Pilha de metal retorcido é memória do acidente, ocorrido em 2009| Foto: Átila Alberti/Tribuna do Paraná

O ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho está sendo julgado desde a terça-feira (27). O julgamento é um desfecho de um processo que se arrasta há mais de oito anos e nove meses, desde que – em 7 de maio de 2009 – o Passat que o réu dirigia atingiu o Honda Fit em que trafegavam dois jovens, que morreram na hora. O caso é emblemático por uma série de motivos, entre os quais, por ser a primeira vez que um político paranaense vai a júri popular e pela discussão que gerou sobre crimes de trânsito.

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Em agosto de 2009, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) denunciou Carli Filho por duplo homicídio com dolo eventual. Na prática, a promotoria considerou que, embora não tenha tido propriamente intenção de matar, o ex-parlamentar assumiu o risco de fazê-lo. Isso porque Carli Filho dirigia a uma velocidade entre 161 e 173 quilômetros por hora, quando o carro dele decolou a atingiu o veículo em que estavam as vítimas. Além disso, o agora réu havia consumido álcool e estava com a carteira de habilitação suspensa - com 130 pontos.

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A defesa de Carli Filho, no entanto, fez de tudo para que o réu fosse julgado por duplo homicídio culposo - quando não há intenção de matar. Nesta hipótese, o caso seria considerado como uma mera fatalidade, como um acidente de trânsito comum. Ao longo desses anos, os advogados do ex-deputado lançaram mão de exatamente 33 recursos, em todas as esferas possíveis: Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF). Essa questão só foi pacificada no fim do ano passado, quando o ministro Gilmar Mendes negou o último recurso que tramitava no STF.

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“Este caso é um divisor de águas. O júri popular manifesta o que decide a sociedade. E a sociedade vai dizer se pode permanecer incólume esse tipo de conduta ou se isso deve ser penalizado como um crime”, disse o advogado Juarez Xavier Kuster, que figura como assistente de acusação, representando a família de Carlos Murilo de Almeida - um dos jovens mortos no desastre.

Além de o réu ser julgado por um corpo formado por sete jurados, a pena prevista para homicídios com dolo eventual é maior: varia de 6 a 20 anos de prisão (com acréscimo de até 2/3, em razão de haver uma segunda vítima). Se fosse julgado por homicídio culposo, Carli FIlho teria o caso analisado por um único juiz. Nesta modalidade, a sanção varia de dois a quatro anos - em muitos casos, convertidos em penas alternativas.

Teses

Conforme a Gazeta do Povo mostrou, um dos principais pontos a serem explorados pela acusação é o fator velocidade. Carli Filho corria a uma velocidade três vezes maior que a permitida - que era de 60 quilômetros por hora. Para a promotoria, se ele trafegasse respeitando o limite, haveria no máximo um pequeno acidente de trânsito.

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“Se ele estivesse na velocidade indicada para a via, estaríamos diante de um acidente de trânsito, porque não haveria morte. Haveria, no máximo, a colisão. O fato que gerou a morte foi o excesso de velocidade. Ele [Carli Filho] usou o carro como uma arma”, disse o promotor Marcelo Balzer.

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A defesa, por sua vez, tem se apegado à questão de que Carli Filho trafegava por uma via preferencial. Por isso, os advogados do réu têm sustentado que as vítimas teriam provocado a colisão, ao fazer a conversão, ingressando na via em que o ex-parlamentar transitava. O argumento é controverso, já que testemunhas apontaram que o carro dos jovens teria parado no cruzamento, respeitando a sinalização.

O advogado Roberto Brzezinski Neto - que representar Carli Filho - tem adotado a estratégia de fugir dos holofotes. Ele evita dar entrevistas e, mesmo às vésperas do julgamento, não fala sobre o caso. Na semana passada, ele emitiu uma nota em que afirma confiar na Justiça e ter certeza de que o julgamento ocorrerá respeitando o direito à ampla defesa.

Pena

Ainda que seja condenado, Carli Filho não sairá preso do tribunal. Conforme a Gazeta do Povo mostrou, a defesa poderá recorrer a outras instâncias, caso o júri considere o réu responsável pelas mortes. O ex-deputado só deixaria o prédio detido, caso já estivesse cumprindo alguma medida restritiva de liberdade.

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Apesar de toda comoção em torno do caso, Carli Filho não deve ser condenado a penas superlativas, que cheguem ao máximo previsto em lei. O próprio promotor é cauteloso ao falar sobre as possíveis sanções ao ex-deputado, em caso de condenação.

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“A pena dele nunca será mais de dez anos. O que a opinião pública sempre vendeu em relação à pena não é a realidade. Gostaríamos que ele tivesse uma pena superior, mas a doutrina orienta uma pena mínima. Jamais será a pena máxima”, apontou Balzer. O advogado Brezinski preferiu não estimar pena, em caso de condenação. “Quem define isso é o juiz”, resumiu.

O caso

A colisão que matou Gilmar Rafael Yared e Carlos Murilo de Almeida ocorreu na madrugada de 7 de maio de 2009. Carli Filho ficou ferido no desastre e chegou a ser hospitalizado. Um exame feito a partir de material colhido no hospital em que ele foi atendido apontou que o então deputado estava embriagado – tinha 7,8 decigramas de álcool por litro de sangue: quatro vezes mais que o permitido. O resultado, no entanto, foi desconsiderado como prova pela Justiça porque Carli Filho estava desacordado no instante em que o exame foi feito.

Além disso, laudos do Instituto de Criminalística comprovaram que, no instante da colisão, o Passat dirigido por Carli Filho estava a uma velocidade entre 161 km/h e 173 km/h. O ex-deputado também estava com a carteira de habilitação vencida e sequer poderia estar dirigindo.

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A defesa do réu tem apostado na tese de que a culpa pela colisão é dos jovens mortos. Segundo os advogados de Carli, o Honda Fit não respeitou a preferencial – que era a via por onde o carro do ex-deputado trafegava. No instante da colisão, o semáforo estava desligado.

Em fevereiro de 2014, a 1.ª Câmara Criminal do TJ-PR entendeu que havia indícios de que Carli Filho assumiu o risco de matar ao dirigir em alta velocidade e depois de ingerir bebida alcoólica.

Em maio de 2016, em mais um capítulo polêmico dessa história, Carli Filho divulgou um vídeo pedindo perdão às mães dos jovens mortos. Em resposta, Chistiane Yared, mãe de uma das vítimas, reagiu imediatamente, dizendo que o ex-deputado estava “sete anos atrasado para o enterro” do filho dela e que não percebeu sinceridade no pedido de perdão.