Quer saber onde estava a senhora Hillary Clinton no dia 12 de fevereiro, digamos, às 8 horas da manhã? A resposta está ao alcance da mão: ela tomava café da manhã com o senador John Kerry. O próximo encontro de Hillary, às 10h45, foi com o presidente Barack Obama e com seu vice, Joe Biden. Foi um dia tranquilo, e o último compromisso ocorreu às 16h45.
Tudo isso está disponível na internet. Hillary é a atual secretária de Estado norte-americana. É uma funcionária pública. Pública também é a sua agenda. Qualquer cidadão pode entrar na internet, acessar o site do Departamento de Estado e clicar no dia desejado para saber o que ela está fazendo.
Isso se chama transparência. É claro que nem tudo o que ocorre nesses encontros é público. Na maior parte das vezes, a imprensa não pode estar presente. Mas o jogo é feito às claras. E não se trata de uma exceção. A agenda de todos os ministros é pública. E é assim que deve ser.
Com um sistema assim, não haveria a menor possibilidade de ocorrer um imbróglio como o que envolve atualmente a ministra Dilma Rousseff e a ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira. A senhora Lina disse que a ministra lhe havia pedido para apressar uma investigação sobre Fernando Sarney. A ministra diz que a secretária teria de provar que o encontro ocorreu (no que está totalmente certa, já que é ao acusador que cabe o ônus da prova).
Mas Lina disse que não lembrava mais quando isso havia ocorrido. Ficou de, um dia, caso achasse sua agenda, trazer a informação a público. Muito depois, disse que talvez fosse em 19 de dezembro. Certamente não foi: Lina Vieira estava num avião nesse dia. E fica o dito pelo não dito. Quem quiser acreditar na culpa da ministra acredita na palavra de uma. Quem prefere acreditar só em acusações com provas fica à espera de algo palpável.
O problema é que na administração pública, onde se mexe com bilhões de reais e milhões de vidas, não se pode correr o risco de ficar o dito por não dito. Não há agendas públicas. As fitas do Palácio do Planalto são apagadas a cada 30 dias. E cada um pode falar que se encontrou com o ministro tal a qualquer hora.
O jornalista Marcelo Soares, especializado em direito de acesso a informações públicas, diz que o Brasil tem discutido muito sobre a publicação de documentos antigos, referentes à ditadura militar, por exemplo. Mas que esse também é o momento de falar sobre os "documentos da democracia".
Transparência não é mesmo o nosso forte. O Brasil ainda nem mesmo tem uma lei que obrigue os órgãos públicos a fornecer informações (vários países têm essa lei, desde a Suécia até o Haiti). Quando uma instituição faz algo nesse sentido, muitas vezes é cheia de falhas. E mesmo assim os mandatários acreditam que estão fazendo um favor à população.
Basta ver o caso do novo portal da transparência da Assembleia Legislativa. Reportagem desta Gazeta do Povo publicada ontem mostrou todos os problemas do site. Mesmo assim, os deputados têm a convicção de que estão fazendo algo de extraordinário ao liberar o mínimo de informações sobre a sua atuação. Não estão. Estão, ainda, aquém do básico.