no acelerador. Aprofundou políticas de Luiz Inácio Lula da Silva e adotou outras, num experimento batizado de “nova matriz econômica”.
- ‘Pátria educadora’ de Dilma ficou apenas na boa intenção
- Bolsa Família avançou com Dilma, mas não é o suficiente para combater a miséria
- Promessa, PAC Mobilidade de Dilma empacou
- O estilo Dilma de governar a afundou politicamente
- Má gestão levou o Brasil da esperança à frustração na Copa do Mundo
- Dilma levou médicos ao interior, mas solução não agradou 100%
Nesse modelo, medidas anticíclicas adotadas no fim do governo Lula, que tinham por objetivo combater a recessão, tornaram-se permanentes. E, portanto, pró-cíclicas: ainda que a economia tenha crescido quase 4% no primeiro ano do governo Dilma, o governo continuou elevando gastos e abrindo mão de arrecadação.
Queda forçada dos juros alimentou a inflação
O tripé formado por metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante, seguido praticamente à risca por Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, foi substituído por intervenções mais acentuadas na taxa de juros e nos preços administrados; por reforços na proteção à indústria nacional, em especial a automotiva; e pela ampliação das desonerações tributárias e do crédito subsidiado a empresas.
Efeitos colaterais
Os primeiros efeitos colaterais da nova matriz apareceram nas contas públicas. Com um Orçamento engessado por vinculações e indexações, várias delas criadas nas administrações petistas, um governo tão mão aberta dependeria de crescimento econômico alto e ininterrupto para conseguir pagar suas contas. Não foi o que aconteceu.
Controle de preços tirou dinheiro do Tesouro e de estatais
A quebradeira de países da zona do euro e o fim do superciclo das commodities se somaram à desaceleração natural da economia brasileira – que, sem reformas para elevar a produtividade, passou a dar sinais de cansaço após anos de crescimento anabolizado por consumo e endividamento.
O PIB desacelerou, e o governo percebeu que não conseguiria cumprir suas metas fiscais. Primeiro, recorreu a malabarismos contábeis. Depois, adiou sistematicamente pagamentos bilionários devidos a bancos públicos, prática que ficou conhecida como “pedalada fiscal” e serviu de pretexto ao impeachment.
Mas nem as pedaladas foram capazes de camuflar a trajetória ascendente da dívida pública. Quando Dilma assumiu, o débito de todo o setor público equivalia a 52% do PIB; hoje, passa de 67%. O resultado anual das contas públicas também espanta. Hoje, no acumulado de 12 meses, as despesas superam as receitas em R$ 580 bilhões, um déficit equivalente a quase 10% do PIB.
Sacrifício adiado
Em um discurso em março do ano passado, ao defender o ajuste fiscal proposto pelo então ministro da Fazenda Joaquim Levy, Dilma admitiu ter esgotado todos os recursos para combater a crise “que começou lá em 2009”.
Agrado a empresários arruinou contas públicas
“Trouxemos para as contas públicas e o Orçamento da União os problemas que, de outra forma, recairiam sobre a sociedade e os trabalhadores”, disse a presidente, afirmando que, com essa escolha, livrou o país de um “elevadíssimo desemprego” e uma “redução violenta na taxa de crescimento”. O tempo logo provou que o dilmismo econômico não evitou nada disso. Apenas adiou o sacrifício.
Queda forçada de juros alimentou a inflação
- Fernando Jasper
Quem deu o primeiro passo ousado da nova matriz econômica foi o Banco Central, sob o comando de Alexandre Tombini. Argumentando que a crise internacional tinha “viés desinflacionário”, o BC começou a reduzir a taxa básica de juros em agosto de 2011, com a inflação em mais de 7% ao ano, acima do teto da meta (6,5%).
E, de fato, o IPCA recuou na sequência, chegando em meados de 2012 ao menor nível no governo Dilma: 4,92% ao ano, ainda acima do centro da meta (4,5%). Os juros baixariam até 7,25% ao ano no fim de 2012, o menor nível da história. Em paralelo, a presidente obrigou os bancos públicos a baixar ainda mais o custo final dos empréstimos.
Mas o dragão estava apenas adormecido. No fim de 2015, a inflação chegaria a 10,67%, maior taxa desde 2002. E o próprio BC admitiria – discretamente, num relatório trimestral de inflação – que boa parte da pressão inflacionária dos últimos anos resultou daquela redução da taxa de juros.
Controle de preços tirou dinheiro do Tesouro e de estatais
“Eu não negocio com inflação”, disse Dilma Rousseff (PT) na primeira entrevista que concedeu como presidente a um jornal brasileiro, em março de 2011. Na conversa com uma jornalista do Valor Econômico, ela repetiu oito vezes versões dessa expressão. Como o Banco Central relaxou os juros com a inflação acima do teto, a solução para segurar o IPCA foi controlar na marra preços monitorados.
Embora o petróleo estivesse subindo lá fora, a Petrobras congelou os preços da gasolina na refinaria. E o governo zerou a Cide, tributo cobrado sobre o combustível. Resultado: a arrecadação caiu e a Petrobras perdeu dezenas de bilhões de reais.
No setor elétrico, o governo decidiu que a tarifa cairia 20% com a renovação de concessões. Como nem todas as empresas aderiram, o Tesouro abriu o cofre para inteirar a fatura. E a Eletrobras, obrigada a participar do pacote, acumulou prejuízos de mais de R$ 30 bilhões nos últimos quatro anos.
Agrado a empresários arruinou contas públicas
Antes de batalhar pelo impeachment, muitas entidades empresariais reivindicaram e aplaudiram medidas do governo que supostamente dariam impulso ao investimento e ao PIB, mas acabaram por arruinar as contas públicas e a própria economia.
O pacote de renovação de concessões que derrubou as tarifas de energia, por exemplo, foi defendido em propagandas na tevê por Paulo Skaf, presidente da Fiesp. No fim, o Tesouro destinou bilhões de reais não só para garantir a queda de 20% prometida por Dilma, mas também para indenizar concessionárias que aderiram ao plano.
Os diversos benefícios fiscais lançados por Dilma, de reembolso de impostos a exportadores à desoneração da folha de pagamentos, também custaram caro ao contribuinte. Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), os benefícios tributários e subsídios, que consumiam 4% do PIB ao fim do governo Lula, chegaram a 6,5% do PIB – o equivalente a 13 Bolsas Família – em 2015.
Esquerda tenta mudar regra eleitoral para impedir maioria conservadora no Senado após 2026
Sob pressão do mercado e enfraquecido no governo, Haddad atravessa seu pior momento
Síria: o que esperar depois da queda da ditadura de Assad
Vácuo de poder deixa Síria entre risco de Estado terrorista e remota expectativa de democracia
Deixe sua opinião