A relação “estressada” da presidente da República Dilma Rousseff com o Partido dos Trabalhadores (PT) – ela teria cogitado até se licenciar da legenda no final do ano passado – agora volta a ser a “pedra no sapato” da petista para conseguir aprovar matérias importantes no Congresso Nacional. A avaliação é de especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo.
Para o Doutor em Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Leonardo Barreto, Dilma conseguiu agradar os aliados ao tirar Joaquim Levy do comando da Fazenda e anunciar oferta de crédito para as famílias durante a recente reunião do “conselhão”. Por outro lado, continua ele, a presidente Dilma já disse que vai insistir na reforma da previdência e também no ajuste fiscal, medidas que não contam com o aval do PT. “Na história da República, a gente nunca teve um presidente tão afastado do seu próprio partido”, destaca ele.
De acordo com Barreto, a agenda econômica proposta por Dilma pode novamente não ter a ajuda do PT. “Com exceção da recriação da CPMF, que é uma medida já apoiada pela bancada do PT, os outros temas têm resistência. O PT é aquilo que a presidente Dilma vendeu na época da campanha eleitoral. Ele não quer este ajuste fiscal, por exemplo”, afirma ele.
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Analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz faz a mesma análise. “Quando o governo federal pede fidelidade a propostas do tipo, o partido fica exposto, porque são propostas que afrontam o programa partidário, que só agradam os empresários. É muito difícil que o PT apoie uma reforma da previdência ou qualquer mudança que bate de frente com a sua base social”, opina Antônio Augusto.
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Leia a matéria completaPara ele, o ano eleitoral e o fim do financiamento privado para a campanha dos candidatos contribuem para que o PT tenha uma postura crítica em relação às medidas de ajuste fiscal. “Sem financiamento empresarial, os candidatos do PT vão contar só com as doações dos militantes. O partido não está interessado em aprovar nada que agrida o militante”, reforça.
Queiroz lembra ainda que a própria CPMF, “o imposto do cheque”, dificilmente será aprovada no Congresso, mesmo com o apoio do PT. “Como se trata de uma PEC [Proposta de Emenda à Constituição], são necessários votos de pelo menos três quintos do plenário. O governo federal não tem este número hoje porque a CPMF está muito estigmatizada perante a opinião pública. Se o governo federal fizesse um Projeto de Lei criando um novo tributo teria mais chances”, comenta o analista político do Diap.
“Rompimento impossível”
Reportagem publicada nesta segunda-feira (1.º) pelo jornal Folha de S.Paulo revela que, no final do ano passado, pouco tempo antes da deflagração do impeachment, a presidente Dilma teria cogitado se licenciar do PT, montando uma espécie de “governo suprapartidário”.
Mas a possibilidade de um afastamento total entre a presidente Dilma e o próprio PT seria “impossível na prática”, avalia Barreto. “Aparentemente, o rompimento seria bom para os dois lados. O PT poderia criticar abertamente o governo federal e se livrar de uma agenda que para ele é ruim na relação com as bases. A presidente Dilma talvez ganhasse um fôlego na popularidade, afetada em boa medida pelo PT e pela Lava Jato. Mas, na prática, não funciona”, acrescenta.
“O PT se beneficia muito do poder, pois tem centenas de comissionados empregados e são eles que irão doar para as campanhas eleitorais, com o fim do financiamento privado. Já a presidente Dilma não pode se dar ao luxo de abrir mão do PT no meio de um processo de impeachment”, explica o doutor em Ciência Política pela UnB.
Para compor o cenário já estressado entre o PT e a presidente Dilma, há o “fator Lula”, lembra Barreto. “Com as investigações em cima do ex-presidente Lula, cresce a pressão do PT contra o ministro da Justiça [José Eduardo Cardozo], cresce o estresse com a presidente Dilma. Por outro lado, há setores do Planalto que avaliam que as investigações podem inviabilizar uma possível candidatura de Lula em 2018, o que poderia gerar uma espécie de salvaguarda da presidente Dilma, por parte dos aliados”, analisa ele.
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Leia a matéria completaCaso Cunha
O auge da crise entre a presidente Dilma e o PT ocorreu no final do ano passado, quando os três deputados federais da legenda foram pressionados a votar contra a abertura de um processo contra o presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dentro do Conselho de Ética da Casa. O temor do Planalto era ver Cunha deflagrando um processo de impeachment contra a presidente Dilma – o que de fato ocorreu, horas depois de a bancada do PT fechar questão contra o peemedebista.
O próprio presidente nacional da legenda, Rui Falcão, defendeu o voto contra Cunha, mas, nos bastidores, havia pressão do Planalto para “enterrar” o tema no Conselho de Ética. Após a deflagração do impeachment, a presidente Dilma veio a público negar qualquer tentativa do Planalto de interferir no processo contra Cunha.
“Naquela ocasião, o PT tomou a decisão certa”, comenta Queiroz. Para ele, a questão do impeachment hoje “está superada”. “Eu acho que a decisão do STF [Supremo Tribunal Federal], deixando a votação principal nas mãos do Senado, deu uma tranquilidade para o governo federal. Acho que o impeachment morre ainda na comissão especial da Câmara dos Deputados”, fecha.
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