Sumiço
O que é bom a gente mostra...
Em 1994, o então ministro da Fazenda, Rubens Ricupero, entrou para a história da política brasileira graças a uma frase: "o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde". O raciocínio do ex-ministro é comparável à estratégia de preparação da campanha presidencial da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Nome mais graduado da gestão do setor energético no governo Lula, ela ficou de fora das explicações iniciais sobre o apagão, mas é presença constante na apresentação de propostas e resultados positivos para o governo.
Esse tipo de comportamento divide opiniões. "Não é só a Dilma que faz isso, Serra também tem fugido constantemente dos temas incômodos em São Paulo", avalia o cientista político Francisco Fonseca. A estrategista de campanhas Cila Schulmann concorda que o artifício é comum, mas faz um alerta: o argumento não pode ser usado indiscriminadamente. "O eleitor não percebe essa blindagem da primeira, segunda vez. Mas quando chega à 15ª oportunidade, é óbvio que ele nota que tem alguma coisa estranha."
A "blindagem"
Dilma Rousseff alterna aparecimentos e "sumiços":
Entre a tempestade...
Dossiê FHC
Em maio de 2008, Dilma teve de negar na Comissão de Infraestrutura do Senado a existência de um dossiê montado pela Casa Civil com os gastos do ex-presidente FHC com cartões corporativos e as chamadas contas "B".
Lina Vieira
Em agosto, a ex-secretária da Receita, Lina Vieira, afirmou que foi pressionada por Dilma para "agilizar" processos contra parentes de José Sarney. O episódio fez Dilma sair de cenas por dez dias.
E a bonança
Mãe do PAC
Dilma começou a ganhar espaço na preferência de Lula para sucedê-lo quando assumiu a gerência do PAC, principal bandeira do segundo mandato petista. O posto garante a ela viagens para inaugurar obras em todo país.
Pré-Sal
A ministra foi a responsável pela apresentação do novo marco regulatório da exploração de petróleo no pré-sal, em agosto. Dilma assumiu o papel de defensora das riquezas da nação para os próximos anos.
Brasília - O apagão da última terça-feira escureceu o horizonte da sucessão presidencial para o presidente Lula e o PT. O governo que navegava em céu de brigadeiro após a escolha do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016 e o sucesso na reação à crise econômica mundial enfrenta agora o desafio de provar que não cometeu erros gerenciais na condução da política energética brasileira. A menos de 11 meses das eleições, o assunto virou pauta essencial da campanha e pode complicar a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
A importância é tanta que governo e oposição travam uma guerra semântica sobre o incidente. Para evitar comparações com o apagão de 2001, ocorrido no penúltimo ano da gestão Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e causado por problemas crônicos na transmissão de energia do país, os governistas só usam o termo "blecaute".
"Ninguém pode prometer que um sistema complexo como o nosso não vai ter blecaute. O que prometemos é que não haverá mais neste país racionamento. Racionamento é barbeiragem", disse Dilma, na primeira vez que falou sobre o assunto, quase dois dias após a queda de energia que atingiu 18 estados.
Antes da definição da resposta-padrão de que o problema foi ocasionado por uma combinação de raios, ventos e chuvas no município de Itaberá (SP) (tese contestada inicialmente por técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a ministra foi "blindada". Na quarta-feira, evitou compromissos públicos para afastar possíveis abordagens de jornalistas. O "sumiço" aumentou as críticas da oposição. "A digital (do apagão) é dela", resumiu o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgilio. A expectativa de uma resposta rápida era esperada porque Dilma fez carreira na área.
Em dois períodos (1994 a 1995 e 1999 a 2002), ela foi secretária estadual de Minas, Energia e Comunicações do Rio Grande do Sul. Além disso, comandou o Ministério de Minas e Energia entre 2003 e 2005.
Apesar da mudança para a Casa Civil, Dilma seguiu influente na área energética. Em 2007, foi nomeada coordenadora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que planeja destinar cerca de R$ 300 bilhões ao setor até 2015. Todo esse currículo, porém, pode se voltar contra ela nos próximos meses. "O impacto desse episódio será revelado em breve. Se foi algo tópico, como diz o governo, o eleitor vai esquecer rápido. Se for crônico, a situação vai se complicar", explica o cientista político Francisco Fonseca, professor da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.
Único paranaense na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, André Vargas (PT), defende Dilma e diz que a discussão sobre a política energética é permanente. "Todo dia o debate avança, não fica preso ao passado."
Rio Madeira
Segundo ele, o problema ainda está ligado ao fato de o sistema depender muito da usina de Itaipu. "É preciso ficar claro que o governo está fazendo a sua parte nesse sentido desde que começou as obras nas usinas hidrelétricas do Rio Madeira, na Amazônia", disse o parlamentar.
Já a estrategista de campanhas políticas Cila Schulmann afirma que o maior temor do PT é ser vítima da mesma estratégia utilizada pelo partido para fustigar a administração do PSDB. "Na época, o termo apagão virou sinônimo de incompetência." Para Cila, que trabalha no ramo desde 1988 (quando fez a famosa campanha dos 12 dias que reconduziu Jaime Lerner à prefeitura de Curitiba), o tema deixará de ser um trunfo político petista em 2010.
O mais difícil para o PT, segundo ela, será se livrar do estigma de um conjunto de apagões, que começaram com o "apagão ético" do mensalão, em 2005, passaram pelo "apagão aéreo", em 2007, até chegar ao blecaute da semana passada. "É um termo que pode colar e não sair mais."
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