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Fernando Martins

O laico light

Embalado pela onda do politicamente correto, um novo personagem surgiu no país: o "laico light". Aparentemente, é um defensor intransigente da laicidade – o princípio da separação entre Estado e Igreja. Mas sua radicalidade não passa de um verniz. Ele investe contra o detalhe, o simbólico, aquilo que na prática pouco muda. Seu esforço costuma acabar na essência ou quando a religiosidade lhe beneficia.

O mais novo caso de atuação desse ativismo é a ação civil do Ministério Público Federal (MPF) que pede ao Banco Central para passar a imprimir as cédulas de real sem a expressão "Deus seja louvado". Um dos argumentos do procurador Jefferson Aparecido Dias, autor do processo, é que a frase fere os princípios constitucionais do Estado laico e da liberdade religiosa, pois supostamente privilegia uma crença em detrimento das outras.

Obviamente, não é uma minúscula inscrição numa cédula de dinheiro que criará empecilhos para que fiéis de outras religiões professem sua crença – o principal objetivo da liberdade religiosa. É possível, inclusive, que a maioria dos cristãos, os supostos beneficiários da expressão, não vejam nenhum problema em retirar a frase alusiva a Deus das notas de real. Afinal, Cristo, ao se referir à moeda romana, já havia sentenciado: "Dai a César o que é de César".

O pedido de mudança nas cédulas não é a única investida recente do laicismo. Em 2010, uma primeira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos previa proibir a exibição de símbolos religiosos em repartições públicas. E, em março deste ano, o Tribunal de Justiça gaúcho mandou retirar crucifixos dos prédios do Judiciário estadual.

Mas não é uma cruz na parede de um júri que impedirá que haja justiça. No Judiciário, a essência da laicidade está no princípio da igualdade, em garantir que todos serão julgados de acordo com as leis, independentemente de suas crenças. A garantia do Estado laico, portanto, está muito longe da ornamentação dos tribunais. Assenta-se nas convicções pessoais de juízes e jurados – algo difícil de controlar.

Há ainda, dentre os laicos lights, quem não esteja disposto a mexer com a tradição religiosa quando ela lhe é benéfica. O TJ-RS, por exemplo, pouco após decidir pela proibição do crucifixo nos tribunais, autorizou a antecipação do feriadão da Páscoa deste ano para as 13 horas da Quinta-Feira Santa, ganhando meio dia a mais de folga. Para o país, seria mais proveitoso que o Judiciário também defendesse a laicidade neste caso. E que trabalhasse nas datas religiosas. Mas isso é ser laico demais...

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