Dias desses, me apareceu um colega de labuta inconformado diante da legislação reinante na seara do Direito Tributário, cuja interpretação, quase sempre literal, raramente favorece o súdito. Explicou esse colega que, tendo atuado em determinado processo de separação consensual de um casal, foi, posteriormente, surpreendido com o brutal tratamento fiscal aplicado pela Receita Federal contra a separanda, sua cliente.
No casao, segundo os termos da homologação judicial da partilha dos bens, lavrada na vara de família, foi acordado que os direitos sobre o único imóvel do casal seria divido em partes iguais. Os filhos menores ficariam sob a guarda da mãe e, como compensação pelos gastos indispensáveis ao sustento do lar, o ex-marfido, então desempregado, cederia 50% de uma verba trabalhista objeto de ação por ele movida na Justiça do Trabalho contra seu antigo empregador.
Em seguida, após a decisão proferida na causa trabalhista em favor do ex-marido, cujas verbas envolviam indenização por dano moral, a ex-mulher habilitou-se ao recebimento do valor acordado, ou seja, 50% da indenização assegurada ao ex-cônjuge varão.
O fisco, sob o fundamento de aquisição de "renda" e consequente acréscimo patrimonial, cobrou Imposto de Renda da separanda, ignorando por completo os termos da partilha do modesto patrimônio do casal e a real destinação da referida meação recebida nos autos do feito trabalhista, que, às escâncaras, possui natureza alimentícia.
Non olet
Todos sabem que o fisco é um monstro insaciável. Interessa-lhe apenas saber onde tem dinheiro ou patrimônio para abocanhar a sua parte seja qual for a origem, mesmo que criminosa. Age sempre protegido com o escudo da cláusula "non olete", segundo a qual não interessa a licitude da riqueza a ser tributada. A origem dessa máxima remonta ao Império Romano. Vespasiano, questionado por Tito, seu filho primogênito e futuro sucessor, sobre a imoralidade de polêmica taxa, a qual, na sua visão, faria a cidade feder mais ainda, pegou uma moeda e disse: "non olet" (não tem cheiro). O brocardo também é traduzido como "pecunia non olet" dinheiro não tem cheiro.
Pois bem. À parte as célebres ponderações de Tito Flávio Vespasiano em cujo reinado relâmpago ocorreu a famosa erupção do Vesúvio que engoliu Pompéia , o fato é que o colega de labuta, referido no início, continua sem sucesso na luta travada em defesa de sua constituinte, contra a investida fiscal, e descrente em relação ao que está escrito nos artigos 43, 45 e 121 do Código Tributário Nacional, a seguir transcritos:
" Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43, sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis.
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei."
Por hoje é só, na certeza de que o desolado colega de labuta não terá o mesmo destino de Pompeia.