O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu nesta quarta-feira (18), por 5 votos a 4, que a decisão final sobre a extradição do ex-ativista Cesare Battisti para a Itália ficará a cargo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O STF autorizou na sessão plenária desta tarde a extradição do italiano, ao revogar o refúgio concedido em janeiro pelo governo brasileiro a Battisti.
Após a decisão da Corte pela extradição de Battisti, os ministros definiram que a prerrogativa de entregar o ex-ativista é do chefe do Poder Executivo, cabendo ao Supremo apenas autorizar, mas não determinar. Procurada pelo G1, a Presidência da República não quis comentar a decisão, mas informou que o assunto será agora analisado pelo Ministério da Justiça.
Em plenário, houve grande divergência em torno da chamada "palavra final" sobre a extradição. O relator do processo, Cezar Peluso, e o presidente do STF, Gilmar Mendes, por exemplo, disseram que o presidente da República não teria alternativa senão extraditar Battisti.
Segundo Peluso, o tratado bilateral de extradição assinado entre Brasil e Itália, em 1989, prevê a entrega do réu para o país de origem se essa for a decisão da Suprema Corte brasileira. Para ele, o presidente da República não pode se recusar a entregar as pessoas "que sejam procuradas pelas autoridades judiciárias da parte requerente."
Mesmo já tendo votado no começo do julgamento, no dia 9 de setembro, Peluso voltou a se manifestar nesta quarta e se mostrou bastante crítico em relação à possibilidade de o Poder Executivo deixar de executar a extradição."Se o presidente da República se recusa a cumprir, quem revogará a prisão do extraditando, se ela é a consequência da procedência da ação?", questionou.
Peluso ponderou ainda que uma eventual decisão de Lula de não extraditar Battisti seria um "ilícito internacional" e o "descumprimento injustificado de um tratado". Por fim, o ministro disse que tal posicionamento não condiz com a pretensão de um país que busca um assento permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
Para Gilmar Mendes, o não cumprimento da extradição colocaria o Brasil em uma posição de "desprestígio grave no âmbito internacional". O ministro acrescentou que, apesar de todo o debate, não há um caso sequer de que um presidente da República tenha deixado de cumprir uma extradição autorizada pelo Supremo. "Não há espaço para a escolha quanto à observância [da decisão do STF de extraditar Battisti]", disse.
"Que título se daria ao extraditando se ele ficasse no Brasil? Refugiado não poderia, pois o refúgio foi revogado. Asilo político também é de difícil concepção no quadro que foi aqui discutido. Ele é um estrangeiro em situação irregular", disse Mendes.
De outro lado, porém, os ministros Joaquim Barbosa e Marco Aurélio Mello lideraram a tese vencedora de que cabe ao presidente da República tomar a decisão final de executar ou não a extradição. "A decisão de entregar o estrangeiro se situa no âmbito exclusivo e discricionário do presidente da República", disse Barbosa.
Já Marco Aurélio citou que o tratado prevê a negativa da extradição em caso de risco de perseguição do extraditando. "Assento que esse tribunal julgando extradição não pode adentrar ao campo do presidente da República para que proceda dessa ou daquela forma sobre política internacional, política de convivência com governos irmãos ou não irmãos", afirmou.
O fiel da balança para a formação do entendimento de que caberá a Lula dar a palavra final foi o ministro Carlos Ayres Britto. Ele foi o único dentre os que votaram a favor da extradição a considerar que o presidente da República possui a prerrogativa de optar entre entregar ou não o ex-ativista para a Itália.
"É o presidente da República quem dá a última palavra em matéria extradicional. O processo de extradição começa no Executivo e termina no Executivo. O Judiciário comparece como um rito de passagem necessária", analisou Ayres Britto.
Confusão
Depois de formado o placar de 5 a 4 pela possibilidade de o presidente dar a palavra final sobre a extradição, houve divergência em plenário. A confusão se deu porque Gilmar Mendes não proclamou a decisão. O presidente apenas citou o resultado referente à extradição concedida pelo Supremo à Itália.
Os ministros que votaram a favor da prerrogativa de Lula decidir o futuro de Battisti reclamaram. Os magistrados que seguiram o voto de Peluso levantaram dúvida sobre o voto de Eros Grau. Quando Mendes pediu a palavra para interpretar o voto de Eros, o próprio ministro Eros o interrompeu: "A pessoa mais indicada para dizer o que eu falei sou eu", disse.
Na sequência, Eros Grau deixou claro que seguiu o voto dos ministros Cármen Lúcia, Ayres Britto, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa, que atribui a Lula a decisão sobre o caso. Após a confusão, o resultado acabou proclamado por Gilmar Mendes.
Sem refúgio
O entendimento do Supremo colocará o presidente Lula diante de uma saia justa, pois ele terá de optar entre manter a posição do ministro da Justiça, Tarso Genro, que quer a permanência de Battisti no Brasil ou atender a pressão do governo italiano, que classifica o ex-ativista como um criminoso comum, e quer sua imediata extradição.
Na Itália, o ex-membro do grupo Proletários Armados para o Comunismo (PAC) foi condenado à prisão perpétua por quatro assassinatos cometidos no final da década de 1970. Battisti sempre negou envolvimento com os crimes. Desde março de 2007, ele está preso no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, onde aguarda a conclusão do processo de extradição.
Caso Lula decida não extraditar Battisti, o italianoem tese, até poderia morar no Brasil, mesmo sem possuir a condição de refugiado. Nesse caso, ele viveria no país como um estrangeiro com moradia permanente, o que no futuro até lhe permitiria obter a cidadania brasileira.
Há ainda a possibilidade de o próximo presidente do Brasil extraditar Battisti, caso Lula o mantenha no país. Situação semelhante ocorreu na França, onde Battisti viveu por um período em liberdade, mas acabou tendo sua extradição aprovada após a mudança de governo. Na ocasião, o ex-ativista fugiu para o Brasil, onde acabou preso no Rio de Janeiro, em 2007.
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