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Fernando Martins

A revolução digital e a nova tribo – Parte 1

A Universidade Colúmbia (EUA) divulgou na última quinta-feira um estudo mostrando que a facilidade em encontrar dados na internet enfraquece a capacidade humana de memorizar. O Google virou uma memória coletiva on-line e isso, segundo a pesquisa, pode modificar o modo como o cérebro processa informações.

Coincidentemente, o estudo saiu exatamente uma semana antes da data em que se comemora o centenário de nascimento do pensador canadense Marshall McLuhan (1911-1980). O cerne da teoria de McLuhan corrobora as conclusões da pesquisa: o homem cria as ferramentas e as ferramentas recriam o homem. Ou seja, diferentes mídias estimulam o cérebro de forma diferenciada, independentemente do conteúdo da mensagem. Novos meios de comunicação, portanto, fazem com que as pessoas mudem o modo como percebem e se relacionam com o mundo. Em uma época de revolução digital, retomar as ideias de Mcluhan é refletir sobre as profundas implicações psicossociais e políticas das novas mídias.

Para ele, a história da humanidade é a história da comunicação. Até a invenção da escrita, diz McLuhan, a língua era a única forma de comunicação e o conhecimento tinha necessariamente de ser transmitido oralmente de geração para geração. A memória era coletiva, da tribo inteira. O sentido enfatizado era a audição – que, para McLuhan, estimulava o sentimento de pertencer ao grupo.

Porém, a invenção do alfabeto, há 4 mil anos, mudou tudo. A escrita – um sistema de comunicação visual composto pela sucessão linear de pequenas partes, as sílabas – tirou do ouvido e concedeu aos olhos a hegemonia de percepção. Isso mudou a forma de entender o mundo. O pensamento místico da tribo cedeu espaço para a lógica – fruto da capacidade de absorver e organizar o conhecimento linearmente. A civilização, a filosofia e a ciência são consequências do alfabeto, assim como o homem racional, dissociado de suas emoções, diz McLuhan.

O aprendizado também não exigia mais que se recorresse aos anciãos, à coletividade. Afinal, a informação estava armazenada no papel. O homem não precisava mais de sua tribo. O clã, a grande família, se desfazia e o individualismo crescia – algo que se acentuou com a invenção da tipografia de Gutenberg, em 1439.

Mas McLuhan observa que o império da escrita começa a ruir no fim do século 19, com o surgimento do rádio, que resgata a audição como forma de perceber a realidade. Para ele, as novas tecnologias da comunicação (televisão, telefone e computador), com suas amplas possibilidades de estímulos sensoriais, embutem a possibilidade de o homem reconciliar-se com suas emoções.

As mídias eletrônicas recriam ainda um ambiente análogo à experiência oral de troca de conhecimento típico das sociedades tribais. McLuhan diz que isso provocará uma "retribalização" da hu­­ma­­nidade – formando uma imensa aldeia global. Possíveis consequências das novas mídias seriam menos individualismo e menos racionalidade; mais religiosidade, misticismo e comunitarismo.

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Na próxima quarta-feira, abordarei as implicações políticas da revolução digital.

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