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Francisco Camargo

Vá de passo bandeira

Sete de Setembro sempre mexe com Natureza Morta. Muito menos pelo feriado, é claro. Nada de sunga ou caipirinha. Como diz o Beronha, nosso amigo conhece muito bem os humores do tempo em Curitiba.

Assim, na segunda-feira, o acordo entre o Brasil e a França, para a compra de caças e submarinos, levou o solitário da Vila Piroquinha a mergulhar em sua biblioteca, atrás de Passo Bandeira. É um livro autobiográfico de Oswaldo França Júnior ("uma história de aviadores"), publicado em 1984. Ele escreveu também, entre outras obras, O Viúvo e Jorge – Um Brasileiro. Esta última foi transformada em filme e inspirou o seriado Carga Pesada, aquele do Pedro e do Bino, na Globo.

França Júnior ingressou na Aeronáutica aos 17 anos e seguiu carreira. Ela foi abruptamente interrompida pelo golpe de 64. Restou-lhe a literatura. Tanto que, em 1967, ganhou o Prêmio Walmap.

O título Passo Bandeira funde a cuca de quem não é ligado a aviões de anteontem. Significa voar com as pás da hélice na vertical, quando há algum problema. No passo bandeira, as pás são comandadas para uma posição em que "cortam" o vento, não oferecendo resistência ao avanço do aparelho. No caso do livro, eram os clássicos DC-3, os Douglas do Correio Aéreo Nacional. Como na vida, em situações de emergência, a ordem era (e continua sendo) mantenha o sangue frio – e recorra ao passo bandeira para uma saída segura.

Do DC-3 para mais uma incursão ao passado. Natureza deu uma rasante na nobreza e heróis. Heróis totalmente anônimos, como se sabe. Em entrevista ao jornal "O Dia", do Rio, no ano passado, na série sobre os 200 anos da vinda da família real, o historiador e diplomata Alberto da Costa e Silva é definitivo na análise: "O verdadeiro herói nacional brasileiro é o escravo".

– Toda a vida econômica do Brasil estava baseada em escravos, explica. A própria instalação da corte no Rio se fez com dinheiro dos traficantes. D. João recebeu a Quinta da Boa Vista do comerciante de escravos Elias Antônio Lopes, que tinha a melhor casa do Rio. Esses homens tinham dinheiro, mas não respeito: não tinham títulos de nobreza nem as glórias do dia. A chegada de D. João era a grande oportunidade. Eles puderam financiar a corte e, assim, foram feitos condes, barões, viscondes, entraram na vida de grandeza a que eles, homens ricos, sempre aspiraram.

- Houve escravidão em todas as grandes civilizações. O que faz a escravidão americana especialmente perversa é o fato de ser, pela primeira vez, uma escravidão racial. A partir do século XVII, só negros eram escravos no Brasil, ao passo que no resto do mundo qualquer pessoa poderia ser escrava se fosse prisioneira de guerra ou condenada judicialmente.

Ensina mais:

– Nunca os traficantes de escravos ganharam tanto dinheiro como na estada de D. João no Rio até 1835. Calcula-se que nesse período tenham chegado ao Brasil 440 mil escravos. Mas iss o não tem a ver com a chegada da corte, e sim, com o cenário mundial.

Encerrando a transcrição, Natureza não resiste e, citando João Ubaldo, brada um brado retumbante: Viva o povo brasileiro!

Francisco Camargo é jornalista.

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