Um pacote de obras de drenagem, que ajudaria a minimizar enchentes e alagamentos em Curitiba, comuns em dias de chuva forte, pode não sair do papel por falta da efetiva liberação de verbas federais. Apenas quatro das 44 intervenções previstas nas seis bacias hidrográficas da cidade estão em execução. A maior parte do conjunto está em fase de aprovação ou em processo de licitação, mas sem previsão da destinação dos recursos financeiros. Segundo a prefeitura, dos R$ 792,5 milhões previstos, pouco mais de R$ 136 milhões – o que equivale a 17% do total – foram destinados às obras.
Pontos críticos
As intervenções fazem parte do PAC II – Gestão de Riscos (que prevê recursos 100% federais) e do PAC II – Drenagem (custeado com verbas federais e uma contrapartida de 3% da prefeitura). As obras dizem respeito, principalmente, ao perfilhamento e à contenção de rios que cortam a capital e trariam um resultado positivo principalmente a pontos críticos diagnosticados pela Defesa Civil.
Segundo o secretário de Obras de Curitiba, Sérgio Luiz Antoniasse, assim que forem concluídas, as obras de uma mesma bacia funcionariam de forma integrada. Ou seja, surtiriam mais efeito se as outras etapas também fossem realizadas. Os termos de compromisso com o Ministério das Cidades foram assinados em 2012. Apesar disso, Curitiba não tem previsão para receber os aportes financeiros federais.
Empresário grava imagem de alagamentos no Rebouças
Segundo moradores, a Rua Almirante Gonçalves, no Rebouças, convive com alagamentos há 17 anos. O volume de água é tanto que carros chegam a boiar e ser arrastados pela correnteza. O empresário Thiago Jachelli gravou imagens de alagamentos registrados neste ano.
+ VÍDEOSDúvida
“O que nós temos visto pelo cenário nacional é que existe essa interrogação quanto à liberação de recursos para esse tipo de intervenção. Mas a parte da prefeitura, que é a parte de projetos, está ok”, diz Antoniasse. “Hoje, não temos garantias de que [os recursos] vão ser disponibilizados, pelo momento que o país está passando.”
Uma das etapas em execução é a instalação de indutores de retenção e obras estruturais na bacia do Rio Pinheirinho, que integra a Bacia Hidrográfica do Rio Belém. Orçadas em R$ 122 milhões, as intervenções vão beneficiar bairros centrais, como Cristo Rei, Rebouças e Guabirotuba. Outro serviço em andamento está avaliado em R$ 11 milhões e corresponde à construção de muros de contenção ao longo da Bacia Hidrográfica do Rio Barigui. As outras duas etapas em execução dizem respeito à elaboração de projetos e não à realização de obras.
Entre as 40 obras que estão em stand by, aguardando verbas para sua realização, estão intervenções nos rios Belém e Juvevê (áreas central e Norte de Curitiba); nos rios Bacacheri e Atuba (área Norte); no Rio Cascatinha (Noroeste); no Rio Barigui (eixo Norte-Sul) e Ribeirão dos Padilhas (Sul).
“Todas essas obras são importantes e colaborariam com esse processo, de trabalharmos a gestão de risco, para minimizarmos os problemas que temos hoje”, diz o secretário.
Às margens do Rio Barigui, moradores convivem com enchentes há décadas
A dona de casa Maria de Lurdes da Silva mantém cavaletes em todos os cômodos da residência em que mora. Quando começa a chover, ela se apressa para suspender moveis e eletrodomésticos, antes que a água invada o imóvel, localizado no Jardim Independência, no Fazendinha, perto do Rio Barigui. Apesar dos cuidados, sempre perde um ou outro objeto. “Eu não tenho gosto de comprar nada, porque a chuva estraga. O piso se solta, os guarda-roupas ficam com as portas escangalhadas”, lamenta.
As enchentes naquela região não são um fenômeno recente. Os moradores dizem que convivem com o problema há duas décadas. Aos 81 anos de idade, Alcina Chaves Sobrinho já não tem vigor físico para erguer os móveis. Quando ameaça chover, ela liga para o filho. “Eu coloquei essa placa de aço na porta. Mas a água entra mesmo assim”, conta.
Segundo o comerciante José Flávio Jagenka, a água transborda do rio por valetas abertas na margem. Ele diz que moradores chegaram a fazer um abaixo-assinado para pedir à prefeitura que canalizasse a erosão. “Em questão de minutos, a pessoa não consegue salvar mais nada. Não tem ninguém que não tenha perdido um móvel ou que não tenha tido a casa invadida”, disse.