• Carregando...
Sting: sem dom para as rimas | Arquivo Gazeta do Povo
Sting: sem dom para as rimas| Foto: Arquivo Gazeta do Povo

Primeira artista pop a vencer as barreiras geladas de seu país natal, a islandesa Björk consolidou seu nome no cenário musical mundial graças a uma bem-sucedida pesquisa de ritmos e um estilo vocal único, que se tornou sua marca registrada. Em sua 3º passagem pelo Brasil, a cantora traz ao Tim Festival (edições de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba) o show da turnê mundial de lançamento de "Volta", seu 6º álbum-solo, espetáculo visto por milhares de pessoas desde abril, na Europa, EUA e Canadá.

Mais rítmico e dançante, ao contrário do trabalho anterior "Medulla", no qual utilizou apenas sua voz, "Volta" conta com a participação de convidados como o produtor de hip-hop Timbaland, o músico Antony Hagarty (da formação Antony and the Johnsons, que também se apresenta na edição paulistana do Tim Festival), e a utilização de instrumentos pouco conhecidos, como a harpa africana kora ou o alaúde chinês pipa.

Nesta entrevista concedida a um pequeno grupo de jornalistas brasileiros há duas semanas, por e-mail, de Nova Iorque, Björk fala da cultura islandesa e aborda temas como globalização e a relação do artista com a música na era da internet (veja o site de Björk). A cantora explica ainda as influências presentes em sua música e dá detalhes sobre o show que apresenta na Pedreira Paulo Leminski, na próxima quarta-feira (31). Confira:

Você já se apresentou no Brasil duas vezes e no início deste ano esteve de volta ao país, acompanhando o carnaval baiano. Como foi essa experiência?Björk – Foi extraordinária e muito especial para mim. Fui à Bahia porque meu namorado (Matthew Barney) estava fazendo um projeto por lá. Mas sou da Islândia e sou bastante consciente de que as pessoas dos EUA e da Inglaterra me acham exótica, o que é uma coisa totalmente esquisita, pois 90% do mundo é exótico. Por ser ciente e bastante defensiva sobre isso, não achei que poderia ir ao Brasil, comprar uma camiseta local, pegar um tamborim e sair cantando como uma turista. Não fiz isso quando estava aí. Às vezes, sinto que tenho muito respeito.

E, desta vez, o que espera de seu retorno ao Brasil?Para mim não é só o Brasil, pois estarei visitando cinco países. Talvez quando eu estiver por aí, vou dizer: ‘ah, OK, é o Brasil!’ (risos). Mas estarei visitando o Peru e a Colômbia pela primeira vez. Então, estou bastante empolgada com isso. No Chile, eu já estive antes, mas apenas por dois ou três dias. Depois de passar pela Colômbia, eu vou pegar um barco e viajar até o México. Terminei uma turnê de cinco meses pela Europa e pelos EUA, então, estou muito feliz em viajar para outros lugares. No México, devo me apresentar próximo a um vulcão. Mas é muito difícil viajar assim, com tanta gente, numa turnê. É muito dispendioso e você acaba ficando no zero. Mas pelo menos eu não perco nenhum dinheiro.

A reportagem do Caderno G teve a oportunidade de assistir a seu show no festival dinamarquês de Roskilde, a convite da Tim. O show que está trazendo ao Brasil será diferente daquele?É o mesmo show. Mas ele cresceu um pouco, pois fomos ficando melhores com os instrumentos. Este ano os instrumentos eletrônicos que usamos se tornaram mais impulsivos. Aprendemos a tocá-los melhor. Acho que muitas das canções de "Volta" foram escritas para performances ao vivo, então, a versão em CD não é a melhor maneira de ouvi-las. Acho que elas acabaram crescendo ainda mais no palco.

É possível afirmar que a música brasileira influenciou "Volta" em algum aspecto?Sempre fui muito fissurada por ritmos. Estava tentando sugerir que os ritmos neste álbum são muito globais, mas as pessoas têm idéias negativas sobre a globalização, de que é tudo a respeito de supermercados, McDonald's e de que as pessoas nos Estados Unidos estão se transformando nos senhores do universo. Mas acho que tem o outro lado disso, de que a gente é o que queremos fazer. Por que deixar tudo por conta do Bush? Nós somos seis bilhões! E só tem um dele. Para mim, o álbum foi uma maneira de sugerir que estou cheia do nacionalismo, das pessoas dizendo isso ou aquilo, de controvérsias.

Seu novo show conta com recursos visuais econômicos, porém bastante impactantes, como seus figurinos e os próprios instrumentos utilizados durante as canções. Acha fundamental o casamento entre elementos visuais e sonoros no palco?Não muito. Acho muito difícil de fazê-lo porque a maioria das pessoas tem a visão muito mais desenvolvida que a audição. Quando o público é apresentado a muitas imagens visuais, é como se ele estivesse assistindo à tevê. As pessoas não se tornam presentes no momento, elas se desligam. Geralmente, tenho uma ou duas canções no início do show que acontecem no escuro, pois assim as pessoas se ligam na audição. O lado visual é geralmente o mais expressivo. No passado, eu usei muitos fogos de artifício, hoje eu trabalho mais com laser e confete, então, não são mais imagens figurativas a serem contempladas. São mais emoções visuais impressionistas, porque acho que é uma sensação muito importante. Shows que têm muita poluição visual acabam estimulando apenas um hemisfério do cérebro e você passa a não ser mais impulsivo.

Você descreveria sua música como algo cinemático?Tento fazer uma música que é parte da vida. Não vejo a música pop como uma experiência isolada dentro de um estúdio. Acho que música tem que ser como andar pela rua e mostrar a seus amigos a emoção que você tem. Ela deve ser casada com sua vida e não uma experiência isolada que acontece dentro de uma bolha musical.

Uma das atrações de seu show (em São Paulo e no Rio de Janeiro) é a participação do músico Antony Hegarty, do Antony and the Johnsons. De que maneira você se identifica com o trabalho dele?Acho que as palavras emocionais e as palavras matemáticas são a mesma coisa. Acredito que o Antony e eu fazemos parte da mesma caixa. A outra caixa é mais teatral. Muito freqüentemente, as pessoas que gostam de teatro costumam não gostar muito de música, e vice-versa. É uma grande generalização e não estou muito certa do porquê disso. Acho que música é uma coisa muito humana. De alguma forma, música é muito mais humana que a sociologia e a psicologia, em que você está tentando analisar o comportamento humano e fazendo do comportamento humano uma ciência, o que é uma grande contradição. Enquanto que, com a matemática de uma canção, seu abstracionismo dá espaço para a emoção humana. Espero que esteja fazendo algum sentido.

Quais os artistas que te empolgam hoje em dia?Eu gosto muito do Santo Gold, da M.I.A. e da Joanna Newsom. Gosto de muita coisa. Eu acho que estamos vivendo uma nova época, na qual mais pessoas, cujo inglês não é seu idioma natal, estão formando a maior comunidade do mundo. E acho que vai existir mais espaço para essas pessoas no mundo.

A grande notícia musical deste mês foi a decisão do Radiohead de disponibilizar o novo álbum deles na internet em esquema "pague o quanto quiser para baixar". O que você achou disso? Seria o futuro?Talvez não completamente, mas achei uma decisão muito honesta. Acho a indústria da música bastante difícil de se lidar hoje em dia, porque é uma grande máquina, um dinossauro. Eu finalizo um álbum, entrego-o para a gravadora e eles precisam de um período de seis meses, às vezes um ano, para lançá-lo, pois eles têm que mandar para os jornalistas espalhados pelo mundo, você tem que fazer sessões fotográficas... Você já gasta oito meses para gravar um álbum e depois tem que esperar ainda mais um ano por esse ridículo processo. Talvez esse tipo de esquema tenha feito sentido há dez anos, mas agora, quando você pode compor uma música e colocá-la na rede via MySpace, me parece uma coisa totalmente obsoleta. E os músicos, os fãs, ninguém quer fazer isso, só os dinossauros, que às vezes estão muito atrasados. Não acho que a ação do Radiohead seja a solução final, mas acredito que é uma boa coisa. E se vai vazar mesmo na internet, acho legal que os fãs decidam quanto eles podem ou querem pagar. É incrível a força da internet. Hoje, eu passo muito mais tempo na frente do computador e sempre descubro novas bandas. Você pode escutar música, pode assistir ao YouTube. É muito bom que isso esteja acontecendo, pois é legal para a música, porque a gente não tem mais aquela coisa de andar pela rua, como eu, e ter esse caso de amor com uma lojinha de discos em cada cidade. Antes eu passava três horas por semana numa lojinha de discos para escutar tudo o que eu queria. Agora essa coisa física com a música foi embora.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]