O pedido de recuperação judicial da Oi acendeu a luz amarela para os investidores que sempre viram no setor de telecomunicações um porto seguro no mercado acionário. Consideradas defensivas, já que oscilam menos que a média do mercado, além de boas pagadoras de dividendos (parte do lucro que é distribuída aos acionistas), as ações das teles, segundo especialistas, estão em processo de mudança. Por isso, eles recomendam cautela com esses papéis.
“As ações de telecomunicações sempre foram procuradas pelo investidor interessado em receber dividendos, o que ajuda a se proteger de perdas no mercado de ações em tempos de baixa. Mas a crise da economia e as mudanças tecnológicas estão afetando o negócio”, diz Rafael Ohmachi, analista da Guide Investimentos.
Na prática, as empresas do setor estão tendo que se reinventar, e isso tem um custo. Com as inovações tecnológicas constantes (3G, 4G e assim por diante), elas precisaram aumentar seus investimentos para atender às necessidades do consumidor. Isso consome o caixa, eleva o endividamento e reduz os dividendos, explicam analistas.
É um cenário diferente do observado logo após a privatização das teles, no início dos anos 2000, quando a Telebras foi fatiada em 12 empresas, que tiveram de investir pesado em infraestrutura para, depois, fazer apenas a manutenção. “Era uma receita constante e previsível, com fluxo de caixa estável”, diz Ohmachi.
Nas três companhias do setor que têm ações negociadas na Bolsa de Valores, Oi, TIM e Telefônica Brasil (Vivo), a distribuição de dividendos vem minguando nos últimos anos. Segundo levantamento da consultoria Economatica, a Oi pagou R$ 2,4 bilhões em dividendos em 2012 — mas, no ano passado, apenas R$ 57 milhões. Na Vivo, a divisão dos lucros com os acionistas caiu de R$ 5,3 bilhões em 2011 para R$ 3,6 bilhões em 2015. E na TIM, encolheu de R$ 734 milhões em 2013 para R$ 360 milhões no ano passado. A Claro não tem papéis no pregão.
Nova onda de reestruturação
No Ibovespa, principal índice do mercado brasileiro, o setor de telecomunicações representa hoje apenas 2,9%, o que mostra a rapidez da consolidação. No passado, as ações das teles já chegaram a representar quase 50% da carteira do índice.
Na Guide, a única recomendação positiva entre os três papéis é para a Vivo. Segundo Ohmachi, embora a companhia tenha sofrido com a conjuntura adversa para o setor, ela se mantém eficiente, com margens maiores de ganho e bom pagamento de dividendos.
Na Bolsa, as ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Vivo, que têm prioridade no recebimento dos dividendos, têm valorização de 19,3% no ano. Já os papéis PN da Oi têm queda de 22,3% em 2016. Na semana passada, no dia seguinte ao pedido de recuperação judicial, as ações da operadora chegaram a cair mais de 30%, recuperando-se após o governo sinalizar que agilizará a tramitação da Lei Geral das Comunicações. Na quinta e na sexta-feira, subiram 35% e 18%, respectivamente. A TIM, que só negocia ações ordinárias (ON, com direito a voto), perde 1,4% no ano.
Ohmachi observa que, para o investidor que busca o pagamento de dividendos, há hoje empresas do setor de energia mais interessantes que as teles: “Os papéis de algumas transmissoras de energia, como Alupar e Taesa, estão oferecendo dividendos melhores que os do setor de telecomunicações.”
Para o consultor de investimentos Paulo Bittencourt, o investidor pessoa física deve, neste momento, ficar fora dos papéis de telecomunicações. Ele não vê parâmetros para estimar o comportamento dessas ações em prazo mais longo, como deve ocorrer com o investimento em renda variável.
“Estamos em um momento de mudança de paradigma no setor, em que o modelo de negócios está sendo reelaborado, com novo mix de produtos. Por isso, acho os papéis arriscados para investidor pessoa física, que tem pouca informação. O momento é de cautela, e é melhor esperar”, explica.
O consultor observa que o modelo de privatização foi concebido para oferecer telefonia fixa, móvel e transmissão de dados de forma separada. Hoje, as empresas precisam oferecer os três serviços integrados, além de ter em seu pacote a TV por assinatura.
Bittencourt lembra ainda que a crise econômica reduziu o consumo dos serviços de telefonia nas classes C e D, que migraram para os pré-pagos e usam WiFi para transmissão de dados. Ele acredita que a situação da Oi pode desencadear uma nova onda de reestruturação do setor, com a entrada de grandes grupos estrangeiros, por exemplo. E que TIM e Vivo podem se beneficiar com a migração de clientes da Oi. Isso, diz, teria impacto positivo nos papéis do setor, mas esse cenário ainda é incerto.
Para quem já tem ações da Oi em seu portfólio, o especialista em investimentos do banco Ourinvest, Mauro Calil, recomenda a venda dos papéis se eles representarem uma parte pequena do total de recursos aplicados. Mas, se o valor alocado for robusto, o melhor é esperar.
“Se o valor alocado for igual ou superior a 50% do total de investimentos, é melhor ficar com as ações. Mas se representar apenas 5% do portfólio, o ideal é cair fora. E para quem não tem nenhum papel de tele neste momento, não recomendo comprar. Há outras alternativas na renda variável mais interessantes, como os fundos recebíveis imobiliários, que oferecem um retorno melhor no curto e médio prazo”, diz Calil.
Debêntures: na fila
Os investidores que aplicam em fundos de investimento com papéis da Oi também terão perdas. Isso porque esses fundos terão de reconhecer o prejuízo e provisionar perdas, o que afetará negativamente o rendimento. Levantamento da Economática mostra que 163 fundos têm debêntures ou ações da Oi, no total de R$ 519 milhões. Como as debêntures são títulos de dívida privada emitidos por uma empresa, quando ela entra em recuperação judicial o pagamento é suspenso.
“Os donos de debêntures entram na fila com os demais credores para receber. Algumas debêntures oferecem garantias, como imóveis ou o pagamento atrelado à receita da empresa. Isso pode reduzir um pouco o prejuízo”, explica Calil.
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