Não à toa uma das denominações para nossos cemitérios é a de necrópole. A etimologia das palavras gregas nekrós (morto, cadáver) e pólis (cidade) coloca o espaço como a cidade dos mortos. Já a palavra cemitério, koimétêrion em grego, designa lugar para dormir. A acepção dessa remete à visão cristã do espaço de sepultamento como um local de descanso até o momento da ressurreição.
Entre ruas e alamedas, muitas vezes entrecortadas pela avenida principal, existem os espaços de destaque, aqueles ocupados por famílias influentes em túmulos suntuosos; mas também há as áreas marginais, com construções mais simples e imbricados em relações de vizinhança. Diferentes estilos de vida e classes sociais estão representados em tipologias construtivas semelhantes às da cidade dos vivos.
Há também os espaços de socialização, como o cruzeiro, no qual diferentes credos – auspiciados pela secularização do símbolo – realizam suas oferendas, rezam e interagem com outros frequentadores. Bairros, na melhor acepção do termo, delimitam esses agrupamentos de estilos e modismos. Eles são planejados ou ocupados por uma demanda de tempo e espaço. Trata-se de uma divisão visual e que muitas vezes passa despercebida pelo olhar acostumado a seguir em frente por ruas e calçadas.
Assim como a cidade dos vivos, a ocupação das necrópoles também sofreu mudanças drásticas ao longo do tempo. A última morada, que em séculos anteriores era ocupada por apenas um habitante, precisou dar espaço para o uso mais racional dos terrenos e também sofreu uma verticalização. As tipologias arquitetônicas, antes albergadas em art deco, ecletismo, neocolonial, modernismo e até mesmo paranismo, deram espaço para pequenos condomínios verticalizados.
O crescimento constante da cidade dos vivos estrangulou as possibilidades de expansão na necrópole, o que causou a valorização dos espaços, os quais estão cada vez mais raros e escassos. Onde habitava apenas um, agora estão mais dois, três. Como resolver o imbróglio dessa especulação territorial quando todos buscam paz e morada eterna? A solução foi sobrepor as unidades habitacionais, conhecidas como carneiras ou gavetas. Nascia assim o estilo mais marcante dos cemitérios curitibanos: o túmulo verticalizado.
As variações dessa tipologia construtiva podem ser percebidas com poucos exemplares. Há o bairro histórico, no qual os túmulos eram predominantemente verticalizados e formavam unidades em mármore, adornadas por esculturas; o bairro urbanizado, em que a abertura de ruas e novas quadras alterou as modalidades construtivas e do qual faz parte o jazigo capela, que traz o híbrido entre a função sacra (o pequeno oratório ao centro da construção) e a necessidade de uso de duas ou quatro carneiras lateralizadas.
O túmulo verticalizado já se faz presente em todos os bairros, inclusive naquele que se pode aludir como o “Batel dos mortos”, onde estão concentradas as maiores e mais suntuosas construções tumulares: os mausoléus. A racionalização chegou para todos, ricos ou pobres. Para os casos em que não se pode usufruir de terrenos com até 107 metros quadrados, a verticalização foi o investimento disponível.
A diversidade dos materiais empregados denuncia a consolidação da tipologia há pelo menos 50 anos. Entre o pó de pedra, azulejos, granitos e rochas ornamentais de uso mais contemporâneo, o porcelanato já conquistou espaço nas novas construções. Na linha do horizonte, necrópole e polis misturam-se, devidamente racionalizadas e verticalizadas.