No Líbano existem mulheres como a brasileira Nariman Osman Chiah, de 21 anos, que não podem voltar para o Brasil. Filha de imigrantes libaneses, ela foi levada para lá aos 14 anos, para arranjar um marido. Eles se casaram e viviam no Brasil até três meses atrás, quando o marido propôs a mudança para o Líbano, alegando que seria melhor para a cultura dos filhos. Mas ao chegar lá, tudo mudou, conta a brasileira.
"Com certeza, isso foi um plano dele. Ele falou quando chegamos: consegui trazer vocês. Eu percebi que era caminho sem volta já no terceiro dia. Não podia ver minha irmã. Liguei para os meus pais, pedi ajuda", lembra Nariman, contando como virou prisioneira do marido Ahmed Chiah.
A brasileira diz que começou a apanhar e a ser ameaçada de morte. Segundo ela, o marido rasgou os passaportes dela e do filho. Para tentar voltar ao Brasil, ela tirou novos documentos no consulado, mas, na hora do embarque, foi impedida de sair do país por ordem do marido.
Estatísticas contra
A diretora da ONG que toma conta de mulheres nessa situação confirma a "lei do homem". "Existem duas leis: as normais, feitas pelos deputados, e as religiosas, baseadas em tradições milenares. São leis muçulmanas e cristãs. Felizmente, só uma minoria ainda apela para esse tipo de legislação no Líbano" diz.
No tribunal religioso que julga esses casos, as estatísticas conspiram contra Nariman: 96% dos processos que envolvem casamento favorecem os maridos.
Pelas contas de organizações não governamentais, no Líbano a média mensal é de 10 casos do chamado abuso de autoridade masculina. Não há estatísticas oficiais confiáveis, mas o departamento de migração em Beirute estima que, por ano, pelo menos 15 brasileiras são barradas no aeroporto internacional.
Vida e morte
Os poucos advogados que aceitam defender esse tipo de causa acreditam que os números reais são muito maiores, já que grande parte das mulheres simplesmente têm medo de denunciar seus maridos.
"A justiça libanesa é muito complicada, morosa e não está do lado da mulher. A mulher libanesa não tem direitos", explica o cônsul-geral do Brasil em Beirute, Michael Francis Gepp. "Ela é brasileira mas é casada com muçulmano. Ele tem direito de vida e morte sobre ela".
Em entrevista, Ahmed Chiah, o marido de Nariman, afirma que ela só queria status e dinheiro. "Mulher mora com o marido dela. Onde é o lugar, tem que ficar com ele".
Ahmed admite que tentou isolar a mulher, mas nega ter sido violento. "Não teve surra, juro por Deus. Uma vez tirei a faca, tá certo. Mas, quem vai matar? Só fiz isso".
Ahmed afirma que neste sítio poderia viver com a mulher e os filhos. Agora, diz ele, não quer mais saber dela. Apenas das crianças. Enquanto isso, sem acreditar na justiça, sem saber que rumo tomar, mãe e filho esperam por um milagre.