Brasília - O apagão da última terça-feira escureceu o horizonte da sucessão presidencial para o presidente Lula e o PT. O governo que navegava em céu de brigadeiro após a escolha do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016 e o sucesso na reação à crise econômica mundial enfrenta agora o desafio de provar que não cometeu erros gerenciais na condução da política energética brasileira. A menos de 11 meses das eleições, o assunto virou pauta essencial da campanha e pode complicar a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
A importância é tanta que governo e oposição travam uma guerra semântica sobre o incidente. Para evitar comparações com o apagão de 2001, ocorrido no penúltimo ano da gestão Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e causado por problemas crônicos na transmissão de energia do país, os governistas só usam o termo "blecaute".
"Ninguém pode prometer que um sistema complexo como o nosso não vai ter blecaute. O que prometemos é que não haverá mais neste país racionamento. Racionamento é barbeiragem", disse Dilma, na primeira vez que falou sobre o assunto, quase dois dias após a queda de energia que atingiu 18 estados.
Antes da definição da resposta-padrão de que o problema foi ocasionado por uma combinação de raios, ventos e chuvas no município de Itaberá (SP) (tese contestada inicialmente por técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a ministra foi "blindada". Na quarta-feira, evitou compromissos públicos para afastar possíveis abordagens de jornalistas. O "sumiço" aumentou as críticas da oposição. "A digital (do apagão) é dela", resumiu o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgilio. A expectativa de uma resposta rápida era esperada porque Dilma fez carreira na área.
Em dois períodos (1994 a 1995 e 1999 a 2002), ela foi secretária estadual de Minas, Energia e Comunicações do Rio Grande do Sul. Além disso, comandou o Ministério de Minas e Energia entre 2003 e 2005.
Apesar da mudança para a Casa Civil, Dilma seguiu influente na área energética. Em 2007, foi nomeada coordenadora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que planeja destinar cerca de R$ 300 bilhões ao setor até 2015. Todo esse currículo, porém, pode se voltar contra ela nos próximos meses. "O impacto desse episódio será revelado em breve. Se foi algo tópico, como diz o governo, o eleitor vai esquecer rápido. Se for crônico, a situação vai se complicar", explica o cientista político Francisco Fonseca, professor da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.
Único paranaense na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, André Vargas (PT), defende Dilma e diz que a discussão sobre a política energética é permanente. "Todo dia o debate avança, não fica preso ao passado."
Rio Madeira
Segundo ele, o problema ainda está ligado ao fato de o sistema depender muito da usina de Itaipu. "É preciso ficar claro que o governo está fazendo a sua parte nesse sentido desde que começou as obras nas usinas hidrelétricas do Rio Madeira, na Amazônia", disse o parlamentar.
Já a estrategista de campanhas políticas Cila Schulmann afirma que o maior temor do PT é ser vítima da mesma estratégia utilizada pelo partido para fustigar a administração do PSDB. "Na época, o termo apagão virou sinônimo de incompetência." Para Cila, que trabalha no ramo desde 1988 (quando fez a famosa campanha dos 12 dias que reconduziu Jaime Lerner à prefeitura de Curitiba), o tema deixará de ser um trunfo político petista em 2010.
O mais difícil para o PT, segundo ela, será se livrar do estigma de um conjunto de apagões, que começaram com o "apagão ético" do mensalão, em 2005, passaram pelo "apagão aéreo", em 2007, até chegar ao blecaute da semana passada. "É um termo que pode colar e não sair mais."