O início da Guerra do Contestado, ocorrida na divisa do Paraná com Santa Catarina, completa 100 anos neste mês. Um século depois, o conflito armado que opôs o Estado a caboclos liderados por monges messiânicos traz lições que ainda são válidas.

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A posse da terra foi a causa central da guerra, encerrada em 1916. Ao construir a estrada de ferro São Paulo-Rio Grande, no início do século 20, a companhia de capital norte-americano Brazil Railway recebeu do governo federal a doação de uma faixa territorial de 15 quilômetros de cada lado da ferrovia – região à época coberta por extensas florestas de araucária, um recurso natural que veio a ser explorado por outra empresa do grupo, a Lumber.

O problema é que o Estado brasileiro, ao declarar que as terras eram devolutas (desocupadas), ignorou a existência de milhares de camponeses que ali viviam. O governo paranaense também reconheceu os direitos da Brazil Railway. A posição do então vice-presidente do estado, Affonso Camargo, é emblemática: ele atuava paralelamente como advogado da companhia norte-americana.

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Sem amparo governamental e expulsos de suas terras, os caboclos vagaram pelos pinheirais. Até encontrarem monges que, em nome de Deus, os insuflaram a resistir. Nem que para isso fosse necessário empunhar armas.

Obviamente, o contexto histórico de um século atrás é completamente diverso e não havia a preocupação social da atualidade. Mas há um pano de fundo no Contestado que persiste como um fantasma sobre a história não apenas do país. A ação (ou omissão) do Estado em nome do desenvolvimento, aliado ou não a empreendedores privados, é uma semente deletéria se for ignorado o interesse da sociedade. Uma semente que o tempo trata de fazer germinar e que muitas vezes irrompe em violência.

A religiosidade messiânica catalisou a revolta dos sertanejos paranaenses e catarinenses. Nas décadas seguintes do século 20, foram as ideologias que conquistaram a mente de quem se considerava injustiçado pelo sistema. Muitos mataram e mais ainda morreram em nome delas ao redor do planeta.

Hoje, a mesma lógica se mantém como um alerta ao Brasil. Parte do mundo islâmico encontra um escape no fanatismo religioso, que cresceu ao mesmo tempo em governantes árabes que prometeram, mas não conseguiram proporcionar bem-estar a seus povos. Algo parecido ocorre com uma parcela dos europeus. Foi seduzida por radicalismos políticos e pelo separatismo, numa resposta à desesperança provocada por uma austeridade e um empobrecimento exigidos daqueles que não causaram a crise econômica.

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