Durante a sabatina de quase 10 horas que enfrentou no Senado, nesta terça-feira (21), Alexandre de Moraes se viu obrigado a esquivar-se de alguns temas. Então candidato a ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) – confirmado na manhã desta quarta-feira (22) para a cadeira –, Moraes alegou impedimento para antecipar posições sobre assuntos que certamente devem entrar na pauta da Corte, como descriminalização do aborto e de drogas. Apesar disso, relembrou posições, como em relação à redução da maioridade penal. Também confirmou ser a favor da prisão em segunda instância e defendeu o instrumento da delação premiada.
No STF, Moraes já é identificado com um perfil conservador, mais próximo de Gilmar Mendes e mais distante de Luís Roberto Barroso, por exemplo. Veja trechos do que ele falou na sabatina em resposta aos senadores:
Aborto
“Em relação à questão do aborto, eu vou pedir escusas em virtude de estar para ser pautada a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.581, que foi ajuizada pela Associação Nacional dos Defensores Públicos, em relação à interpretação da possibilidade de novas hipóteses de aborto. E, se eu me adiantar, ficarei com dificuldades em participar do julgamento.”
Descriminalização de drogas
“Da mesma forma em relação à questão das drogas: a descriminalização ou não estava com vista no gabinete do ministro Teori [Zavascki] e, se aprovado for, estará com vista no gabinete em que eu irei sucedê-lo. Faço um rápido comentário, que fiz aqui em questão semelhante: independentemente da questão ideológica e de mérito, na qual não entrarei nesse momento, nós temos que focar, como grande objetivo em relação às drogas, o traficante, o grande traficante, aquele que faz da sua vida essa violência em relação às drogas.”
Redução da maioridade penal
“Com relação à redução da maioridade, eu tenho uma posição conhecida desde 2005. Aqui no Brasil algumas legislações ficam imutáveis. A nossa Constituição tem exatamente 101 emendas, em 28 anos. A constituição do Japão, que é de 1947, não tem nenhuma emenda. Por outro lado, toda vez em que se fala em alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente, parece que é uma heresia. É um estatuto bom, é uma legislação boa, só que essa legislação pecou em um ponto: a proporcionalidade entre o ato praticado e a sanção.
Caso concreto, ocorrido em 2014 em São Paulo: um adolescente com 17 anos, 11 meses e 29 dias, na véspera do seu aniversário, matou a ex-namorada e matou o atual namorado dela com requintes de crueldade, filmou e colocou no YouTube, sabendo que ficaria no máximo três anos em detenção.
Então, a proposta que eu tive a oportunidade, lá atrás, de encaminhar, como secretário de Justiça, ao então presidente da Câmara Federal, em 2005, foi para que houvesse essa proporcionalidade, a possibilidade de que, nesses casos – nos casos equivalentes a crimes hediondos –, o ato infracional hediondo permita até 10 anos de internação. E, com 18 anos, não seria levado ao sistema penitenciário, mas ficaria separado dos demais adolescentes, em ala específica. Isso porque tive a experiência prática, quando acumulei a Secretaria de Justiça com a presidência da Febem, e observei que, ao fazer 18 anos, aquele menor, agora maior, vira um líder, um ídolo lá dentro, e acaba incentivando mais violência.
Em 2015, trouxe novamente à proposta [a Brasília] e o então senador e hoje ministro José Serra (PSDB-SP) a apresentou aqui no Senado também – já foi aprovada aqui e está aguardando votação na Câmara dos Deputados.”
Prisão a partir de condenação em segunda instância
“Obviamente, casos concretos surgirão, pode haver, mas eu não me furto a responder do ponto de vista doutrinário e teórico, porque defendo o mesmo posicionamento desde 1998, o posicionamento de que o princípio da presunção de inocência, previsto na Constituição Federal, não impede nem as prisões preventivas, nem as prisões em segundo grau por decisão de segundo grau.
Não há uma determinação legal, mas também não há impeditivo. Quem deve decidir sobre isso é o tribunal de segunda instância, exatamente porque – e esse é o fundamento jurídico que coloco – são a primeira e segunda instâncias que podem analisar os fatos, o mérito da questão, ou seja, são as primeira e segunda instâncias que podem analisar provas.
Em sendo condenado em segunda instância, inverte-se a presunção de inocência, mesmo cabendo recurso para tribunais superiores – STJ ou STF –, mas esses não poderiam julgar o mérito, somente algum ferimento à legislação federal, no caso do STJ, ou à Constituição, no caso do STF. O meu posicionamento desde 1998, que não mudaria agora, é que não há nenhuma inconstitucionalidade nas prisões em segunda instância.”
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As delações premiadas
“Sempre defendi isso desde os tempos do Ministério Público, quando ainda, no Brasil, não havia uma regulamentação disso. É um instrumento importantíssimo, um instrumento de persecução penal e de prova – ou, pelo menos, como a própria lei determina, provas indiciárias não podem condenar, mas permitem a investigação. Um instrumento importantíssimo que permite que nós não fiquemos só na investigação da base de eventuais cadeias criminosas, que possamos chegar ao topo.
A lei estipula uma série de requisitos. Há a participação tanto da polícia quanto do Ministério Público, e a homologação judicial, obviamente, vem sendo realizada de maneira eficaz. Não há dúvidas de que vem sendo realizada de maneira eficaz. E não vejo nenhum problema na legislação. Obviamente, vossas excelências [que são os legisladores] analisam se ela pode ser aperfeiçoada ou não, mas a lei atual permite que esse instrumento venha a ser bem utilizado como vem sendo feito.”
O alcance do foro privilegiado
“Essa é uma discussão importantíssima. A partir da Constituição de 1988, houve um aumento muito grande da previsão de foros, inclusive permitindo que os Estados estabeleçam, nas suas constituições estaduais, foros por prerrogativa de função. Há Estados que estabelecem, por exemplo, que vereadores de qualquer Município possam ser julgados diretamente pelo Tribunal de Justiça. Então, não há dúvida de que a nossa Constituição é a que tem o maior número de prerrogativas de foro. Esse é um primeiro ponto.
O segundo ponto é: necessariamente a prerrogativa de foro é ruim? Se pegarmos os debates, pegarmos todos os debates da Constituinte, vamos verificar que o legislador teve aqui uma fundamentação para isso, como perseguições políticas em determinados locais onde determinados grupos controlavam o Poder Judiciário. Então se previu o foro. Essa é uma outra questão.
Mas não tenho dúvida de que essa ampliação do foro privilegiado, independentemente de quem possa julgar melhor ou não, trouxe dificuldades operacionais, que precisam ser sanadas.”