“Se o presidente [Lula] puder falar que ‘A cerveja Itaipava, por ser 100% brasileira, é sua cerveja preferida’ e, como falou na palestra de Atibaia, ‘Não bebo muita cerveja, mas quando bebo é Itaipava’, seria ideal para nos dar força na chegada da marca na Bahia.” A frase acima foi enviada pelo dono da Cervejaria Petrópolis, Walter Faria, no dia 13 de novembro de 2013, para Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula.
Em e-mail intitulado, “Discurso do presidente”, o empresário repassa informações a Okamoto sobre o tema a ser abordado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em palestra que ele faria na inauguração de uma fábrica de cervejas do grupo, em Alagoinhas, na Bahia, no dia 22 de novembro de 2013.
A correspondência eletrônica foi apreendida pela Operação Lava Jato e registra “frases de propaganda a serem faladas” por Lula, no evento, a pedido do contratante da palestra, segundo interpreta a Polícia Federal, no laudo n.º 1.233/2016.
Palestra paga
A presença de Lula na inauguração da fábrica foi paga como palestra para a LILS Palestras e Eventos, empresa que o ex-presidente abriu em 2011, após deixar o governo. Valor da palestra: R$ 449 mil.
A Polícia Federal e o Ministério Público Federal, em Curitiba, investigam se as palestras feitas por Lula ocultaram propinas de empresas que eram beneficiadas por ele, em negócios com o governo, especialmente na Petrobras. Entre 2011 e 2016, a LILS recebeu R$ 28 milhões, revelou quebra de sigilo da empresa. Quase metade disso, pago por empreiteiras acusadas de corrupção – quatro delas com delação premiada, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC e Odebrecht.
A Petrópolis, um dos novos focos da Lava Jato para 2017, pagou R$ 1,5 milhão para a empresa do ex-presidente, por três palestras. Os eventos eram inaugurações de fábricas da cervejaria. O grupo integra o grupo de maiores fontes de recursos da empresa de palestras de Lula.
Garoto-propaganda
“Eu vim nessa inauguração, meu caro Walter [Faria, dono do grupo Petrópolis], não é porque apenas eu sou um bom bebedor de cerveja”, disse Lula na inauguração da fábrica na Bahia. “Eu não vim aqui apenas para conhecer a Hortência [ex-jogadora de basquete], para conhecer o Cigano [lutador de MMA], para me encontrar com o Jaques Wagner. Eu vim aqui porque eu não consigo entender a cabeça de algumas pessoas que às vezes costumam não acreditar no Brasil. Eu vim aqui, Walter, porque não é possível que algumas pessoas neste país continuem com complexo de vira-lata, acreditando que tudo que vem de fora melhor do que o daqui.”
Estavam presentes no evento o então governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), ex-ministro do governo Dilma Rousseff e homem de confiança de Lula, o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, o dono do Grupo Petrópolis e os empresários Emílio Odebrecht e Marcelo Odebrecht – todos alvos de investigação da Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro. Além de celebridades como Hortência e o lutador Cigano.
“Eu duvido que a gente tome no mundo uma cerveja melhor que a Itaipava”, disse Lula. “A melhor cerveja que o povo nordestino vai beber. Cerveja de qualidade.”
Na apresentação, Lula enalteceu a geração de empregos no Nordeste por empresas nacionais, falou das conquistas de seu governo, em especial para os pobres, e propagandeou a Cerveja Itaipava, como solicitado pelo dono da cervejaria, sem seguir à risca o script proposto.
“Quando eu era presidente da República eu incomodava muita gente porque eu ia em qualquer inauguração de empresa. O Gabrielli sabe quantas vezes eu fui à Petrobras. O Wagner sabe quantas vezes eu vim na Bahia. Se tivesse a inauguração de uma fábrica que fazia operação plástica no rabo de um calango, eu lá estaria para prestigiar.”
Conexão Odebrecht
Nova delatora da Lava Jato, a Odebrecht participou das obras da cervejaria da Petrópolis, na Bahia, e cedeu seu jato para o transporte do ex-presidente para o evento.
A nova frente de investigação sobre os pagamentos do Grupo Petrópolis a Lula tem relação com a delação premiada da Odebrecht, entregue neste mês pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), para homologação – o que deve acontecer no início de 2017.
Investigação
Lula é réu em dois processos penais abertos pelo juiz federal Sergio Moro, este ano: o de julho, sobre o tríplex do Guarujá (SP), e o deste mês sobre a sede do Instituto Lula e um apartamento em que o petista mora em São Bernardo do Campo. Nos dois casos, o ex-presidente é acusado de supostos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas da OAS e da Odebrecht.
O laudo com dados de pagamentos da Petrópolis e troca de e-mails dos executivos do grupo com pessoas ligadas a Lula foram anexados no último mês ao inquérito policial que também apura crimes de corrupção e lavagem de dinheiro nos recebimentos da LILS e do Instituto Lula.
As investigações devem embasar nova denúncia criminal da força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, contra o ex-presidente - que já é réu em cinco processos criminais.
Pagamentos
O laudo 1.233/2016 registra os pagamentos feitos pelo Grupo Petrópolis e lista uma série de e-mails em que foi acertada a participação no evento da Bahia, em novembro de 2013. Além de Walter Faria e Okamoto, Fábio Luis Lula da Silva, o Lulinha, e seu sócio Fernando Bittar - o dono oficial do sítio de Atibaia, que a Lava Jato afirma ser do petista – são copiados nas mensagens.
Numa das mensagens anexadas ao laudo da PF, os organizadores do evento combinam que o deslocamento de Lula até a Bahia seria feito em um jato que pertence a Odebrecht e acertam que Emílio Odebrecht e seu filho, Marcelo Odebrecht, estaria também no voo. A empreiteira foi responsável pela construção da fábrica da cervejaria na Bahia.
Em outro e-mail, Paulo Cangussu, funcionário do Instituto Lula, confirma para o executivo do Grupo Petrópolis que recebeu “uma confirmação” que poderiam ser colocados no voo “os Odebrechts” e indica a lista de alimentos e bebidas que deveriam ser disponibilizados na “sala VIP” de espera em que o petista ficaria. “Whisky Blue Label de preferência, ou Black Label” integra a lista de pedidos.
Delação
A Petrópolis entra na mira da Lava Jato em 2017, com a delação premiada da Odebrecht. A força-tarefa havia identificado os elos da cervejaria com as contas secretas no banco Meinl Bank Antígua, que teve parte dele comprado por pessoas ligadas à empreiteira, em 2010, para operar as contas do Setor de Operações Estruturas - o “departamento da propina” - no exterior.
Na delação, os delatores vão contar como utilizaram empresas dos donos da Itaipava para distribuir dinheiro a políticos por meio de doações eleitorais e entregas de dinheiro vivo. Um dos pontos são os depósitos de cerca de R$ 100 milhões pela Odebrecht em uma conta operada pelo contador do Grupo Petrópolis no Antígua Overseas Bank (AOB) – banco que antecedeu o Meinl Bank.
A delação cita a relação das obras do grupo no Brasil. A Odebrecht construiu a unidade da cervejaria na Bahia. Os delatores Marcelo Odebrecht e seu pai Emílio Odebrecht, viajaram juntos com Lula e emprestaram uma aeronave, conforme registram os documentos anexados no laudo da PF.
Doações
Os delatores da Odebrecht prometeram entregar aos investigadores planilhas das contribuições eleitorais executadas pelo Grupo Petrópolis e os documentos relacionados ao controle da movimentação real/dólar entre as contas das empresas.
Para os pagamentos em espécie, a Odebrecht acionava o operador Álvaro José Galliez Novis, que já foi alvo da Lava Jato, para distribuir o dinheiro fornecido pelo Grupo Petrópolis. Os investigadores já haviam encontrado indícios da relação entre o Grupo Petrópolis e a Odebrecht na 23.ª fase de 279 políticos de 22 partidos.
Com Benedicto Júnior, a Polícia Federal apreendeu uma planilha na qual “Itaipava” está anotada à mão ao lado de um repasse de R$ 500 mil para Luís Fernando Pezão (PMDB), atual governador do Rio de Janeiro. Essa mesma doação para Pezão está relacionada, no topo da coluna dos valores, a “Parceito IT”.
Defesa
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem negado veementemente qualquer irregularidade nos recebimentos por suas palestras realizadas após deixar a Presidência da República.
Por meio de nota divulgada via assessoria de imprensa, o advogado Cristiano Zanin Martins negou qualquer irregularidade nos fatos e atacou a Lava Jato. Leia a nota:
“O constante vazamento de dados relativos às atividades privadas do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostra a ausência de um juiz que se preocupe com as garantias fundamentais das pessoas que foram eleitas como alvo na Operação Lava Jato. Todas as palestras realizadas por Lula têm origem em contratos privados firmados com a empresa LILS Palestras e Eventos Ltda, criada pelo ex-Presidente para essa finalidade, em sociedade com o Sr. Paulo Okamoto. Esses contratos têm objeto lícito e os impostos foram recolhidos. Tais palestras foram feitas com o mesmo valor de referência e nas mesmas condições, para mais de 40 empresas de setores e países diversos. A Lava Jato não deixa, portanto, dúvida de que o seu atual objetivo é o de perseguir Lula, eleito inimigo político pelas autoridades envolvidas. Há inúmeros procedimentos investigatórios abertos - como esse - sem qualquer materialidade, com a única intenção de promover o desgaste da reputação e da imagem do ex- Presidente, tática do fenômeno reconhecido internacionalmente como ‘lawfare’. Cristiano Zanin Martins”.
Em publicação divulgada pelo Instituto Lula, o ex-presidente informa que “de 2011 a 2015, Lula deu 72 palestras empresariais pagas, para 45 empresas contratantes no Brasil e em todas as partes do mundo”.
“Lula discursou em reuniões de diretoria, seminários para dirigentes de empresas, encontros com clientes e confraternizações dos mais diversos setores - financeiro, alimentício, construção, bebidas, comércio, comunicações e outros.”
Segundo informa o documento, “todas as receitas e despesas da empresa LILS foram devidamente contabilizadas e seus rendimentos registrados nas declarações de Imposto de Renda dos dois sócios”.
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