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Fernando Martins

Devolvam a sigla do meu estado

Confesso que senti uma ponta de ciúmes quando, em 2006, o Partido Liberal (PL) e o Partido da Reedificação da Ordem Nacional (Prona) se fundiram, passaram a se chamar Partido da República e adotaram as iniciais PR como nome de guerra. Era, afinal, a consagrada sigla de meu estado que estava sendo apropriada por um grupo de políticos. Hoje vejo que aquele sentimento de desconforto não era pura implicância, bairrismo; mas sim zelo.

O escândalo no Ministério dos Transportes, já chamado por alguns de mensalão do PR (o partido, frise-se!), joga lama sobre uma sigla que, antes de ser a de uma agremiação partidária, é a de um estado inteiro. Obviamente, alguém minimamente informado sabe que o problema é com os membros do partido, não com o Paraná. Mas o fato revela o quanto os políticos do país não têm o mínimo pudor em abusar daquilo que faz com que brasileiros dos quatro cantos se sintam um mesmo povo: a língua.

Palavras são símbolos que contêm significados, muitas vezes profundos e complexos. Pertencem a todos. Mas os políticos se apossam delas e as usam com oportunismo. E, não raras vezes, as deturpam. A origem do termo república é a res publica latina – a coisa pública, literalmente. Implica a ideia de respeito ao que é de todos. Mas o partido que adotou a res publica no nome, só para continuar no caso do PR, tomou o Ministério dos Transportes como um feudo seu, uma cota particular na partilha do Estado.

E o desrespeito às palavras se replica em outras legendas. O PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, tem em suas fileiras líderes pouco democratas de fato – alguns até mesmo com um pendor autoritário (deixo que o leitor faça sua análise de quem se encaixa nesse perfil). Aliás, o termo democracia, com suas variações, é usado para compor a denominação de um sem número de legendas que não raras vezes são comandadas por caciques que impedem a emergência de novas lideranças – nada mais antidemocrático.

Ser um democrata ou um republicano tornou-se um verniz sem muito conteúdo. E, assim, abusando de um termo aqui, outro acolá, os políticos vão enfraquecendo as palavras e, consequentemente, seus significados. Talvez a descrença na esfera pública esteja associada a esse profundo desencontro entre o que se fala e aquilo que se faz.

A política é, por excelência, a arena das discussões públicas. O Parlamento é exatamente isso – o espaço do falar, do parlar. Se as palavras estão deturpadas, então toda a política está em degeneração. É mais do que hora de resgatar o real significado daquilo que se diz, de se haver mais verdade no discurso público. E os políticos poderiam começar a fazer isso com um gesto simbólico: devolvendo a sigla do meu estado.

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