Em setembro de 2015, a S&P Global Ratings – antiga Standard & Poor’s – foi a primeira das três grandes agências de classificação de risco a rebaixar a nota de crédito do Brasil e, consequentemente, retirar o grau de investimento do país, que havia sido conquistado em 2011. Em fevereiro deste ano, a agência voltou a diminuir a nota citando “consideráveis” desafios políticos e econômicos. Esta classificação é mais um fator que mantém os investidores estrangeiros distantes do país.
O economista-chefe para a América Latina da S&P, Joaquin Cottani, esteve em Curitiba na quarta-feira (15) para participar do Fórum de Economia da Câmara Americana de Comércio e falou com a Gazeta do Povo sobre os caminhos que o país deve seguir para retomar o grau de investimento.
Qual a sua avaliação das medidas econômicas anunciadas pelo governo do presidente interino Michel Temer?
Acho que são medidas muito boas que estão alinhadas com o que se esperava desde que o partido (PMDB) e o presidente traçaram linhas gerais no documento Uma Ponte Para o Futuro. Dar ênfase à reforma da Previdência Social e à ideia de que se mantém o gasto crescendo ao limite da inflação registrada no ano anterior me parece muito bom. Uma vez que economia comece a crescer, o déficit vai diminuir e então vai ser eliminado. Do ponto de vista do Banco Central, o anúncio do presidente Ilan Goldfajn de que vai haver uma redução gradual nas taxas de juros, uma vez que a expectativa é de que a inflação diminua, afasta o temor de que as pessoas mais duras em política monetária digam que tem que continuar aumentando a taxa. Essa política foi abandonada e agora há uma política de redução gradual da taxa porque há espaço para isso por conta da recessão e além disso há uma política de tratar de aprovar uma reforma estrutural no gasto público. Isso é muito bom, mas é claro que há que se esperar, no caso das medidas que requerem aprovação parlamentar, para que possam ser implementadas.
E quais seriam as principais ações?
Concretamente, romper a indexação das pensões ao salário mínimo; não há nenhuma relação para que estas coisas estejam ligadas. Outro ponto é tratar para que todos os programas que tenham recursos específicos sejam avaliados como se estivessem sendo executados pela primeira vez. É importante dizer “bem, isso é algo que já vem sendo feito há dez anos, mas não faz sentido que se faça ou que se destine tanto dinheiro”. Naturalmente isto é mudar a cultura do Congresso e seguramente vai haver muita negociação interna e resistências individuais. No entanto, como o Congresso está em cheque por conta da corrupção pode ser até uma oportunidade. Se eu me coloco no lugar de um congressista investigado, eu ao menos me esforçaria para ser parte da solução dos problemas do país e não ficar jogando com questões políticas. A única coisa que um político pode fazer para aumentar seu status é mostrar que está contribuindo com as soluções dos problemas de um país. Deste modo, sou relativamente otimista e acredito que os congressistas vão se elevar à altura da situação.
Essas medidas colocam o Brasil no caminho da retomada de seu grau de investimento?
Sim, claro. Eu não faço ratings, mas nosso critério é claro: se a política melhora, se o horizonte indica melhoras e se começam a cumprir as medidas que contribuem para esta melhora isso pode acontecer. As mudanças não ocorrem de forma instantânea, mas gradualmente melhora a perspectiva e eventualmente esta é a forma de que um rating melhora até se converter em grau de investimento. Ademais, o mercado sempre se antecipa a estas coisas. Então, do ponto de vista do que importa, que é o custo da dívida e os investimentos no país, os investimentos vêm. Claro que o rating é muito importante para todos os fundos de investimento que requerem o investiment grade.
A S&P também avalia o rating dos estados, que no Brasil enfrentam graves problemas fiscais. De que modo é possível reverter esta situação e qual o papel da União neste processo?
Nos estados, o problema quantitativamente está mais contido. Os estados, automaticamente, podem chegar a ser beneficiários da mesma política. Geralmente, quando começa um processo de ajuste a nível federal, há um processo de imitação por parte dos estados. Além disso, há mais financiamento público, o que pode eliminar a necessidade de elevar impostos estaduais e permitir um corte de gastos mais permeável para a política estadual.
O Brasil ainda se mantém muito fechado internacionalmente. O senhor acredita que este é um bom momento para o país se abrir ao comércio exterior?
Esta é outra oportunidade que oferece a mudança na política argentina com o Mercosul. Isso vai ser mais possível, sobretudo, com o José Serra no Ministério das Relações Exteriores. Ele vai poder coordenar os esforços dentro do Mercosul, por exemplo, para negociar aberturas à comunidade europeia ou com a Aliança do Pacífico. Enfim, agora o país poderá usar melhor o aparato institucional do Mercosul porque há dois governos que têm mais ou menos a mesma filosofia neste sentido.